Um olhar intimista sobre a vida na cidade


10/01/2007


José Reinaldo Marques 
12/01/2007

Integrante da equipe de fotojornalistas da Folha de S. Paulo, Tuca Vieira está há 15 anos na profissão. Estudou com Cláudio Feijó, Eduardo Castanho, André Douek, Nair Benedicto e Eder Chiodetto e diz que escolheu a carreira — “um caminho sem volta” — aos 16 anos de idade. Para ser um fotógrafo ainda melhor, formou-se em Letras pela Universidade de São Paulo (USP):
— Sempre me interessei pela relação da palavra com a imagem. Devo muita coisa à faculdade e aos livros.

Tuca — cujo nome completo é Luiz Arthur Leitão Vieira — diz apreciar a “solitude fotográfica”, que explica da seguinte forma:
— Você só precisa de uma câmera, uns rolos de filme e mais nada.

Fez essa descoberta quando era adolescente, quando viajou sozinho ao exterior. Conta que percorreu lugares onde ninguém da família tinha ido e, de alguma forma, queria passar o que sentia aos amigos e parentes:
— Minha madrinha tinha me dado uma câmera Yashica falsificada que fazia uma coisa incrível: transformava 36 fotos em 72 (depois descobri que ela usava meio fotograma por vez). Com ela, fui registrando tudo o que via. Como estava sozinho e não podia fotografar a mim mesmo, meu olhar ficou mais atento às coisas. Descobri que um passo para o lado ou um dobrar de joelhos mudava tudo. Voltei ao Brasil, falei com o Cláudio Feijó e me inscrevi num curso da escola Imagem-Ação.

Tuca Vieira deu seu primeiro passo na profissionalização como laboratorista do Museu da Imagem e do Som de São Paulo. Antes de ingressar na Folha — onde está desde 2002 — trabalhou na Agência N-Imagens e fez freelances para todo tipo de espetáculo cultural. Foi assistente de estúdio — “para ter certeza de que não era aquilo” —, passou pela redação do Estadão e também trabalhou no Sesc-SP:
— Fotografei festa de Natal e corrida de cavalo e fiquei quatro anos na N- Imagens, com a Nair Benedicto, fazendo matérias para o Diário do Comércio. Depois, recebi convite do Eder Chiodetto para vir para a Folha. Durante esse tempo todo, também desenvolvi um trabalho pessoal, mais íntimo, que é muito importante para mim.

Prêmios

Vencedor do Prêmio Folha de Jornalismo 2003 e do Prêmio Grupo Nordeste de Fotografia 2005, na categoria profissional, Tuca não esconde que seu tema predileto é a paisagem urbana. Foi ela que inspirou o livro “As cidades do Brasil — São Paulo”, feito em parceria com o jornalista Marcelo Coelho e lançado pela Publifolha.

Seus trabalhos também já foram mostrados nas exposições individuais “A luz da terra do sol” (1994) e “Um caminho nas Índias” (2002) e nas coletivas “Foto São Paulo” (2001), “Fotojornalismo São Paulo” (2004) e “Retrospectiva 2004”.

O material jornalístico de Tuca Vieira demonstra que ele tem, cada vez mais, enveredado pelo caminho do urbanismo e da arquitetura das metrópolis:
— É o meu habitat e, também, o grande fenômeno moderno. Hoje as pessoas estão cada vez mais nos grandes centros, cidades com 10, 15, 20 milhões de habitantes. O desafio de fazer meu trabalho convivendo com essa multidão me fascina.

Quando está de câmera em punho em busca das boas fotos, Tuca diz que é guiado “pelo prazer de fotografar”. Gosta da escola norte-americana — que chama de “fotografia de rua” — e destaca o trabalho de Josef Koudelka, tcheco que fotografou a Primavera de Praga, os ciganos do Leste Europeu e a Europa pós-muro de Berlim:
— Ele tem uma sofisticação visual enorme — enfatiza.

Niemeyer

Tuca avalia que os veículos que marcaram época no fotojornalismo nacional foram as revistas — entre elas, Realidade, Manchete e O Cruzeiro. E tem uma reclamação do mercado:
— Ainda existe muito do preconceito que não reconhece o fotógrafo como jornalista, e o repórter-fotográfico enfrenta dificuldades para ter seu trabalho respeitado no que diz respeito a corte, edição, narrativa e legenda. É verdade que o Jornal da Tarde marcou época nos anos 80 e a Folha fez um belo trabalho nos anos 90. Colhemos frutos disso até hoje, mas o fotojornalismo brasileiro ainda é mal publicado.

Em relação a si próprio, ele acha que o trabalho que marcou sua carreira é um retrato de Oscar Niemeyer, por quem tem grande admiração:
— Cheguei ao seu escritório e ele, mal-humorado, me deixou fazer uns cinco cliques. Fiquei meio chateado, mas foi só eu guardar a câmera para Niemeyer se sentir à vontade. Ficamos papeando quase uma hora. Tomei uma lição de vida dessas que não se esquece. Ele me dizia: “A arquitetura não é importante.” E me fazia pensar que a fotografia também não. Outro grande brasileiro de quem gostaria de fazer um belo retrato é Dorival Caymmi.

Ser o elo entre um evento e o leitor, espécie de antigo mensageiro, daqueles que levavam um bilhete por léguas, é não só uma enorme responsabilidade, mas também o que mais atrai Tuca na carreira que escolheu:
— Tradicionalmente, o fotógrafo de jornal era o sujeito que não pôde estudar e encontrava na câmera o instrumento da sobrevivência. Isso trouxe muita espontaneidade e engajamento político para o profissional brasileiro, mas também o preconceito que existe até hoje. Hoje o fotógrafo precisa ter formação acadêmica, viajar, ler, aprender outro idioma. Mas ainda há dificuldade em ser respeitado como jornalista. O mercado não é grande, mas o campo de trabalho é imenso. O Brasil, como nenhum outro lugar, é uma espécie de microcosmo social, onde os embates sociais que apavoram o mundo estão em toda esquina. 

                       
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