ABI debate o papel do jornalismo na atualidade


08/04/2011


A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) celebrou o Dia do Jornalista e o seu 103º aniversário de fundação na noite desta quinta-feira, dia 7, com o debate “O papel do jornalismo no contexto cultural contemporâneo”, promovido em parceria com o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro(SJPMRJ), Instituto Casa Grande(ICG) e o Clube de Comunicação.
 
Participaram da mesa o economista Carlos Lessa, o Senador Saturnino Braga, Presidente do Instituto Casa Grande; Leonel Aguiar, Professor da PUC-RJ, Sônia Virgínia Moreira, Professora da Uerj, e Suzana Blass, Presidente do SJPMRJ, que mediou a discussão.
 
Associados e Diretores da ABI, profissionais de imprensa, pesquisadores, professores e estudantes prestigiaram o encontro realizado na Sala Belisário de Souza, no 7º andar do edifício-sede da ABI, e participaram das discussões sobre a liberdade de imprensa e o papel do jornalismo diante do direito à formação profissional e à informação da sociedade.
 
Na palestra de abertura, o jornalista Jesus Chediak, Diretor de Cultura e Lazer da ABI, destacou o papel social do jornalismo:
— A reportagem é algo sagrado porque o jornalista é a testemunha da história. Se daqui a 100 anos nós quisermos saber o que aconteceu neste momento, vamos consultar os jornais. A liberdade de imprensa e o direito à informação são fundamentais à democracia, mas, citando Cícero Sandroni, atualmente no Brasil não existe liberdade de imprensa, mas sim liberdade de empresa. Estamos assistindo ao processo de editorialização da notícia.
 
Dando prosseguimento ao debate, Suzana Blass sublinhou as questões que dificultam o pleno exercício da profissão:
— A mídia hoje ocupa um espaço público, e por isso defendemos que o profissional desta área tenha uma formação sedimentada na ética e na responsabilidade. Contudo, na prática não é isso que a gente vê. Houve a derrubada do diploma na sociedade, quando na verdade a gente tinha que ter revisto a formação profissional do jornalista. Nós defendemos o jornalismo como um serviço de interesse público, e o que vemos no mercado é um jornalismo que cumpre o interesse privado de alguns, que são os donos dos veículos. Daí a necessidade de ampliarmos o debate sobre a imprensa junto a toda a sociedade.
 
Em seguida, o economista Carlos Lessa ressaltou a mudança de perfil do profissional de imprensa:
—Enquanto economista militante por um Brasil, eu tive a felicidade de conviver com pelo menos três gerações de jornalistas, algumas delas já na época da ditadura, quando o único espaço de razoável de liberdade era na Economia. Então, havia uma animação. Neste sentido, acho que o jornalista de hoje precisa ser reinventado.
 
Lessa salientou ainda a desvalorização da função jornalística nos aspectos econômico e social:
—Não estou falando das mídias alternativas, da imprensa de rua, das funções de assessoria de comunicação, mas sim da produção que perdeu espaço de sobrevivência. O jornalista cumpria com independência o seu papel respondendo à sua razão e ao seu coração e também à barriga. O jornalista de hoje tem dificuldade para sobreviver.
 
Para o economista, as mudanças estruturais na rotina das redações também comprometeram o discurso da mídia:
—Fiquei estarrecido ao constatar que a imprensa noticiou o terremoto do Haiti, mas não aprofundou o assunto. Anunciou uma catástrofe, mas não deu a matriz histórica explicativa e nem desdobrou as conseqüências da tragédia. Desta forma, você naturaliza a catástrofe. Terremoto ficou banal. Tanto que esse agora do Japão só tem algum charme porque tem um reator atômico sendo difundido, caso contrário, seria mais um. Há ainda uma preferência absoluta por editar patologia. É como se falar bem de alguém ou de alguma coisa em princípio sugerisse que o autor daquela notícia foi comprado. Com tudo isto, o homem comum que não tem muito tempo passa a ler o jornal na diagonal. A idéia da naturalização, infelizmente, é um subproduto, um angustiante modo pelo qual a mídia trabalha as matérias principais, que chamam a atenção. Na verdade, isto só aumenta o caráter acrítico dos fatos. Não há nenhum convite à reflexão.
 
O papel da mídia nas sociedades capitalistas foi acentuado pelo Senador Saturnino Braga:
—É preciso lembrar que a democracia é uma construção da imprensa, e que atualmente a liberdade de imprensa está completamente cerceada pelos interesses econômicos e empresariais daqueles que empregam jornalistas. A primeira condição da liberdade de informação é a diversidade de pontos de vista na informação, o que possibilitando a meditação sobre os fatos e a construção de uma ideia relacionada àquela informação. Infelizmente, o capitalismo se enraizou de tal maneira, tornando inviável a diversificação dos meios de comunicação.
 
Dando continuidade ao debate, a professora Sônia Virgínia falou sobre as iniciativas relacionadas à formação do jornalista no Brasil:
— O jornalismo ainda é um dos cursos mais procurados nas universidades, mesmo hoje com esta situação do diploma. No contexto acadêmico-científico o nosso desafio permanente é o ensino de jornalismo como atividade intelectual, não apenas como uma prática de decorar receitas como, por exemplo, escrever um lead. Muitos de nossos professores são profissionais que estiveram nas redações, mas também há muitos deles que são estudantes profissionais, que nunca passaram por uma redação, nunca presenciaram um fechamento, nunca precisaram enfrentar situações que só podem ser vivenciadas dentro da redação. Este problema resulta na ausência da contextualização da imprensa atual, na falta de cultural geral do jornalista. Nossos alunos de jornalismo lêem cada vez menos e escrevem cada vez pior. Eles não têm a visão de mundo que é fundamental para a experiência de relatar a realidade. O discurso passa, então, a ser mais declaratório, sem a contextualização do fato.
 
Um aspecto positivo diante deste quadro, é, de acordo com Sônia Virgínia, a expansão dos cursos de pós-graduação em jornalismo:
—Estabeleceram-se há alguns anos vários cursos nos níveis stricto sensu e lato sensu, como Jornalismo Científico, Cultural, Digital, ajudando a formar  nichos de especialização que hoje são muito fortes. O jornalismo científico, por exemplo, é fundamental para o desenvolvimento do Brasil, mas nós formamos poucos jovens nesta área.
 
Outro ponto positivo, segundo o professor da PUC-RJ Leonel Aguiar, é especialmente representado pela relevância histórica da profissão:
—Apesar da crise, é importante lembrar que a função do jornalismo é impulsionar a democracia. Precisamos destacar a função histórica e ideológica dentro do campo jornalístico. O jornalismo não é como o Supremo Tribunal de Justiça julgou; não é um espaço limitado à exposição de opiniões. O papel de produção de informação jornalística é essencial, pois cria as condições para que os todos os cidadãos possam ser livres. O discurso em torno do jornalismo deve ser o do otimismo.
*Colaboração de Renan Castro, estagiário do Departamento de Jornalismo da ABI.