Pressão popular faz Câmara derrubar a PEC 37


26/06/2013


Parlamentares se manifestam contra a PEC-37 durante a votação na Câmara. (Crédito: Nilson Bastian / Câmara dos Deputados)

Parlamentares se manifestam contra a PEC-37 durante a votação. (Crédito: Nilson Bastian / Câmara dos Deputados)

Sob a pressão formada pelos protestos que tomaram as ruas do Brasil nas últimas semanas, a Câmara dos Deputados arquivou a PEC 37/2011, também chamada de PEC da Impunidade, em votação na noite desta terça-feira, 25 de junho. A proposta de emenda constitucional pretendia excluir o poder de investigação de outros órgãos que não a Polícia, como o Ministério Público, as Comissões Parlamentares de Inquérito e a Controladoria-Geral da União. O projeto foi rejeitado por 430 votos a 9, e duas abstenções.

Já na madrugada de quarta-feira, 26 de junho, outros itens mencionados nas manifestações também passaram por votação acelerada. Os deputados aprovaram também o projeto que destina 75% dos recursos da exploração do petróleo (royalties) à área de educação e 25% para saúde, texto que ainda precisa ser aprovado pelo Senado.

A PEC 37 era uma das matérias em tramitação mais atacadas pelos recentes protestos nas ruas do País. Desde o projeto começou a ser objeto de lobby junto ao Congresso Nacional pelos delegados de polícia, em 2011, a ABI sempre manteve um posicionamento contrário à proposta, que poderia contribuir significativamente para o aumento da impunidade. A posição da instituição foi reiterada no dia 13 de junho, quando a Casa do Jornalista recebeu a visita do procurador-chefe do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro(MPF-RJ), Guilherme Raposo, e dos procuradores Cláudio Gheventer e Thiago Miller.

Na ocasião, os representantes do MP expuseram uma série de inconvenientes, como o alto grau de corporativismo da proposição. Ainda durante o encontro, o Presidente Maurício Azêdo reafirmou a solidariedade da ABI ao movimento contra a PEC 37. Após a visita, no dia 18 de junho, a Casa do Jornalista emitiu um comunicado às lideranças de partido no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, pedindo-lhes que votassem pela rejeição da proposta. Veja aqui o teor da mensagem.

Votação

A votação foi realizada com as galerias da Câmara tomadas por procuradores e promotores. O Presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) recorreu a uma manobra regimental para garantir que a PEC 37 fosse apreciada – e derrubada – ainda nessa terça. Ao final da sessão ordinária que debatia o projeto que destina os royalties do petróleo para a educação, Henrique Alves interrompeu a discussão e convocou uma sessão extraordinária para discutir exclusivamente a PEC 37. Assim ele evitou o risco de a votação dos royalties avançar madrugada adentro e a PEC fosse prejudicada por falta de quórum.

Para tentar um acordo no texto da PEC 37, foi constituído um grupo de trabalho coordenado pelo Ministério da Justiça, com a participação de deputados, delegados e procuradores. Mas não houve consenso. “O povo brasileiro, que quer cada vez mais o combate à corrupção e à impunidade, gostaria de ver o MP e os delegados unidos”, declarou o Presidente da Câmara. “Demos um prazo até segunda-feira, 24 de junho, para que na noite de hoje não tivesse nem vencedores nem vencidos.”

Alves afirmou ainda que, depois da rejeição da PEC 37, o compromisso da Casa é votar o fim do voto secreto para cassação de mandatos (PEC 196/12). “É um compromisso que nós temos e vamos pautar até o final deste período legislativo”, disse.

Durante a votação, gritos e aplausos, normalmente proibidos, foram liberados. Todos os partidos orientaram os deputados a rejeitarem a chamada PEC 37, que foi derrubada por 430 votos. Na comemoração, o hino nacional foi cantado por estudantes, procuradores e por parlamentares.

Somente os deputados Abelardo Lupion (DEM-PR), Mendonça Prado (DEM-SE), Bernardo Santana de Vasconcellos (PR-MG), Valdemar Costa Neto (PR-SP), Eliene Lima (PSD-MT), João Lyra (PSD-AL), João Campos (PSDB-GO), Sergio Guerra (PSDB-PE) e Lourival Mendes (PTdoB-MA) foram a favor do projeto. Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) e Paulo Cesar Quartiero DEM-RR) se abstiveram.

