Um comovido adeus a Oderfla Almeida


02/02/2011


Em artigo publicado no site do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, o jornalista Álvaro Caldas fez comovida evocação de seu companheiro Oderfla Almeida, falecido em 22 de janeiro passado, após longa internação motivada por um acidente vascular cerebral. Dias antes de seu passamento, Oderfla completara 75 anos.
 
Sócio da ABI desde 28 de novembro de 1972, Oderfla, nome Alfredo ao contrário, trabalhou nas revistas técnicas da Editora Abril nos anos 70, na “Ultima Hora”, no “Correio da Manhã” e no “Jornal do Brasil”. Ele se desligou da imprensa diária para trabalhar na Assessoria de Imprensa do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social-BNDES, ao qual permaneceu vinculado.
 
Seu companheiro desde os tempos em que estudaram na antiga Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, hoje Universidade federal do Rio de Janeiro, Álvaro Caldas prestou a Oderfla a homenagem deste artigo:
 
“Morreu o nosso querido “clown”

A notícia da morte me pegou fora do Rio, chegou pelo celular, sábado mesmo de manhã, através do Sérgio Campos, um destes que gostava muito do Fla, Fifa, OSA, entre os vários apelidos ou codinomes que usou ou lhe foram atribuídos. Com o Sérgio estive com ele a última vez, no hospital, no Barreto. Já não nos reconheceu, não conseguia falar, sorrir, atado a fios e engrenagens que sustentam uma vida absurda e impossível.

Por que amávamos tanto o Oderfla? Esta é uma questão que sua morte repõe.

Vivi com ele várias experiências gratificantes e marcantes, tanto na faculdade quanto fora dela. Aprendi muito com o Oderfla, e não foi apenas aquela história contada pelo Vivaldo de que ele me introduziu no mundo da música clássica. Foi meu paciente professsor e de outros, ele que era impaciente, queria tudo muito rápido, mas sobretudo um apaixonado pelo mundo dos compositores clássicos.

Chegou a estudar para ser maestro, possuía um ouvido soberbo, para meu espanto reconhecia melodias de sinfonias e sonatas ao primeiro toque, e conhecia a vida e as paixões de cada um dos seus eleitos. Falava de Bach, de Beethoven, de Korsakov, de Mendelsohn como se fossem nossos companheiros de mesa de bar.

Ele, Arquimedes e eu certa noite fenefiana, passada na areia da praia Vermelha, namoramos a mesma musa, Mariuza, que nos chamava de “estetinhas”. Depois cada um escreveu um texto surrealista sobre aquela reveladora experiência,  em que inocentemente acrescentamos um personagem ao Jules e Jim do Truffaut.

Creio que todos temos alguma coisa para contar, em todos ele deixou sua marca.E que marca era esta? Antes de tudo o humor, a simplicidade, a irreverência, o desprendimento, a alegria e uma certa e sábia porralouquice que a todos contagiava. Uma espécie de “clown” que não queríamos perder, precisávamos ter sempre do nosso lado. Era a nossa porta de saída da caretice, do bom mocismo, a nossa porta para uma outra percepção.

Ele era mais livre, mais destemido, mais anárquico, como que desafiando  nossa pretensa “sabedoria e seriedade”. Mas com toda humildade, nunca quis se impor, não gostava de desavenças, detestava discussões cerradas.

E falava paca, soltava a emoção sem censura. Ás vezes era difícil de ouvir, eu tinha que gritar “porra, Oderfla, dá um tempo, ouça”. Quantas vezes enchemos a cara naquelas tardes, final de expediente, ali no bar nos fundos da Lidador da Sete de Setembro, com Ernesto, Nacif e tantos outros.

Foi fundo em tudo, no álcool, na sua maconha, companheira diária de uma  viagem que só a muito custo e sofrimento largou. Mas aí já foi o início do fim. Quiseram enquadrá-lo, matar o belo e inquieto “clown” que havia nele,  e, claro, ele não suportou. Foi definhando até apagar. A ele, portanto, nossa homenagem, que o Fifa merece.

Beijos e abraços,

Álvaro Caldas.