STJ adia decisão para
caso do fotógrafo cego


17/06/2019


O STJ (Superior Tribunal de Justiça) adiou a análise de recurso que culpa o Estado por cegar o fotógrafo Sérgio Silva, informa nota da Ponte Jornalismo. A previsão era de o caso ser analisado entre os dias 4 e 10 de junho.

Silva move no STJ um recurso em que tenta reverter a decisão da Justiça paulista que o considerou culpado por ter ficado cego após ser atingido por uma bala de borracha disparada pela Polícia Militar do Estado de São Paulo, durante a cobertura de uma manifestação no dia 13 de junho de 2013.

Há quase seis anos, o fotógrafo busca por uma resposta na Justiça, agora no âmbito federal e não mais estadual. “A tentativa do fotógrafo é de o STJ rever a decisão completa, não apenas inocentá-lo de ter se ferido, como fez a segunda instância em São Paulo, mas também condenar o Estado por tê-lo cegado. A previsão era de o caso ser analisado entre o dia 4 e 10 de junho. No entanto, o processo retornou à relatora, ministra Regina Helena Costa, da 1ª Turma, e saiu de pauta sem prazo de retorno”, destaca a Ponte Jornalismo.

Considerando a chance do STJ rever a decisão que negou reparação ao fotógrafo, foi publicada uma nota conjunta no dia 6 de junho, assinada pela Abraji, Artigo 19, Intervozes, Instituto Vladimir Herzog e Repórteres Sem Fronteiras, na qual as organizações “destacam a importância do caso de Sérgio Silva para a garantia de direitos fundamentais, como o de protesto, de liberdade de expressão e imprensa. É fundamental reforçar ainda a expectativa de que o STJ corrija as graves injustiças cometidas contra o fotógrafo até aqui, resguardando os direitos individuais e coletivos em jogo no caso em questão”.

 

O caso

No dia 13 de junho de 2013, o fotógrafo Sérgio Silva cobria uma manifestação do Movimento Passe Livre como freelancer para a agência Futura Press e levou um tiro de bala de borracha disparado pela PM, na Rua da Consolação, na região central de São Paulo. Ele perdeu a visão do olho esquerdo, e no lugar agora usa uma prótese.

Dois meses após o protesto em que foi ferido, Silva moveu uma ação pedindo que o governo paulista fosse responsabilizado pela agressão. O fotógrafo pediu indenização por danos morais, estéticos e materiais no valor de R$ 1,2 milhão. Também pediu uma pensão mensal de R$ 2,3 mil, acrescida de R$ 316 para custeios médicos.

No julgamento em primeira instância, em agosto de 2016, o juiz Olavo Zampol Júnior negou o pedido do fotógrafo, argumentando que a culpa pela agressão era exclusivamente sua. “A imprensa quando faz coberturas jornalísticas de situações de risco sabe que deve tomar precauções, justamente para evitar ser de alguma forma atingida”, registrou na sentença. “Ao se colocar o autor entre os manifestantes e a polícia, permanecendo em linha de tiro, para fotografar, colocou-se em situação de risco, assumindo, com isso, as possíveis consequências do que pudesse acontecer.”

 

Repercussão após um ano (2014)

Exatamente um ano após ter sido vítima de um tiro de bala de borracha disparado pela Polícia Militar (PM) durante uma manifestação em São Paulo, o fotógrafo Sérgio Silva lançou a exposição “Piratas Urbanos” – um ensaio em que os fotografados aparecem com um tapa-olho para protestar a violência vivida por Silva.

Segundo o fotógrafo, a ideia do projeto surgiu em meio à repressão nas manifestações de junho, e que ainda permanece no país. “Percebi que deveria fazer algo a mais. Através da fotografia, eu encontrei a possibilidade de começar a usar o que ocorreu comigo e transformar em uma série de retratos”, disse em entrevista à IMPRENSA.

Em 2014, a ONG Artigo 19 divulgou em seu site o relatório “Protestos no Brasil 2013”, que faz um registro sobre a série de violações contra os jornalistas ocorridos durante os atos. A repórter Giuliana Vallone, da TV Folha, atingida por uma bala de borracha no olho disparada por policiais militares da Ronda Ostensiva Tobias de Aguiar (ROTA) e o fotógrafo Sérgio Silva foram citados como exemplos emblemáticos de hostilidade.

O encontro de dois fotógrafos que sofreram violência semelhante

No dia 18 de maio de 2000, o fotojornalista Alex Silveira cobria uma manifestação de Sindicato dos Professores do Ensino Oficial de São Paulo (Apoesp) na Avenida Paulista (SP). Ele levou um tiro de bala de borracha disparado pela Tropa de Choque da Polícia Militar (PM) e perdeu a visão do olho esquerdo. Mais de 14 anos depois, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) culpou o profissional pelo dano que sofreu e negou-lhe indenização.

Em julho de 2014, a Ponte Jornalismo promoveu o encontro dos fotógrafos Alex Silveira e Sérgio Silva, que foi registrado no vídeo “O Estado que arranca os olhos”. Na ocasião foi promovido um debate sobre a criminalização da cobertura jornalística.

Em novembro de 2014, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) e a Associação de Repórteres Fotográficos e Cinematográficos (AFORC) lançaram a campanha “Somos Todos Piratas”, contra a decisão do Tribunal de Justiça, que culpou o fotógrafo Alexandro Wagner Oliveira da Silveira por ter ficado cego de um olho ao ser atingido por uma bala de borracha.

 

Em 2017, o recurso de Sérgio Silva é rejeitado

Em dezembro de 2017, a 9ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) negou o pedido de indenização do fotógrafo Sérgio Silva.

No julgamento, por votação unânime os desembargadores Rebouças Carvalho, relator do caso, Décio Notarangeli e Oswaldo Luiz Palu consideraram que com base em laudo pericial apresentado no processo, não havia comprovação de que o ferimento tenha sido causado por bala de borracha, excluindo-se o “nexo causal com o comportamento danoso do Estado”. Para Rebouças Carvalho, o ferimento poderia ter sido causado por “pau, pedra, mão, cabeça, bolas de gude, bolas de futebol” e outros objetos.

Como Silva não registrou boletim de ocorrência na época do ferimento, o magistrado destacou que “não há qualquer relatório oficial dos fatos”.

Fonte: Portal Imprensa