Seminário na ABI discute violência no Rio


25/11/2008


                                          Angelo Cuissi

               Barros, Antônio Carlos Costa e  Ubiratan

Nesta segunda-feira, 24, a Associação Brasileira de Imprensa promoveu o seminário “Segurança pública e cidadania: o papel da sociedade na luta contra a violência”, em parceria com a ONG Rio de Paz e o Centro de Informações da Organização das Nações Unidas (Unic-Rio). As palestras foram realizadas no Auditório Oscar Guanabarino, com mediação do Pastor Antônio Carlos Costa, Presidente da Rio de Paz.

Primeiro a falar, o Secretário-geral do Sindicato dos Delegados de Polícia do Rio de Janeiro, Vinícius George de Ribeiro Silva, criticou as condições de trabalho dos agentes da lei, principalmente os policiais militares, que “arriscam suas vidas em prol da sociedade e recebem baixos salários, que não custeiam nem uma boa educação para os filhos”. Vinícius George cobrou providências dos governos municipal, estadual e federal, destacou que “a população toma parte nesta luta através da pressão social” e falou de dados constatados em pesquisas:
— Enquanto muitos moradores da favela morrem de “paf” (projétil de arma de fogo), os do asfalto são vítimas, principalmente, de acidentes de trânsito causados por embriaguez. Nas ruas, o álcool causa mais dano do que a maconha, principal causa do embate entre policiais e traficantes nos morros do Rio. É bom lembrar também que muitos óbitos não são registrados, geralmente por ameaça de policiais corruptos ou do comando do tráfico local. 

Bernardo Costa

Ana Paula Miranda

Educação e imprensa

A segunda palestrante foi Ana Paula Miranda, professora do Iupol (Instituto Universitário de Políticas de Segurança e Ciências Policiais) e da Universidade Cândido Mendes e coordenadora do Instituto Pereira Passos. Segundo ela, há dois tipos de violência na área da educação:
— Temos a violência “da” escola e a violência “na” escola. A primeira é gradativa e impactante e envolve ora o professor — que muitas vezes causa danos psicológicos no aluno, dizendo frases degradantes como “você não vai ser nada nesta vida” —, ora a própria instituição — que, ao expulsar um aluno, o deixa desmotivado a voltar a estudar e mais vulnerável a imergir no mundo da criminalidade. A polícia mata explicitamente. O professor mata aos poucos.

Por sua vez, o jornalista Jorge Antonio Barros, autor do blog “Repórter de crime”, ressaltou a histórica relação complicada entre a imprensa e a polícia e apresentou um trecho de matéria do Jornal do Commercio de 1909, que denunciava ações policiais para coibir investigações feitas pelos jornais, bem como os movimentos sociais:
— Já naquela época a polícia se preocupava com operários se organizando. Não duvido nada que tenha aqui algum P2 (policial à paisana) acompanhando tudo para fazer relatórios para a Secretaria de Segurança, pois a polícia também sempre monitorou organizações sociais, como o Rio de Paz — ironizou.

Barros listou fases da Repol (reportagem policial) desde 1937, quando os jornais começaram a dar mais espaço para a editoria — e também para os esportes —, passando pela imprensa marrom dos anos 50 — “baseada no tripé sexo, sangue e dinheiro” — e pela censura dos 70, até chegar à década de 90:
— Foi quando a violência começou a invadir a Zona Sul do Rio, resultando na mudança de abordagem da questão da segurança pública por parte dos veículos. O assunto passou a ser tratado como qualidade de vida.

Para o jornalista, há falhas na cobertura de polícia realizada pela imprensa carioca:
— Ela ainda é deficitária ao expor nomes e fatos que podem comprometer a integridade da sociedade, mas isto já está sendo revisto, devido ao grande número de processos movidos contra as redações. Outro sério problema enfrentado hoje pela imprensa hoje é a falta de transparência em sua relação com a Secretaria de Segurança. O Governo do Estado cria uma blindagem, feita de assessores de comunicação altamente caros e qualificados, e gera um forte monitoramento do trabalho da imprensa, impedindo a produção de reportagens investigativas.

Direitos humanos 

                                         Angelo Cuissi

                                                         João Tancredo

João Tancredo, especialista em Responsabilidade Civil e ex-Presidente da Comissão dos Direitos Humanos da OAB-RJ, também criticou a falta de cooperação do Estado na hora de fornecer dados sobre a criminalidade em algumas áreas:
— Muitos dados são sonegados por alguns Batalhões, que ainda não foram informatizados. Se eles não passam os dados com medo de críticas, por outro lado, nós não podemos discutir, formular e propor políticas públicas eficazes que gerem efeitos a longo prazo. Isso prejudica o trabalho dos defensores dos direitos humanos

A política de confronto do atual Governo do Estado do Rio de Janeiro, refletida nos chamados “autos de resistência”, também foi criticada pelo advogado, que chamou atenção para a operação ocorrida em 2007 no Complexo do Alemão, que resultou em 19 mortes, 22 feridos graves e apenas 14 armas apreendidas:
— Na época, nós pedimos a um perito independente que avaliasse o caso. Ele constatou que a maioria dos tiros penetrou os corpos formando um ângulo de 45º, ou seja, quando as pessoas estavam abaixadas ou de joelhos, o que configura execução. Esse é apenas um dos exemplos que mostra que essa política de confronto está equivocada. Não adianta matar, pois nas favelas o que não falta é exército de reserva para o tráfico, devido à falta de perspectivas para o jovem carente. Por isso, são necessárias políticas públicas na área de educação e saúde, que possam mudar essa situação a longo prazo. Mas isso nós não vemos. O que há são intervenções imediatas, de caráter eleitoreiro. 

Angelo Cuissi

Coronel Ubiratan Angelo

Apreensão

Já o Coronel da PM Ubiratan Angelo ressaltou que até hoje não foram implementadas políticas de segurança pública que possam reger a atuação dos policiais nas ruas do Rio:
— O que ocorre é que o Estado não toma essa iniciativa e sua atuação se restringe apenas a estratégias de governança, como compra de armamentos e aumento de efetivo. Portanto, quando ocorrem operações desastradas, a culpa toda recai sobre a instituição policial, quando o Estado deveria ser culpado por não criar uma política eficiente na área de segurança pública para orientar a atuação dos policiais. É a pressão social que pode fazer com que isso mude. É necessário estabelecer um pacto social para fiscalização e avaliação do Governo.

A política de enfrentamento também foi alvo de críticas do Coronel:
— O confronto armado não enfraquece o tráfico. Os criminosos que morrem são prontamente substituídos. O que deveria ser feito é o fechamento das divisas do Rio, com diminuição da área metropolitana e intensa fiscalização nas rodovias, por onde entram as drogas. A apreensão sim é eficaz, pois diminui o capital de giro dos traficantes, enfraquecendo-os.

Com agradecimentos a todos os participantes, o evento foi encerrado pelo representante da ABI no seminário, Estanislau Alves de Oliveira, Diretor Administrativo da Casa.