“JK, um estadista do nosso tempo”


14/03/2012


“Muitos hão de perguntar:
Ora, falar sobre Juscelino é assunto que já se tornou lugar-comum no universo da História, e, eu concordo com os que pensam assim. Só que eu encontro uma justificativa para assim proceder… Acontece que nós responsáveis por essa minoria conservadora da Historia do mundo e sobretudo do Brasil onde vivemos, os que sacrificaram e se sacrificam para deixar a esperança de um País mais promissor, não seria justo deixá-los cair no esquecimento sem uma lembrança, uma citação sequer como tem acontecido com grandes vultos brasileiros, como por exemplo no mês de agosto passado. quando aconteceram os aniversários de nascimento e morte do estadista Getúlio Vargas. Por isso, iremos dar apenas rápidas pinceladas sobre a vida do nosso homenageado justamente para não deixar passar em branco um dos maiores vultos da História brasileira.
 
Podemos dizer francamente que raros foram os homens públicos que marcaram sua presença tanto na política quanto na vida social deste País como o ilustre mineiro Juscelino Kubitschek de Oliveira.
 
Nascido em 12 de setembro de 1902, quando o século mal se iniciava, o menino Nonô, como era chamado no Arraial do Tijuco, hoje Diamantina, com ele trazia a carga de um destino que iria mudar completamente a vida do Arraial, o rumo de um país, a História de uma nação inteira.
 
Sim, ele chegara com a primavera e com ele a missão de mudar Minas Gerais, tirando-a da condição de Estado pacato e conservador para a centralidade, a competência política, a ponte entre o Norte e Sul, e sobretudo para um futuro dinâmico e conciliador.
 
O predestinado menino da Diamantina teve uma infância muito pobre, uma adolescência precária e uma mocidade difícil de constantes renúncias… Mal completara três anos de idade perde o pai, o alegre, o caridoso e carismático caixeiro viajante João Cesar de Oliveira, que morrera sem ter completado 34 anos, e dona Júlia, sua mãe, se vê sozinha para criar o filho unicamente com seus minguados salários de professora primária. Após alfabetizá-lo, encaminha-o para os estudos no seminário dos padres lazaristas, onde permanece até os 15 anos incompletos, usando batina e capuz, trabalhando como coroinha na Igreja Nossa Senhora da Luz, da qual tornara-se devoto fervoroso. Ali o adolescente Nonô trabalha e alimenta um sonho que trouxera do berço: ser médico, viver para a medicina. Para alimentar esse sonho, lê todos os livros disponíveis que encontra à sua frente. Aos 17 anos faz concurso para os Correios, e consegue ser um dos primeiros colocados entre os trezentos inscritos. Durante seis anos exerce na capital mineira a profissão de telegrafista e estuda Medicina  – a medicina de seus sonhos…
 
Em 1927, a duras penas, torna-se médico colando grau em 17 de dezembro na Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, e logo é convidado pelo cunhado, Dr. Júlio Soares, para ser seu assistente na Santa Casa da Misericórdia e em seu consultório particular. Começa então para o jovem formando a realização de seu sonho, pois a medicina ainda era sua única meta.
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Em abril de 1930, na ânsia de ampliar seus conhecimentos, licencia-se dos dois empregos e embarca para Paris a fim de especializar-se em urologia e cirurgia.
 
Quando retorna ao Brasil, encontra Getúlio Vargas no poder, e Olegário Maciel é o Governador de Minas Gerais. Juscelino, já com muito mais experiência, volta à clínica do cunhado Júlio Soares, retoma a sua clientela e conhece Sara Gomes Lemos, filha de tradicional família mineira, prima de Francisco Negrão de Lima, futuro ministro da Justiça, Embaixador e Governador do Estado da Guanabara de 1965 a 1971.
 
Casa-se com Sara em 31 de dezembro de 1931, e logo é nomeado para o corpo de médicos do hospital militar da força pública do Estado, onde chefia o serviço de urologia, sua especialidade. Como capitão médico da Polícia Militar mineira, é convocado para servir na Revolução Constitucionalista de 1932. Ali, o médico Juscelino convive todo o tempo com doentes, com mutilados, com desenganados, com mortos… Terminada a Revolução, passa para a reserva no posto de tenente-coronel médico.
 
