Membros da ABI na Constituinte


30/10/2008


 Arquivo Câmara

Quando a nação brasileira começou a votar sua sétima Carta Constitucional, Barbosa Lima Sobrinho exercia seu terceiro mandato na Presidência da ABI (1978-2000). O jornalista, que fora Deputado constituinte pelo PSD em 1946, era um constitucionalista convicto: em 64, condenou com firmeza a derrubada de João Goulart pelos militares; em 73, aceitou participar como anticandidato a Vice-presidente da República na chapa de Ulysses Guimarães, para “denunciar a farsa das eleições indiretas”; e, nos anos 80, foi um dos principais articuladores das “Diretas Já”.

Para ele, já era mais que a hora de substituir a Carta firmada na ditadura, que “comprometia a história política da nação, inconformada com um regime presidido por uma Constituição ilegítima, isto é, uma Constituição que se não originava do voto popular”. No artigo “A instalação da Assembléia Nacional Constituinte”, publicado no Boletim ABI de janeiro e fevereiro de 87, Barbosa Lima Sobrinho lembrava que a campanha pela nova Carta foi uma ação da vontade popular, não uma imposição de “governantes escolhidos no segredo dos colégios eleitorais”. Assim, não cabia estranhamento no intenso fluxo de cidadãos em Brasília, em multidões cercando o prédio do Congresso. Toda essa mobilização significava uma reação ao passado e a forma de a população reivindicar a restauração de um Poder Legislativo que não ficasse “restrito ao âmbito dos decretos-leis”.

Sintonia

Seguindo a tradição de entidade vanguardista na defesa das causas democráticas, a Associação Brasileira de Imprensa criou, em 1985, uma comissão encarregada de organizar as estratégias da instituição na luta pelo Estado de Direito e pela convocação da Assembléia Constituinte. Quando ela foi instalada, em 87, vários membros da ABI já haviam sido eleitos congressistas, para garantir uma contribuição efetiva na elaboração da nova Carta.

                    Tarcísio Holanda

O assunto foi a pauta principal da reunião do Conselho Deliberativo da ABI em 25 de novembro de 86, quando o Presidente Barbosa Lima Sobrinho saudou os Conselheiros Pompeu de Souza (Senador pelo PMDB-DF); Paulo Alberto Monteiro de Barros (Artur da Távola, Deputado federal, PMDB-RJ); Carlos Alberto Oliveira (Caó, Deputado federal, PDT-RJ); Afonso Arinos de Melo Franco e Nelson Carneiro (Senadores, respectivamente pelo PFL e o PMDB); Heloneida Studart (Deputada estadual, PMBD-RJ); e Milton Temer (Deputado estadual, PSB-RJ).

O hoje Conselheiro Tarcísio Holanda, que na época era comentarista político do Correio Braziliense e da TV Educativa, tece à participação de Artur da Távola e Caó na Constituinte. O primeiro, juntamente com Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas e José Richa, entre outros, foi um dos principais defensores do parlamentarismo no Brasil:
— O velho Ulysses era contra. O Sarney admitiu uma negociação, que chegou a ser esboçada, mas numa madrugada, depois de um encontro com o Ulysses, o relator Bernardo Cabral voltou atrás e prevaleceu o presidencialismo. Essa foi uma das notícias mais importantes que eu comentei, além da batalha sobre o mandato presidencial.

 Carlos Alberto Oliveira

Caó, por sua vez, foi figura importante na definição da emenda contra a discriminação racial, segundo Tarcísio, “garantindo que passasse a ser enquadrada como crime”.

Uma das primeiras providências da Diretoria da ABI durante a Constituinte foi encaminhar a seu Presidente, Ulysses Guimarães, um anteprojeto sobre o Direito da Comunicação, para que fosse inserido na Carta. A proposta partiu do jurista e Conselheiro da Associação Clóvis Ramalhate, que, após aprovação do Conselho Administrativo, elaborou o texto com a colaboração dos colegas Hélio Silva, José Honório Rodrigues, Antônio Houaiss e Edmundo Muniz, assistidos por Barbosa Lima Sobrinho e Mário Martins.

A proposta encaminhada pela ABI dizia na Secção I: “São livres, isentas de censura e de licença da autoridade, a manifestação de opinião e a transmissão de informações, por jornais, periódicos, livros e radiodifusão. A lei não oporá restrição alguma à prestação de informações, nem à manifestação de pensamento, salvo a da responsabilidade civil ou penal pelos abusos que definir.”

Debates ideológicos

Tarcísio Holanda diz que a Constituinte foi um momento tenso, cheio de conflitos de interesses:
— Entre as emendas mais polêmicas, a da reforma agrária teve destaque indiscutível e provocou grande debate ideológico. Outro debate acirrado foi sobre o direito de greve, que a esquerda queria estender aos militares. Acho um absurdo dar esse direito a uma pessoa que pega em fuzil, é um erro o Brasil dá-lo aos policiais. Nos países civilizados, quem porta arma não pode participar de greve, feita para proteger a parte mais fraca da sociedade.

O jornalista lembra que coube ao Senador Jarbas Passarinho fazer um discurso alertando para o absurdo, porque a organização das Forças Armadas se fundamentava na hierarquia e na disciplina:
— Ele explicou que o direito de greve subverteria esses princípios e como ameaçou votar contra, de modo absoluto, forçou a esquerda a entrar em negociação. As Forças Armadas ficaram fora da emenda, mas hoje há a necessidade de se regulamentar o direito de greve, para que também os policiais não possam recorrer a ele.

Reação conservadora

                            Arquivo Câmara

Comemoração da nova Constituinte

Segundo Tarcísio, a formação do Centrão foi uma reação dos núcleos conservadores ao papel importante da esquerda brasileira, especialmente do PMDB, no processo de elaboração da nova Carta. Porém, mesmo com a organização da centro-direita, que tinha muitos representantes, o jornalista lembra que a esquerda teve muitas vitórias:
— Um papel relevante nesse processo foi o do Deputado Mário Covas, líder da maioria. Homem de centro-esquerda, ele prestigiou as siglas de oposição e deu espaço a elas na Constituinte — inclusive ao PT, que se recusava a assinar o texto. Cito também o Bernardo Cabral, relator geral, e o José Genoíno; e, pelo lado da direita, o José Bonifácio de Andrada e o Luiz Eduardo Magalhães, que era um sujeito conservador mas boêmio e tinha uma relação muito boa com os constituintes de esquerda. Tinha também o Ricardo Fiúza, do PFL de Pernambuco, que era competentíssimo e foi um dos líderes do Centrão.

O Conselheiro da ABI recorre aos números para falar da correlação de forças e do poder do PMDB na Assembléia Nacional:
— O partido elegeu 304 membros, num total de 481 constituintes, ou seja, um quorum maior que o da maioria absoluta, que era de 281 — diz Tarcísio.