No Pará, COP das Baixadas reforça protagonismo de colocar a periferia no centro do debate sobre mudanças climáticas


23/02/2023


Por Cássio Miranda e Wellington Frazão, da Comissão de Igualdade Étnico Racial da ABI

A Cop das Baixadas realizada em Belém do Pará e organizado pelo Hub Gueto – Hub de inovação periférica na divisa do Jurunas e Condor – juntou diversos coletivos, ativistas e sociedade para debater soluções sobre a crise no clima. O encontro é uma forma de preparação da COP-30, em 2025, que poderá ser sediada na capital paraense, segundo oficializou o Governo Federal ao indicar o estado do Pará para a realização da Conferência, organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU).

A primeira edição da ‘COP das Baixadas’ foi em formato híbrido e o encontro presencial ocorreu no complexo comunitário Usina da Paz, no bairro do Jurunas, periferia da cidade. Rodas de conversas, apresentações artísticas e a exposição fotográfica do projeto @museu d´gua fizeram parte da programação gratuita e aberta a todos os públicos.

A programação virtual reuniu representantes de vários coletivos e especialistas que estudam o assunto para partilhar e discutir sobre a temática. No encontro presencial, o evento foi dividido em três eixos temáticos: Direito à Cidade – Mobilidade, adaptação e políticas públicas; Comunicação – Artivismo e intervenção artística como conscientização nas periferias; e Clima e Sociedade – Impactos nas periferias, soberania alimentar, alagamentos, deslizamentos e migração.

O ativista Jean Ferreira, fundador do Gueto Hub, e idealizador da ‘COP das Baixadas’ contou sobre as experiências vividas ao participar da COP-27 no Egito.

– Resolvemos antecipar esse debate aqui e pensamos neste evento para colocar a periferia no centro dessa discussão. Mesmo a COP no Egito sendo realizada em um país emergente, pude perceber que os egípcios pouco estavam ali ou não sabiam o porquê daquilo, não queremos que isso aconteça na nossa cidade também- enfatizou.

Jean reforça que a ideia do evento, COP das Baixadas, é ampliar o debate do clima e aproximar as pessoas sobre o tema.

A gente pretende fazer com que a COP não termine aqui. Vamos continuar fazendo ações para que as pessoas conheçam mais e essa foi a maneira de aproximar quem está periferia ou as demais para que entendam, de forma objetiva, o que é a COP do Clima. Também estamos dialogando com os governos do Estado e o Município para criarem grupos e comissões de trabalho para fazerem parte dessa força-tarefa dos diálogos e discussões entre a periferia e governos visando a realização da COP-30 – destacou.

Domingos Conceição, liderança do Mocambo, uma associação social do Movimento Afrodescendente do Pará, que tem como objetivo organizar coletivamente pretos e pretas na luta contra o racismo, falou sobre a importância do debate do clima e das lutas comunitárias em Belém.

– Esse evento recupera um longo processo histórico da luta comunitária na cidade, que antigamente era organizado pela Comissão dos Bairros de Belém (CBB). E a COP das Baixadas traz uma nova forma de se comunicar fundamental para este debate, por meio das tecnologias das redes e as tecnologias do sistema de comunicação global, além disso, aproxima mais a juventude que são eles que vão dá sequência à nossa geração.”

Para Ruth Costa, ativista do coletivo Paráciclo e do coletivo Pedala Mana, ressaltou que os desafios do clima perpassam pela ótica da mobilidade e de ouvir os territórios.

– Não dá pra falar, pensar e discutir crise climática na Amazônia se não ouvir as pessoas que habitam os espaços periféricos. A crise climática na região amazônica afeta, diretamente, o deslocamento de ir e vir das pessoas, principalmente, as mulheres negras desses locais. Então, o evento é uma sacudida para chamar a atenção do poder público a conscientização de que não se faz Conferência do Clima sem ouvir os mais afetados – comentou.

Mariana Guimarães, diretora-presidente da Mandí, organização paraense que atua no campo da educação socioambiental reforçou a importância de participar da COP das Baixadas por ser um lugar que surgiu devido a falta de espaço na sociedade para a realização desses grandes debates, como foi a COP-27 no Egito. Nesta virada de chave no cenário político há um novo olhar para a Amazônia. Nós queremos mostrar que a Amazônia está organizada, não é apenas um vazio demográfico. Sabemos o que queremos. Vamos continuar debatendo para avançar nas pautas sobre mudanças climáticas e justiça social – defendeu.

O evento contou com a participação de voluntários, como é o caso da Jully Evangelista moradora do bairro do Jurunas, e ativista social do Gueto Hub. A jovem falou do legado que a COP vai deixar para a comunidade:

– As pessoas precisam dessas informações para saber como esse assunto afeta diretamente a gente que mora na periferia. Falar do que a gente está passando e solucionar este problema de forma conjunta. Nós jovens somos a geração que pode salvar a Amazônia e juntos temos força para fazer isso.”

Fernando Carneiro, político, historiador e pós-graduado em Políticas Sociais, avalia que a pauta da crise do clima não pode deixar de ser debatida também pelos movimentos sociais.

– Primeiro é muito importante que Belém possa sediada a COP-30, mas independente disso, para além das cúpulas governamentais você precisa ter o envolvimento da sociedade e, principalmente, da sociedade que vive e mora nas periferias que são pessoas excluídas, invisibilizadas dos poderes e dos espaços de decisão. A COP das Baixadas é uma experiência fantástica – comparou o Historiados que também lembrou a situação do povo Yanomami.:

– Estamos no coração da Amazônia e precisamos falar dos impactos que esses grandes empreendimentos causam. O que tá acontecendo agora com o povo Yanomami, esse genocídio orquestrado, tem tudo a ver com a destruição da Amazônia, tem tudo a ver com a politica de submissão da floresta, dos povos tradicionais, à lógica do capital, com o desequilíbrio climático – disse.

Nessa primeira edição, a COP das Baixadas, debateu as principais consequências da crise climática sob o olhar das periferias, analisando as diferentes perspectivas dos desequilíbrios ambientais e climáticos, em especial na Amazônia. Também  destacou a importância de coletivos periféricos e sociedade encontrarem caminhos e narrativas que coloquem a periferia no centro do debate sobre a crise climática mundial.