Fora do hospital, nos bastidores da cúpula mineira, Juscelino convive com políticos influentes e autoridades policiais, que mais tarde seriam figuras de peso durante a longa ditadura de Vargas.
 
Em setembro de 1933, morre de repente Olegário Maciel e Gustavo de Capanema assume inteiramente o Governo de Minas até 12 de dezembro, quando Getúlio Vargas nomeia como interventor Federal o mineiro Benedito Valadares. Juscelino, que se tornara seu amigo, é nomeado para chefiar seu Gabinete Civil, sendo mais tarde em 1940 nomeado prefeito de Belo Horizonte, implantando na capital mineira um sistema de metas sob o slogan: Energia e Transporte, organizando ainda uma estupenda obra urbanística com a colaboração de genial arquiteto Oscar Niemeyer e do grande parceiro Israel Pinheiro.
 
Com este ato de Benedito, perde o Brasil o médico, o cientista, mas em compensação ganha um líder na arte nebulosa da política. Nesta, ele soube como ninguém representar com dignidade todos os papéis que lhe couberam, pois em todos os momentos não deixou de ser ele mesmo, o Nonô da infância pobre, o homem alegre e sorridente, o seresteiro, o pé-de-valsa, o gentleman da sociedade, o operário do povo, o servidor da Nação.
 
Em 1934, elege-se deputado federal, exercendo seu mandato até o fechamento do Congresso Nacional com o advento do Estado Novo. Retorna sem delongas à medicina mas em 1945 reconquista sua cadeira de deputado federal como integrante da Assembléia Nacional Constituinte pelo PSD mineiro; em 1950, é eleito Governador do Estado de Minas Gerais.
 
Não só como prefeito mas também como Governador, Juscelino marcou uma linha divisória na História do Brasil. Como prefeito revelou seu tino administrativo, realizando obras de infra-estrutura, saneamento básico de ruas e avenidas, deixando marcas de sua ousadia até hoje não superadas. Como Governador, continuou seu trabalho em todo o Estado nos mais diversos campos, principalmente em hospitais, escolas publicas, favorecendo o desenvolvimento agropecuário, bem como mineral, explorando as imensas riquezas naturais como instalações siderúrgicas, vias ferroviárias para escoamento da produção para portos marítimos visando à exportação. Com base no binômio Energia e Transporte, criou as centrais elétricas, elevando em 30 vezes o potencial instalando no Estado. Marcando presença como Governador, seu nome passa a ser sinônimo de desenvolvimento .
 
Em 1955, a convite dos correligionários, candidata-se à Presidência da República e, arregaçando as mangas como era de seu feitio, sai em busca dessa nova Meta… Só os íntimos que com ele conviviam sabem dos sacrifícios que lhe foram impostos: andou em lombo de burros, andou em carros de bois; andou em maria-fumaça; conversou com matutos ao som das violas, tomou cafezinhos em canecas de lata; bebeu água de poço em moringas de barro; asentou-se em tocos de árvores sob um sol quentíssimo nos quintais esquecidos do homem do campo; comeu poeira nas estradas desertas dos sertões. Conviveu com a fome onde sertanejos de mãos colegadas exibiam semblantes tristes e pratos vazios… Mas descobriu também o potencial da coragem e perseverança do povo brasileiro. Conseguiu assim em sua carreira política e humana o maior número de adeptos que um político conseguira até então, sendo empossado na Presidência da República em 1956, aplaudido e aclamado pelo Brasil inteiro.
 
