Entrevista — Maurício Menezes


03/01/2008


O plantão de notícias que é uma piada

Marcia Martins
04/01/2008 

Guerras, violência urbana, agressão ao meio ambiente são assuntos que têm dominado o noticiário da mídia em geral. Mas no meio de tanta tragédia, um jornalista consegue fazer da notícia uma grande piada. O autor dessa proeza é Maurício Menezes, que com o seu “Plantão de Notícias” provoca os risos amarelos entre os coleguinhas, cujos erros são alvos de suas gozações.

Maurício Menezes nasceu em Gurinhatã, em Minas Gerais, em 1950. Diz, em tom de blague, que escolheram por ele o ofício, lá pelos 20 anos, quando foi encarregado de atender aos ouvintes durante uma greve de jornalistas da Rádio Nacional, pisando pela primeira vez numa redação.

De lá para cá, convive com o excesso de trabalho, já que apenas nos seis primeiros meses de carreira trabalhou em um único emprego. No momento, além da Rádio Tupi, ele atua no teatro — a nova temporada no Teatro Ipanema começa dia 8 de janeiro — tem um site, um programa de TV na internet e a própria produtora. Ao mesmo tempo, escreve um livro sobre os “causos” da imprensa.

ABI OnlineEm que ano você nasceu e em que cidade?
Maurício Menezes — Nasci em l950, para alegria do Brasil, que chorava a perda da Copa do Mundo. Quando me perguntam onde nasci, a pergunta seguinte é “onde fica isso?” É um absurdo não saber onde fica Gurinhatã (MG).

ABI OnlineComo você se decidiu pelo jornalismo?
Maurício — Eu não me decidi. Decidiram por mim. Tinha 20 anos de idade quando entrei pela primeira vez numa redação, para atender aos telefones. Os jornalistas da Rádio Nacional estavam em greve e eu fui colocado na lá para atender aos ouvintes. Nem sabia que ali era a redação. Quando a greve terminou, eu fiquei. 

ABI OnlineQuais foram as principais dificuldades para entrar no mercado?
Maurício — Eu sempre tive uma grande dificuldade na minha vida: o excesso de emprego. Nunca trabalhei num só lugar, exceto nos meus primeiros meses. Já teve uma época em que trabalhei em quatro lugares.

ABI OnlineVocê cursou faculdade de Jornalismo?
Maurício — É o meu maior arrependimento. Não tive tempo de cursar a faculdade de jornalismo.

ABI OnlineO que você acha do diploma do jornalismo? Ele é dispensável como julgam alguns teóricos?
Maurício — Nenhum diploma é dispensável. Mas também não é o diploma que faz o jornalista. 

ABI OnlineQuais foram os principais veículos por onde passou?
Maurício — Todos foram importantes, mas eu fiquei 29 anos na Rádio Globo e 25 na sucursal Rio do Estadão. Mas tive passagens pela Rede Globo, pelo Grupo Visão, Flamengo, Tribunal de Justiça, TRE. 

ABI OnlineAlém da Rádio Tupi, você está trabalhando em outro local?
Maurício — Hoje, além da Rádio Tupi, eu atuo no teatro (em 8 de janeiro começa nova temporada no Teatro Ipanema), faço o meu site e um programa de TV na internet, e ainda tenho uma produtora , a FullTime. E estou escrevendo um livro sobre os “causos” da imprensa.

ABI OnlineVocê já passou por vários veículos, tem preferência por algum?
Maurício — Gosto muito do rádio. Talvez por causa da agilidade do veículo. Na TV, adoro fazer o programa de humor. Mas não tem nada melhor do que o rádio, ao vivo.

ABI OnlineComo surgiu a idéia de reunir as gafes dos jornalistas no “Plantão de Notícias”?
Maurício — Foi no plantão na porta da casa do Roberto Medina, quando ele estava seqüestrado. Eu ficava contando histórias de colegas. Dali fui para o bar e do bar para o teatro.

