Vigilância e crítica


08/02/2007


Na edição especial do 30º aniversário da IstoÉ — lançada em 1976 pela Editora Três —, o Diretor Editorial Carlos José Marques diz que, ao longo desse tempo, a publicação vem “demonstrando sua vocação para registrar, provocar e participar das mudanças do País”. Ele lembra que a capa da primeira edição já marcava a posição da revista pelo fim do regime totalitário e a volta da democracia:
— A linha editorial, de vigilância e crítica ao sistema, já estava bem definida abrindo sempre espaço para mostrar e analisar o outro lado dos fatos. É um princípio que IstoÉ segue até hoje.

Para dar essa contribuição ao jornalismo brasileiro, a revista conta com uma equipe de 50 jornalistas. O escritório central fica em São Paulo e a revista tem uma circulação média de 350 mil exemplares. Na chefia da sucursal do Rio está a mineira Eliane Lobato, que tem 17 anos de carreira, dez de IstoÉ — somando dois períodos distintos — e passagens pelo Globo, o Jornal do Brasil e a Manchete.

 José Reinaldo Marques

 Eliane Lobato

Entre suas responsabilidades, Eliane destaca como tarefa número um, e talvez a mais difícil, lutar pela aprovação das pautas sugeridas pelo escritório fluminense:
— O estado vem sofrendo um esvaziamento cultural, financeiro e político que afeta nosso trabalho aqui em todos os sentidos. Quando participo das reuniões de pauta na sede, o Rio quase sempre é esquecido. Fala-se muito do Nordeste, de Brasília, o tempo inteiro de São Paulo, mas com freqüência o Rio de Janeiro fica de fora, como se não fizesse falta. É importante mostrar por que o Rio é o segundo estado brasileiro, e que por mais que o seu PIB esteja defasado em relação a São Paulo, a região ainda tem uma importância muito grande para o País.

Para exemplificar melhor o seu argumento, Eliane contou que é muito comum os paulistas acharem que os repórteres cariocas é quem têm a obrigação de fazer matérias com atores de telenovela, pelo fato de a sede da TV Globo ficar localizada no Rio de Janeiro. Mas que ela sempre tenta fazê-los entender que se a pauta veio por São Paulo cabe à reportagem de lá dar conta do serviço:
— Tentamos sempre mostrar que essa não é a nossa tarefa, que o repórter pode pegar o telefone e ligar, por exemplo, para o Reynaldo Gianecchini ou qualquer outro ator, e fazer a entrevista. Não é especificidade do Rio ouvir artistas, isso é uma coisa que o repórter da sucursal não gosta. É uma visão deturpada de São Paulo achar que fazemos isso o tempo inteiro, a toda hora.

Pautas

As reuniões de pauta da sucursal Rio da IstoÉ são realizadas às sextas-feiras, o que mudará em breve, pois o pessoal da sede também passará a fazer a sua nesse dia. Até lá, porém, a equipe continuará mantendo sua agenda e enviando sugestões para discussão na reunião geral que acontece às segundas, com o editor-chefe, os editores, os chefes de sucursal e o pessoal da Arte:
— Não é comum o chefe da sucursal ir a essa reunião em São Paulo — diz Eliane. — Mas, desde que eu assumi a chefia, fui convocada pelo Carlos Marques para participar de algumas. Apesar de eu detestar andar de avião, adorei, porque assim posso defender melhor as nossas pautas. Preferimos trabalhar as nossas matérias, mas às vezes São Paulo “engole” a revista.

Ela conta que, durante o período eleitoral, isso aconteceu várias vezes: a sucursal Rio quase não emplacou reportagens, porque o quadro político fluminense não apresentava fatos quentes. A saída foi fazer matérias com a participação de cientistas políticos de alguns dos mais respeitados institutos acadêmicos do País localizados na cidade:
— Havia um debate fraco entre os candidatos Sérgio Cabral (depois eleito) e Denise Frossard; o Governo Rosinha não empolgava… O noticiário político ficou polarizado entre São Paulo e Brasília e tivemos que usar muita criatividade para contribuir com material de eleição, recorrendo aos ótimos pensadores que estão no Ipea, no Iuperj e na Fundação Getúlio Vargas, para não ficar apenas cumprindo as pautas ditadas pela equipe paulista.

Para Eliane Lobato, as principais revistas semanais, com exceção da CartaCapital, estão muito voltadas para matérias de comportamento, ainda que a política continue sendo o tema de maior destaque:
— Acho que a IstoÉ começou a investir mais nessa linha de reportagens de comportamento antes do que as suas concorrentes; é uma marca da revista. Trabalhamos muito com comportamento e saúde. E as outras também passaram a investir no assunto. 

Fechamento

Na IstoÉ, aprovadas as pautas, as matérias começam a ser distribuídas, não necessariamente sob o critério de que cada sucursal só tratará de assuntos locais. Se o tema tiver apelo nacional, o pessoal do Rio pode ser encarregado de cobrir a região Nordeste e o de São Paulo ficar com o Sul do País:
— Se a matéria é da editoria Brasil, as equipes podem ser deslocadas em viagens e uma parte da matéria também pode ser apurada por telefone e por e-mail. A fórmula é simples: a Reportagem sai em campo e cada chefia se encarrega do sistema de realimentação, falando simultaneamente com todas as praças.

Depois de recebe acabamento do repórter que estiver à frente da matéria e com mais condições de contextualizar o assunto, com pesquisa, teses e números, o texto passa pela aprovação de seu editor direto e, em seguida, pelo editor-executivo da área. Segundo Eliane, com esse controle de qualidade o leitor tem a verdadeira dimensão do fato e compreende por que houve investimento no tema em questão:
— Quem fundamenta a matéria é, geralmente, a pessoa que produz o texto final, porque esta é fase mais complicada. O restante, que a gente chama de costura, são citações dos personagens, fontes acadêmicas etc., a parte mais fácil. O difícil mesmo é convencer o leitor de que a reportagem é importante e interessante e merece ser lida integralmente. Na maioria das vezes, essa tarefa recai sobre a equipe paulista, que tem mais recursos humanos e técnicos.