Trabalhou em silêncio, diligentemente, disseminando o desenvolvimento industrial, levando para São Paulo a fábrica da Volkswagen e, por influência desta tantas outras vieram, formando assim o parque industrial desta, que mais tarde seria chamado de ABC paulista. Para amenizar a impiedosa seca do Nordeste constrói vários açudes, dentre os principais o de Orós, no Estado do Ceará; Paranoá, Furnas, Três Marias e tantas e tantas outras… Fortaleceu, prestigiando-o, o homem do campo; cuidou da infância com especial carinho; amparou a velhice com desmedido zelo; estimulou a educação e participou ativamente da cultura, tornando-se o Brasil o país de mais rápido crescimento da América Latina. Dentre as grandes realizações internas nos mais diferentes Estados da União, destaca-se a gigantesca obra-sonho de Dom Bosco, que parecia utopia aos acostumados a desmerecer o esforço alheio e a desvalorizar seus patrícios… Com todos esses entraves eis que surge Brasília, a nova capital, concretizando dispositivo já existente na Constituição Republicana de 1891 sobre a transferência da capital brasileira para o Planalto Central. Em 21 de abril de 1960, Brasília é inaugurada como Meta-Sintese de sua administração. O povo brasileiro, sobretudo o nordestino, que se fizera candango, poucas vezes teve a oportunidade de ver tão elevada a sua auto-estima.
 
Juscelino foi o político da dignidade, um sustentáculo vivo da democracia, um líder que, sem piegas, muito menos oportunista, tratou com enorme complacência aqueles que buscavam desestabilizar o seu Governo. Aprendeu com os humildes, deu lições a potentados, conviveu com santos, com hereges, com farsantes, com bajuladores… Em nenhum momento, porém, perdeu seu estilo, seu jeito mineiro medidor aplicando nestas ocasiões todos os ensinamentos que a vida lhe ministrou.
 
Amante da música, especialmente da seresta, cultivou-a até o fim de seus dias como elixir para o seu espírito sensível e renovador. Ainda hoje é carinhosamente lembrado por admiradores que cultuam a seresta como símbolo da presença viva deste brasileiro que tanto fez pelo Brasil em época tão difícil, de poucos recursos, quando não existia a informática: computadores, celulares, internet, aparelhos de alta definição, supersônicos, alta tecnologia enfim…
 
Ao contemplar Brasília do alto da Praça dos Três Poderes, resume todo o seu esforço, a sua dedicação, a sua renúncia num único sentimento, prenunciando em poucas palavras o futuro da nova Capital e escreve: “Deste Planalto Central, desta solidão que em breve se transformará em cérebro das altas decisões nacionais, lanço os olhos mais uma vez sobre o amanhã do meu País e antevejo esta alvorada com fé inquebrantável e uma confiança sem limites no seu grande destino. Como valeu a pena!” Brasília, 2 de outubro de 1956. (a) Juscelino Kubitschek de Oliveira
 
Na chamada “revolução” da década de 1960, os generais da época cassaram seus direitos políticos, ficando o Presidente longo período fora do Brasil. Quando retornou no entanto, foi recebido por seu grande amigo Adolpho Bloch, Presidente do grupo empresarial Bloch Editores, localizado no bairro da Glória, na Rua do Russel, 804, no Rio de Janeiro. Adolpho Bloch, num gesto humano de solidariedade, cedeu a Juscelino nas dependências da mesma um escritório para o recomeço de suas realizações interrompidas…
 
A lenda emoldurou a biografia de um brasileiro nascido em um país que morria de febre amarela e que em três quartos de século tornou-se a oitava economia do mundo!
 
Seria lenda ou realidade…
Juscelino Kubitschek de Oliveira jamais soube… Para ele pouco importava… Tendo como Meta a legalidade institucional e fiel a esta Meta, morre em 22 de agosto de 1976, num desastre de carro juntamente com seu dedicado motorista e amigo Geraldo Ribeiro, que o acompanhava desde a prefeitura de Belo Horizonte. Morreu no Km 165 da Via Dutra, em Resende, entre São Paulo e Rio de Janeiro. Sua morte enlutou toda a nação brasileira.
 
Seu corpo foi velado nas dependências da Bloch Editores, onde compareceu uma multidão incalculável, numa espécie de soluço que ecoou pela nação inteira, pranteando o eterno Presidente Bossa Nova, como era carinhosamente chamado.”