ABI OnlineO “Plantão” já tem 17 anos. Há alguma diferença nas mancadas cometidas pelos jornalistas nos dias atuais?
Maurício — É a mesma coisa. Agora a questão é agravada pela velocidade da informação. O tempo entre o fato e a sua veiculação é de poucos minutos. E a pressa é que conduz ao erro.

ABI OnlineComo você apura esses erros para contar no show?
Maurício — Eu leio muitos jornais e revistas, o tempo todo. Sempre que viajo, paro naquelas bancas do aeroporto e compro todos os jornais. E dois estudantes de jornalismo me ajudam, o Fernando Moreira e o Pablo Kirschner. Mas os ouvintes e telespectadores me ajudam muito também, enviando material.

ABI OnlineAlgum jornalista já ficou aborrecido por ter a sua mancada contada por você no “Plantão”?
Maurício — Nunca um colega reclamou. Porque os erros que eu mostro fazem parte do nosso trabalho. Eu, no teatro e nas palestras que faço, mostro isso, que nós somos vítimas da pressa exigida pelos nossos clientes. Um juiz pega um processo e tem um mês para analisá-lo. Um jornalista pega o mesmo caso e tem duas horas para contar o que aconteceu. E eu conto erros meus também. Muitos dizem que entendem melhor o trabalho do jornalista, depois de ver o meu show. E são muitos os estudantes que dizem ter decidido pela carreira de jornalista depois de assistir ao “Plantão de Notícias”. 

   Maurício com Ulisses Mattos e Alexandre Paim

ABI OnlineExiste algum erro histórico, que não pode faltar no show?
Maurício — Tem alguns casos clássicos, do rádio principalmente, que eu não posso deixar de apresentar no show. Do locutor que pegou um texto fúnebre por engano e mandou o pessoal se apressar, porque o enterro estava acontecendo: “Se vocês correrem ainda pegam o finalzinho…”

ABI OnlineE qual foi o maior erro que você cometeu?
Maurício — Tem dois. Recebi uma denúncia de que um preso estava sendo torturado no DOI-Codi e fui lá apurar. Outra foi ter achado que Adionel (assessor de imprensa da Arquidiocese do Rio) não era um nome próprio, mas sim um cargo da Igreja. E aí eu perguntei, por ter achado que ele era muito jovem, há quanto tempo ele era Adionel.

ABI OnlineJá passou por alguma saia-justa no palco?
Maurício — Ihhhh… eu estou quase montando um show sobre os erros no teatro. Eu estava no Teatro das Artes, em São Paulo, e o público já tinha entrado. Eu atrás da cortina, comecei a ajeitar o microfone sem-fio. Estava com as calças arriadas e alguém acionou o mecanismo automático de abertura das cortinas. Aqui no Rio, certa vez, um maluco subiu no palco. Outra vez o pessoal do “Pânico” foi me ver, mas graças a Deus eles ficaram sentados, só assistindo. Graças a Deus mesmo. 

ABI OnlineVocê já torceu pelo erro de algum jornalista em especial?
Maurício — Claro que eu não torço pelo erro. Mas uma vez pediram que eu fizesse uma palestra num tal de Curso de Aperfeiçoamento de Jornalistas. Eu disse que não ia colaborar com um negócio desses. Mas hoje o mais incrível é o Daniel Sabbá, da CNT. É uma figura deliciosa.

ABI OnlineVocê tem idéia de quantas pessoas já assistiram ao “Plantão” e quantas apresentações já fizeram?
Maurício — É uma pena eu não ter catalogado isso. Sou muito desorganizado. Mas já fiz apresentação-solo no Teatro Amazonas. Tem ator profissional que nunca conseguiu isso. No Rio, me apresentei também no João Caetano, no Copacabana Palace e no Canecão.

ABI OnlineQuem integra a equipe do “Plantão de Notícias atualmente” ?
Maurício — Eu gosto muito de trabalhar com pessoas que não são artistas. Geralmente, escolho estudantes de comunicação. Hoje no teatro, estão comigo a Júlia Marvi, que estuda jornalismo em Belo Horizonte; o Fernando Moreira, que é aluno das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha); o Hélio Júnior, que já está formado; e o Edmundo Alvarenga, o baixinho, que ainda está em formação. A nossa produtora é a Cris Pimentel, uma jornalista de São Paulo, que está mora no Rio há 10 anos. 

