Justiça determina retirada de vídeos ofensivos às religiões africanas


Por Cláudia Souza*

16/06/2014


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  O desembargador Roy Reis Friede, da 2ª Região do Tribunal Regional Federal (TRF), decidiu, em caráter liminar, no último dia 13, pela retirada do ar de 16 vídeos ofensivos às religiões de matriz africana. De acordo com a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR) e a Associação Nacional de Mídia Afro (ANMA) o alvo da decisão é o Google, que tem, conforme a sentença, 72 horas para suspender a veiculação do material. Caso a decisão não seja cumprida, o Google terá que pagar multa de R$ 50 mil.

Nos vídeos, que foram questionados dezenas de lideranças religiosas, são atribuídos aos cultos de matriz africana atos de bruxaria e satanismo. — Esta é uma vitória do Brasil. As religiões de matriz africana fazem parte da cultura do povo brasileiro, independente de crenças. Essa semente do fascismo não pode dar frutos em uma nação como o Brasil.

O relator fundamentou sua decisão na Constituição Federal, assim como nos princípios internacionais que estabelecem os chamados Direitos Humanos, afirmou o babalawo Ivanir dos Santos, representante da CCIR.

Márcio de Jagun, presidente da ANMA, lembrou que a decisão do desembargador deverá ser submetida a outros desembargadores e, depois, o caso retornará para as mãos do juiz Eugênio Rosa de Araújo, titular da 17ª Vara Federal.

— Será o mesmo magistrado que, ao receber o pedido de retirada dos vídeos do ar, em ação movida ainda no início de 2014, não somente negou a solicitação como também emitiu, em sua sentença, a opinião de que candomblé e umbanda não seriam religiões, pois, segundo ele, não têm a figura central de um Deus e também não possuem um livro no qual que se basear.

Liberdade de expressão

Diante da comoção popular causada pela declaração, o juiz voltou atrás da decisão, mas manteve a autorização para que os vídeos, considerados ofensivos tanto à umbanda quanto ao candomblé, permanecessem disponíveis na internet. A retirada das imagens doa ar, segundo Eugenio Rosa, seria uma afronta à liberdade de expressão e de reunião: “a liberdade de expressão (no caso das pessoas que aparecem nos vídeos difamando as religiões de matriz africana) não pode jamais constituir autorização irrestrita para ofender, injuriar, denegrir, difamar e/ou caluniar outrem.”

Na tentativa de defender a tradição e a identidade da umbanda e do candomblé, representantes das religiões afro-brasileiras reuniram-se com o juiz Eugenio Rosa de Araújo, e protestaram contra a discriminação e o preconceito. O magistrado explicou que a decisão relacionada aos vídeos tem caráter liminar, e o mérito ainda não foi analisado. Depende agora do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, já que o Ministério Público Federal (MPF) apresentou recurso contra a sua decisão e moveu uma ação contra a empresa Google Brasil Internet Ltda.

De acordo com Eugênio Rosa, após o pronunciamento do Tribunal, o processo voltará para a 17ª Vara Federal, onde será julgado. O órgão já ordenou a citação da Google Brasil Internet — onde os vídeos foram postados pela Igreja Universal — para fazer a sua defesa na ação.

O MPF apelou ao Tribunal Regional Federal (TRF) contra a decisão de primeiro grau, mas o Tribunal ainda não se pronunciou. Na sentença, Reis Friede afirmou que “a liberdade de expressão (no caso das pessoas que aparecem nos vídeos difamando as religiões de matriz africana) não pode jamais constituir autorização irrestrita para ofender, injuriar, denegrir, difamar e/ou caluniar outrem.”

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No último dia 27, foi lançada na Câmara dos Deputados a Frente Parlamentar em Defesa das Comunidades Tradicionais de Terreiro. O lançamento coincidiu com a repercussão negativa da decisão do juiz Eugênio Rosa de Araújo, que dias depois da divulgação da sentença, voltou atrás de sua avaliação.

Para o deputado Valmir Assunção (PT-BA), a Frente Parlamentar, da qual é um dos integrantes, representa um instrumento de articulação entre as comunidades de terreiro e o Congresso.

— As propostas da frente incluem a defesa das religiões de matrizes africanas e brasileiras, a liberdade ao culto, o combate à intolerância, além da promoção de projetos de lei, de audiências públicas, de seminários e de eventos que tratem do tema. A frente está sendo articulada desde 2011, e são necessárias 198 assinaturas de parlamentares para viabilizar o processo. Felizmente, aconteceu neste momento que não poderia ser mais oportuno.