Mais tarde, o deputado alagoano João Lyra afirmou que houve um engano em seu voto. A assessoria de imprensa do deputado federal informou que ele corrigiu o voto e está esperando o taquígrafo para encaminhar uma nota oficial à imprensa. Ainda de acordo com a assessoria, ele fez o uso do microfone na Câmara dos Deputados para se pronunciar sobre o equívoco. Questionados por diversos seguidores em seu Twitter, Lyra respondeu que ocorreu um “engano” e que “o correto seria votar de acordo com o que foi decidido pela bancada do PSD”

Já parlamentares que votaram a favor admitiram que a pressão nas ruas foi fundamental para derrubar a PEC. “Isso não aconteceria sem as ruas”, avaliou Walter Feldman (PSDB-SP), para quem, sem a voz das ruas, ao menos 70% dos deputados apoiariam o projeto.

O autor da PEC 37, deputado Lourival Mendes (PT do B-MA), foi vaiado pelos manifestantes nas galerias ao subir à tribuna para defender o projeto. “Não é a PEC da impunidade”, afirmou o maranhense. “Lamentavelmente a PEC foi rotulada de algo que nada tem a ver com o seu objetivo.”

Galerias da Câmara foram tomadas por procuradores e promotores. (Crédito: Luis Macedo / Câmara dos Deputados)

Galerias da Câmara foram tomadas por procuradores e promotores. (Crédito: Luis Macedo / Câmara dos Deputados)

Regulação das atividades do MP

A aprovação tornou-se possível graças a um acordo entre os partidos para votar, mais adiante, projetos que regulamentam os procedimentos de investigação do MP. O líder do PMDB, deputado Eduardo Cunha (RJ), lembrou que haverá outra discussão para regulamentar a investigação criminal no Brasil. “O tema não termina [com a rejeição da PEC], vamos ter que buscar uma proposta em que todos ganhem, a sociedade seja vitoriosa no combate à criminalidade de toda natureza.”

O líder do PSDB, deputado Carlos Sampaio (SP), protocolou nesta terça-feira o Projeto de Lei 5820/13, que regulamenta a investigação criminal no Brasil, em especial a atuação conjunta da Polícia Judiciária e do Ministério Público. “O objetivo é estabelecer um regramento nacional, uma unificação do procedimento de investigação para promotores e delegados. [O projeto] não retira nem restringe o poder de investigação do Ministério Público. Apenas estabelece regras”, disse.

Royalties do petróleo

Por volta das 2h, o plenário aprovou por aclamação o projeto que vincula os royalties do petróleo para educação e saúde. A decisão é uma derrota para o Planalto, que originalmente desejava carimbar o dinheiro apenas para a educação e só incluía os contratos futuros e de rendimentos do Fundo Social, criado no marco regulatório do pré-sal. O líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), afirmou que não há compromisso em sancionar o projeto da forma como foi aprovado.

O relator do projeto, André Figueiredo (PDT-CE), estima que a proposta original do governo destinaria R$ 25,8 bi para a educação em 10 anos, enquanto o texto aprovado pode destinar R$ 280 bilhões para educação e saúde no mesmo período. A proposta ainda será analisada pelo Senado.

O aumento bilionário foi feito porque decidiu-se por mexer em contratos já assinados em áreas nas quais ainda não começou a exploração comercial até 3 de dezembro de 2012 e de metade dos recursos que serão destinados ao Fundo Social. A proposta do governo era só para novos contratos e envolvia apenas o rendimento de aplicações feitas com o Fundo.

A vinculação para a saúde foi feita de 25% sobre os royalties dos contratos, não incluindo os recursos do Fundo Social. O texto final prevê que União, Estados e municípios terão obrigatoriamente de investir esse percentual na saúde, impedindo que Dilma cumpra sua promessa de destinar tudo para a educação.

O Governo considera que da forma como o texto foi aprovado poderá haver questionamento judicial por se interferir em contratos já firmados.

Propostas no Senado

O Senado também resolveu direcionar a pauta de votações aos pedidos feitos nas ruas. O presidente Renan Calheiros (PMDB-AL) apresentou um projeto que prevê passe livre para estudantes matriculados e que tenham frequência comprovada. O dinheiro para financiar a proposta viria dos royalties do petróleo.

Calheiros também anunciou a votação de outros projetos. Um deles pode ser votado nesta quarta-feira, 26 de junho. É o que torna corrupção crime hediondo. Também estão prontos para votação o que destina 10% do Produto Interno Bruto para educação e o que pune juízes e membros do Ministério Público condenados em crimes.

*Com informações da TV Globo, jornais O Estado de S. Paulo, Correio do Estado (MS) e Jornal do Brasil, e Portal Terra.