Carta aberta cobra volta
do Fundo Amazônia


05/08/2020


Desmatamento da Floresta Amazônica (Crédito: O tempo)

Em meio ao desastre ambiental do país, com níveis recordes de queimadas na  Amazônia, registrados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), 50  organizações da sociedade civil lançaram, na terça-feira (4) carta aberta sobre o Papel do BNDES em resposta à pandemia, cobrando a retomada  do Fundo Amazônia, que está paralisado desde o ano passado.  Gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Fundo Amazônia tem patrimônio de cerca de R$ 2 bilhões, constituído por doações dos governos da Noruega e Alemanha, além da Petrobras.  Criado em 2009, para preservação da floresta e desenvolvimento de projetos sustentáveis na região, o Fundo foi desmontado no governo Bolsonaro, pelas mãos do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
A carta aberta foi lançada em transmissão ao vivo pela internet com representantes da Frente Parlamentar Ambientalista, Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas e Frente Parlamentar Mista de Apoio aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Além da direção do BNDES, o documento foi encaminhado aos presidentes da Câmara dos Deputados , Rodrigo Maia, e do Senado, Davi  Alcolumbre,  aos  ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber e Luís Roberto Barroso, responsáveis por duas ações diretas de inconstitucionalidade, que tratam da omissão da União com a paralisação dos recursos do Fundo Amazônia e do Fundo Clima.
As organizações signatárias da carta aberta também querem que o BNDES suspenda o financiamento de projetos em áreas com ocorrência de desmatamento ilegal, e que faça  análises mais acuradas em projetos que resultem impacto social ou ambiental negativo. “Os povos indígenas protegem 13% do território brasileiro e têm que ser inseridos em estratégias e políticas de preservação”, destacou a deputada federal Joenia Wapichana (Rede -RR), participante da reunião virtual.
O documento também cobra “acesso aos recursos do Fundo Clima, que desde 2019 está sem plano de aplicação de recursos, e do Fundo Social, do BNDES, praticamente paralisado desde 2018”, informou Alessandra Cardoso, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).  Coincidência ou não, no mesmo dia do lançamento da carta aberta, e após mais de um ano de inoperância do Fundo Clima, o governo anunciou acordo para repasse de R$ 350 milhões do fundo ao BNDES.
Luciano Coutinho, ex-presidente do BNDES, também presente à videoconferência, lembrou que a criação do Fundo Amazônia – durante sua gestão no banco estatal –   e o sucesso da construção da governança do Fundo foram resultado da interação e do diálogo direto com a sociedade civil.  “O Fundo Amazônia era um fundo de resultados, que se realimentava à medida da comprovação de sua real eficácia”, disse ele, citando diferentes iniciativas de apoio à produção sustentável e à proteção do bioma da região promovidos pelo Fundo Amazônia.
Com a autoridade de quem, na estrutura do BNDES,  elevou as questões de meio ambiente ao nível de Superintendência ( antes era apenas um departamento), Coutinho  fez um apelo à atual  direção do banco estatal: “Que abra um canal direto de diálogo com as instituições  da  sociedade civil, a fim de que o BNDES possa ouvir e interagir”. Segundo ele, a partir desse dialogo, o BNDES amadureceu  as análises técnicas de projetos, integrando as dimensões econômica, social, ambiental e regional, e  incorporando a política de sustentabilidade.
“Foi um processo de mudança cultural que não pode ser perdido. Tenho certeza de que está vivo nos quadros técnicos da instituição”, destacou Coutinho, considerando o Fundo Amazônia “uma ferramenta preciosa”, sobretudo em momentos de estresse orçamentário. “É um fundo com recursos de doações, isento de tributação, imune a contingenciamentos”, lembrou.
Para o presidente da Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES), Arthur Koblitz, o desmonte do Fundo Amazônia faz parte do processo de ataques ao banco estimulado pelo governo Bolsonaro. “O BNDES era um dos alvos chaves, e o atual ministro Ricardo Salles viu nisso a oportunidade de atacar o Fundo Amazônia, surfando na onda de que o banco era uma caixa preta, e merece ser atacado e caluniado”. Na opinião de Koblitz, ficou claro que o objetivo do ministro era impedir o funcionamento normal do Fundo Amazônia, facilitando a vida de criminosos ambientais.
Em seu entender, a atual direção do BNDES tem dificuldades em dialogar com entidades da sociedade civil. “Conversas com a sociedade civil não mais existem. Não pega bem ter entendimento com ONGs”, avalia o presidente da AFBNDES, lamentando a falta de um debate saudável, o que contribui para retardar a volta do Fundo Amazônia.