ABI OnlineE o programa na TV?
Maurício — O programa de TV surgiu porque o público de rádio e de teatro cobrava muito. Não agüentava mais ouvir: “Vocês tem que ir para a TV”. Fizemos bons programas, a Adriane Galisteu tentou nos ajudar, mas nunca conseguimos espaço. Tínhamos muitos fãs, inclusive entre produtores da TV Globo e apresentadores como Jô Soares. Passamos pela CNT, Record e Band, que foi a nossa melhor fase. Mas um dia o Antônio Brasil, do site Comunique-se, escreveu um artigo dizendo que o “Plantão de Notícias” era uma prova de que havia humor inteligente na TV. Isso matou a gente, porque na TV parece que não gostam muito de coisas ligadas à inteligência.

ABI OnlineComo era fazer o programa de TV, o show do “Plantão” e ao mesmo tempo ser assessor do Tribunal de Justiça e depois do TRE?
Maurício — Eu nunca tive problemas. Pelo contrário: fui em muitas reuniões de juízes e desembargadores e no final eu fazia um show, para melhorar a carga negativa, que ficava no ambiente.Uma vez o Presidente do TRE, Desembargador Marlan de Moraes Marinho, foi me ver no teatro e no final era feito um sorteio. Ele ganhou uma camisa. Outras vezes, durante julgamentos, faziam comentários ao meu trabalho. Nunca houve nada negativo, até porque os juízes, em geral, são bem-humorados.

ABI OnlineComo você avalia o jornalismo e o jornalista nos dias atuais, com equipes formadas, principalmente por jovens?
Maurício — Eu nunca tive nenhum problema na minha carreira, porque sempre agi no interesse do público e no interesse do Brasil. Eu, sempre que faço palestras em faculdades, reclamo que deveriam ensinar que o jornalista não deve brigar com a notícia. Acho que a arrogância, que leva o repórter a trombar com a notícia, é o problema mais grave. Cansei de ver o sujeito dizer que não vai dar uma notícia para não “encher a bola” de alguém. Ou que vai noticiar pela metade, para atingir alguém. 

ABI OnlineVocê tem ou já teve alguma relação com a ABI?
Maurício — Eu tenho o maior respeito pela ABI. Acho que é o nosso templo, como abrigo; o nosso Vaticano, como instituição. Já passei bons momentos da minha vida nesse prédio, inclusive num dos nossos melhores momentos, quando precisamos destituir um presidente do Sindicato dos Jornalistas. Na fase de redemocratização, a ABI foi palco de muitos encontros (e até desencontros) de jornalistas e intelectuais. Passou por uma fase muito difícil e cheguei a ficar com os olhos cheios de lágrimas, há dias, quando entrei no prédio e vi que as coisas estavam funcionando, os banheiros limpos, os corredores cheios de gente. Uma maravilha!

ABI OnlineQuando e onde será o próximo Show do “Plantão de Notícias”? Terá novidades?
Maurício — Como eu falei, tenho alguns projetos para 2008. No dia 8 de janeiro lanço uma nova temporada no Teatro Ipanema. Vou apresentar muitas coisas novas, como uma estagiária que vai entrevistar o diretor da Usina Nuclear de Angra dos Reis. No teatro, passo a apresentar também erros da TV.

ABI OnlineE na TV?
Maurício — Voltei a gravar o programa de TV, numa parceria com a Universidade Plínio Leite, em Niterói. O programa está toda a semana, na internet (www.plantaodenoticias.com.br). Gostaria muito de voltar à TV, vamos ver se consigo. Os diretores preferem muitas vezes colocar filmes velhos, que dão traço de audiência, a nos ceder o espaço. Nunca entendi isso. Mas eles é que são os diretores.