Polícia invade Museu do Índio em clima de guerra


22/03/2013


Policiais do Batalhão de Choque (BPChoque) invadiram o antigo Museu do Índio, no Maracanã, no fim da manhã desta sexta-feira, dia 22, para retirar os indígenas que ainda resistiam à desocupação da Aldeia Maracanã. Um grupo de manifestantes, formado por estudantes, integrantes de grupos sociais, defensores dos direitos humanos e políticos, tentou impedir a saída dos índios do local e foi dispersado pela polícia, que usou spray de pimenta, bomba de gás lacrimogêneo e tiros de bala de borracha. Cerca de 200 policiais militares do Batalhão de Choque, do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e do 4º BPM (São Cristóvão) participaram da tumultuada ação.
 
Após a retirada dos índios, os manifestantes tentaram fechar a Avenida Radial Oeste, que chegou a ser bloqueada nos dois sentidos. Pelo menos um índio ficou ferido, além do repórter fotográfico do jornal O Globo, Pablo Jacob, atingido por uma bomba de gás. Dezenas de manifestantes e profissionais de imprensa sentiram os efeitos dos gases e bombas lançados pela polícia.
 
De acordo com Micael Oliveira, índio de origem Arauaqui, todos os indígenas já tinham aceitado deixar o local, e permaneciam apenas cantando e fazendo uma dança de despedida:
-Os policiais entraram agredindo a todos, jogando bombas de efeito moral e spray de pimenta. Chegaram co

m toda a truculência. Pareciam bestas desvairadas.

 
O advogado Aarão da Providência Costa Filho, que defende os índios, foi preso pelos policiais ao tentar entrar no imóvel. 

Membro do Conselho de Ética da Presidência da República, o advogado Modesto da Silveira, Conselheiro da ABI, foi retirado do local pela polícia de forma truculenta.
— Não chegou a ser um banho de sangue, mas ainda não sabemos quantas pessoas foram agredidas e saíram feridas da operação militar ordenada pelo governador. Um dos feridos, cim um corte na barriga e outro no joelho, provocados por estilhaços de bomba, foi o assessor do Sindipetro-RJ, João Leal, que foi hospitalizado. O repórter Rafael Duarte, da TV Petroleira, assim como a maioria das centenas de pessoas que estavam no local, sofreram os efeitos do gás de pimenta.

O defensor público federal Daniel Macedo, que representa os índios, criticou a ação da PM:

— Os policiais do Batalhão de Choque agiram de maneira truculenta. Foi uma arbitrariedade. Não precisava disso. Os índios já estavam prestes a sair. Apenas um pequeno grupo permanecia no prédio. Eles me pediram 10 minutos para fazer uma dança de despedida, quando os PMs entraram. Vou analisar imagens e talvez entre com uma representação pedindo a responsabilidade da polícia.
 
O Deputado estadual Marcelo Freixo(Psol) também repudiou a atuação da Polícia:
— De repente você tem tiro para cima, spray de pimenta nos parlamentares, no promotor, no defensor público. Mesmo que alguns resistissem era possível que eles fossem retirados sem violência; Nós vamos agir contra esse procedimento da polícia.
 
O procurador-geral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Guilherme Peres de Oliveira, designou a comissão de Direitos Humanos do órgão para acompanhar o caso.
 
De acordo com o relações públicas da Polícia Militar, coronel Frederico Caldas, a PM só invadiu o prédio para evitar que o Museu do Índio fosse incendiado, já que alguns manifestantes colocaram fogo em uma oca e as chamas já estariam se alastrando para o prédio. Ele negou ainda a denúncia de abuso de autoridade, e disse que a polícia atuou corretamente.
— Entramos para evitar uma tragédia maior e o prédio pegasse fogo. Não havia mais índios dentro do prédio. Apenas alguns manifestantes. A Polícia atuou corretamente, usando da força necessária para liberar as pistas da Radial Oeste e garantir o direito de ir e vir do cidadão. O militar confirmou que alguns manifestantes foram presos.
PMs do 4º BPM (São Cristóvão) vão patrulhar o local até o começo das obras do Museu Olímpico.
 
Despejo
 
Oficiais de Justiça chegaram por volta das 8h, ao Museu do Índio, com o documento de imissão de posse deferido pela Justiça Federal, a pedido do Governo do Estado, que havia comprado o prédio da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
 
No último dia 15, a Justiça Federal determinou um prazo de 72 horas para os índios saírem do local, que se esgotaria na última segunda-feira, 18. No entanto, na interpretação do juiz da 8ª Vara Federal, Renato Cesar Pessanha, esse prazo só começou a ser contado a partir de segunda-feira, primeiro dia útil após a determinação de despejo.
 
O defensor público da União Daniel Macedo ingressou no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) com um recurso de agravo de instrumento, pedindo mais 15 dias de prazo, além das 72 horas estipuladas pela Justiça Federal. Porém, o recurso foi negado pelo juiz federal Renato Pessanha e os índios foram desalojados do imóvel.
 
Desde as 3h desta sexta-feira, 22, policiais do Batalhão de Choque ficaram posicionados no entorno do antigo museu, enquanto representantes do governo do estado negociavam com os indígenas sobre a transferência provisória da Aldeia Maracanã para um terreno em Jacarepaguá, na Zona Oeste. Por volta das 7h40m, 12 indígenas aceitaram sair e foram levados para o Hotel Acolhedor Santana II, no Centro.
 
Pela parceria firmada com a Prefeitura do Rio, eles ficarão com o primeiro andar do hotel e terão três refeições diárias (café da manhã, almoço e jantar). Esta é uma das possibilidades de moradia imediata até que os alojamentos fiquem prontos.
 
De acordo com informações da Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos, ainda nesta sexta-feira, 22, os índios devem fazer uma visita aos três locais de moradia temporária: Jacarepaguá, Bonsucesso ou Visconde de Niterói. Pela proposta do Governo do Estado, apresentada aos índios durante reunião na quinta-feira, eles podem decidir pelo recebimento do benefício do aluguel social, no valor de R$400, ou podem voltar para a aldeia de origem, com ajuda do Governo do Estado, com o transporte, caso não aceitem ficar no alojamento.
 
Proposta
 
O Museu do Índio está desativado há 34 anos. O grupo de indígenas que ocupa o prédio – e deu ao museu o nome de Aldeia Maracanã – está no local desde 2006. Eles se reuniram nesta quinta-feira, 21, e redigiram a proposta para sair espontaneamente do local. O grupo queria do governo do estado garantias de que o imóvel seria recuperado e usado exclusivamente para a promoção da cultura indígena. Na ocasião, o secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, Zaqueu Teixeira, apresentou o ultimato para a saída pacífica do grupo do imóvel. 

Modesto da Silveira acompanhou a negociação entre os indígenas e Zaqueu Teixeira, e assegurou que os índios estavam abertos ao diálogo:
— Contudo, no lugar de uma nova proposta, o governador preferiu responder com tropas de choque. Por volta das 3h da manhã eles cercaram a Aldeia. Fiquei apavorado. O aparato policial era muito grande. Contei pelo menos quatro ambulâncias. Muitos policiais estavm com máscats de proteção contra gás. Temi um banho de sangue. Aquele casarão foi destinado aos índios por D. Pedro II. Eles se consideram herdeiros do prédio e reivindicam a construção de um centro de valorização da cultura indígena. 

Modesto prepara o relatório sobre a invasão, que será apresentado na próxima reunião do Conselho de Ética da Presidência da República.
— Não se justifica uma invasão no meio de um processo de negociação, mesmo que a desocupação estivesse autorizada judicialmente. Menos justificável ainda foi a violência da polícia contra a imprensa nacional e internacional, contra manifestantes e indógenas.

*Com informações de O Globo, G1, Portal Terra, APN.