O futebol nas artes plásticas


10/09/2009


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Futebol e artes plásticas foi o tema do quinto encontro do ciclo de palestras “Futebol-arte: A arte do futebol”, por meio do qual, até dezembro, o Centro Histórico-Esportivo da ABI vai discutir as relações entre o esporte e diversas manifestações artísticas e culturais, em encontros realizados nas primeiras terças-feiras de cada mês. Os palestrantes foram Victor Andrade de Mello, professor de História da UFRJ e Coordenador do Laboratório de História do Esporte e do Lazer (Sport); Flávio Carneiro, professor de Literatura da Uerj e crítico literário; e Marina Araújo, repórter da TV Globo de São Paulo e da Globo News.

Na entrada da Sala Belisário de Souza, no 7º andar do edifício-sede da ABI, onde foi realizada a palestra, o público teve contato com uma pequena exposição de charges e caricaturas de importantes nomes do futebol nacional, com destaque para uma que retratava Garrincha com trejeitos de Charles Chaplin. Os trabalhos são assinados pelo chargista Adail de Paula, membro do Conselho Fiscal da ABI, que iniciou a carreira na imprensa ainda na adolescência. Os desenhos foram publicados originalmente em jornais como Diário de Notícias, Jornal do Sports e Última Hora.

Espaço

Victor de Mello  

Segundo o professor Victor de Mello, a primeira corrente artística a incorporar o esporte foi a pintura inglesa do século XVIII. No século seguinte, o tema foi abordado com mais força pelas vanguardas artísticas européias, especialmente na obra dos impressionistas, que começaram a se aproximar de temas populares:
— Mas o futebol não era retratado, pois nesse momento ainda não era considerado um esporte importante. Porém, no início do século XX, ele aparece na obra dos futuristas italianos, que, por serem inimigos da tradição, diziam: “Saiam dos museus e das salas de arte. E vamos apreciar a arte junto aos movimentos de massa”. O ciclismo foi o primeira modalidade esportiva a pintar nas aquarelas, devido à idéia de movimento; em seguida veio o futebol.

No Brasil, explica o professor, com as propostas de arte moderna, o futebol foi ganhando espaço nas artes plásticas, principalmente na obra de pioneiros como Francisco Rebolo, Candido Portinari e Vicente do Rego Monteiro. Na arte contemporânea, segundo Victor, essa relação se acentua ainda mais:
— Nesse momento, os elementos do cotidiano, especificamente o futebol, utilizados como fonte de inspiração ou mesmo como veículo de comunicação pelos artistas, aparecem mais constantemente na obra de artistas como Rubens Gerchman e Claudio Tozzi, com mais freqüência do que no Modernismo.

Semelhanças

Para Victor Mello, os torcedores vivem o futebol de uma maneira estética, encarando um jogo como um espetáculo artístico, representado nos dribles desconcertantes e nos espetáculos das torcidas organizadas:
— Da mesma forma como o apreciador de artes plásticas se relaciona com uma obra de arte — diz o professor.

Flávio Carneiro

Outro ponto semelhante entre o esporte e a arte, apontado por Flávio Carneiro, diz respeito à intensa relação de ambos os elementos com a imagem, o que os torna linguagem universal:
— Um drible é um drible em qualquer lugar do mundo, da mesma forma como a fotografia, que integra o campo das artes plásticas, é compreendida em cada parte do globo. Assim como a arte, o futebol está inteiramente ligado à imagem, basta perceber que quando um time não vai muito bem, seu uniforme sofre modificações, ou quando um jogador lança uma coreografia para comemorar um gol e todos passam a imitá-lo.

Marina Araújo

Comparando uma tela em branco com um campo de futebol, onde os jogadores “pintam” suas jogadas, Marina Araújo, que mediou a palestra, apontou a imprevisibilidade como um fator de aproximação entre o futebol e a arte:
— Depois de começada uma partida, a gente nunca sabe como ela vai terminar, tanto é que dizem que o futebol é uma caixinha de surpresas. Na arte, também acredito que aconteça o mesmo, nunca sabemos como um livro ou um filme vai terminar. Um quadro, por exemplo, pode gerar diversas interpretações e sentimentos que variam de acordo com o espectador.

Quando cobriu para a TV Globo a exposição de artes plásticas “Desenho sobre fundo verde”, que ficou em cartaz no Centro Cultural Banco Brasil (CCBB), entre os dias 8 de maio e 9 de julho de 2006, apresentando obras inspiradas no futebol, Marina Araújo se mostrou impressionada com a capacidade de a arte arrebanhar os amantes do esporte:
— Todas as pessoas que eu entrevistei na ocasião não eram apreciadores de artes plásticas, mas eram amantes do futebol. Vamos combinar que existem muito mais pessoas interessadas em futebol do que em artes plásticas. Achei muito legal elas serem instigadas a freqüentarem museus e salas de arte por terem sido atraídas por um tema popular como é o futebol. Lembro que muitos daqueles com quem conversei nunca tinham ido a uma galeria de arte.

Ao final do encontro, Flávio Carneiro, citando uma frase do poeta Paulo Leminski — “a poesia é um inutensílio” —, disse ser a idéia de inutilidade a maior evidência do caráter artístico do futebol:
— E aí eu cito o Garrincha. Muitos dos dribles dele eram sem objetivo. Ele passava pelo adversário, depois voltava atrás e driblava o mesmo oponente de novo, e repetia isso seguidamente, não muito interessado em chegar ao gol, mas em brincar, se divertir jogando futebol. Portanto, se formos levar a frase de Leminski ao pé da letra, constataremos que Garrincha foi o poeta do futebol.