17/05/2017
A Organização ARTIGO 19 lançou, no último dia 15, o relatório “Os 5 anos da Lei de Acesso à Informação – uma análise de casos de transparência”. O estudo faz um balanço sobre como a Lei de Acesso à Informação (LAI) vem sendo aplicada por órgãos públicos no Brasil desde que entrou em vigor, em 16 de maio de 2012.
A Organização acrescentou que o relatório pontua os avanços e principais desafios para implementação da lei pelos órgãos públicos do país em seus cinco anos de existência (veja lista ao fim do texto). Para essa análise, o trabalho se utiliza de material contido nos relatórios e pedidos de informação realizados pela ARTIGO 19 no período, além da experiência da entidade na divulgação da LAI e na interação com órgãos públicos.
Na publicação, a Artigo 19 ressalta que, entre os avanços registrados, estão o considerável progresso no volume de informações acessíveis à população, o estabelecimento de mecanismos para a elaboração de requerimentos de informações e o aumento no número de cidades e Estados que regulamentaram a LAI.
Já entre os desafios são apontados o deficit de apropriação da LAI por órgãos públicos estaduais e municipais, a recorrente exigência para que os requerentes forneçam dados pessoais para além do que determina a LAI e as altas taxas de respostas de baixa qualidade a pedidos de informação.
Casos de transparência
A publicação da ARTIGO 19 também traz cinco casos emblemáticos nos quais a transparência foi tema central para o exercício de direitos humanos.
O primeiro caso retrata os esforços do Instituto Socioambiental (ISA) para acessar as informações referentes aos investimentos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) na construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte e as dificuldades enfrentadas pelas comunidades afetadas para acessar informações sobre os impactos da obra e o cumprimento de condicionantes ambientais.
O segundo caso fala sobre o processo de obtenção junto ao Ministério do Trabalho da lista de empresas flagradas empregando trabalhadores em situação análoga à escravidão, conhecida como “Lista Suja do Trabalho Escravo”. Após ter sua publicação suspensa em 2014, a lista voltou a ser pública em 2017 por meio da aplicação da LAI.
Logo a seguir, a publicação fala sobre o caso da “Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida”, que utilizou a LAI para obter e divulgar dados relativos aos relatórios que avaliam o uso de agrotóxicos nos alimentos consumidos no Brasil, revelando suas incongruências e as inúmeras dificuldades do processo. Tais informações são de elevado interesse público e essenciais para orientar consumidores e agricultores.
O quarto caso lembra a medida tomada em fevereiro de 2016 pelo governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, que tornou secretos diversos documentos e registros relativos à segurança pública, desencadeando uma grande discussão sobre a excessiva cultura de sigilo existente na área. O caso questiona a premissa de que a segurança pública seria uma área das políticas públicas que estaria à margem dos princípios da transparência e participação social.
Por fim, o quinto caso discute a falta de informações públicas disponíveis sobre o aborto legal no Brasil, amparando-se nos pedidos de informação feitos pela ARTIGO 19 sobre os serviços de atendimento para a realização do procedimento e ainda em dados disponibilizados nos sites do Ministério da Saúde e outros órgãos públicos. A ausência de informações públicas sobre tema tão relevante à vida das mulheres viola seus direitos e demonstra a omissão do Estado em uma questão crítica de saúde pública no Brasil.
Falta de órgão nacional independente é questão chave
Para Joara Marchezini, coordenadora de Acesso à Informação da ARTIGO 19 e uma das responsáveis pelo relatório, a aplicação correta da Lei de Acesso à Informação no Brasil poderia ser mais disseminada entre os órgãos públicos brasileiros caso existisse um órgão nacional independente e especializado no monitoramento da lei.
“A criação de um órgão que atue com independência em relação ao Executivo e que tenha a incumbência de exercer as funções de controle, acompanhamento e promoção da Lei de Acesso à Informação nas esferas federal, estadual e municipal certamente traria grandes benefícios para a prática da transparência entre os órgãos públicos brasileiros. Acreditamos que a aplicação insuficiente da lei que temos observado em alguns casos deriva justamente da ausência de órgão”, afirma.
Ela lembra, no entanto, que já existem alguns órgãos de atuação restrita que desempenham a tarefa, ainda que não seja com a abrangência ideal. “Temos hoje controladorias e ouvidorias que, na ausência de um órgão nacional independente, têm sido importantes para a aplicação bem sucedida da LAI em determinados locais. No entanto, algumas delas, como a Controladoria-Geral da União e a Controladoria-Geral do Município de São Paulo, têm sofrido com um rebaixamento em seu status político, o que definitivamente representa uma grande preocupação para a pauta da transparência”, conclui.
5 anos da Lei de Acesso à Informação (2012-2017)
AVANÇOS
• Houve progresso considerável no volume de informações acessíveis para a população.
• Diversas práticas necessárias de transparência ativa foram adotadas.
• Mecanismos para requerimento de informação foram estabelecidos em inúmeros órgãos públicos.
• A quantidade de cidades e estados que regulamentaram a LAI avançou consideravelmente.
• A taxa de pedidos de informação bem respondidos cresceu, assim como a quantidade de trabalhos jornalísticos de interesse público que utilizaram a LAI e a apropriação da sociedade civil dos mecanismos da lei
DESAFIOS
• A LAI tem sido aplicada em graus diferentes pelos órgãos do Executivo, Legislativo e Judiciário na esfera federal. Apesar disso, é nesta esfera em que os maiores avanços têm sido observados, ressalvadas pouquíssimas exceções entre Estados e municípios.
• A ausência de sites especializados para a realização de pedidos de informação em algumas esferas de poder tem se configurado um limitador para o exercício do direito de acesso à informação de forma fácil, amigável e intuitiva para boa parte da população.
• Mesmo no âmbito federal, mas com destaque para exemplos estaduais e municipais, diferentes órgãos ainda têm imposto exigências excessivas relacionadas à identificação dos requerentes.
• Ainda existe baixa divulgação por transparência ativa de informações de qualidade que viabilizem a participação popular efetiva.
• São observadas dúvidas e inconsistências na divulgação das listas de documentos classificados como sigilosos e nos próprios procedimentos classificatórios, como a ausência do campo “assunto do documento”. Isso é especialmente verdade para temas e áreas considerados sensíveis, como segurança pública.
• Embora a responsividade aos pedidos de informação venha progredindo, a qualidade e completude das respostas aos pedidos ainda é um tema para atenção e medidas corretivas. A aplicação das exceções legais previstas na LAI é especialmente relevante nesse contexto, sendo essencial o estabelecimento de parâmetros claros e progressistas no tocante à compreensão das restrições relativas à privacidade, segredo de Estado, segredo bancário e industrial, entre outros.
A ARTIGO 19 é uma organização não-governamental de direitos humanos nascida em 1987, em Londres, com a missão de defender e promover o direito à liberdade de expressão e de acesso à informação em todo o mundo. Seu nome tem origem no 19º artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU.