Professor lança livro sobre novos desafios da mídia


30/09/2018


Inspirado pela ideia de instigar o pensamento sobre as mudanças de comportamento que acompanham a evolução da tecnologia e como isso implica no mundo dos negócios, Flavio Ferrari lança o livro “Atitude Digital – os caminhos da transformação”. O lançamento aconteceu no ABA Mídia 2018, nesta terça-feira (25) em São Paulo.
O ponto de partida para o livro foram bate-papos com profissionais brasileiros do universo digital, do mundo corporativo, da academia e da economia criativa, publicados, de forma resumida, na seção Mercado da Folha de S.Paulo. Agora, a obra traz as entrevistas reunidas na íntegra em seu último capítulo.

 

Em entrevista ao Portal IMPRENSA, Flavio Ferrari comenta questões relacionadas à “Atitude Digital”, especialmente nos veículos de comunicação. Flavio é consultor, palestrante e professor, especialista em temas relacionados com inovação organizacional, cenários futuros, transformação digital, comunicação transmidiática e métricas de mídia, além de mentor do ‘hub’ colaborativo SocialData.

 

No livro, você comenta que a mudança de atitude é acelerada pelo caráter exponencial da tecnologia. Quais são as oportunidades e os entraves para esta mudança nas corporações? Há diferenças significativas nas grandes e pequenas empresas?

Os principais benefícios que a tecnologia traz para as organizações são a possibilidade de redução de custos, a geração de valor através de diferenciais competitivos e a oportunidade de oferecer novas soluções aos stakeholders, particularmente aos clientes, facilitando sua interação com a organização e/ou oferecendo novos produtos e serviços. Em resumo, tudo isso tem o potencial de gerar melhores resultados de curto, médio e longo prazo. O desafio para a transformação digital não está na tecnologia em si, mas na mudança de processos (a forma de fazer as coisas) e de cultura (a forma de pensar o negócio). Quanto maior e mais estruturada a organização, maior o esforço necessário para implementar mudanças.

Quais são as bases para o desenvolvimento da atitude digital? E de que maneira isso acaba conduzindo ao uso exponencial da tecnologia? 

O pilar fundamental é a clareza de propósito da organização.  É a razão de existir da organização que deve pautar todas as decisões corporativas. Uma vez que esse propósito esteja claramente definido, comunicado e compreendido por todos os níveis da organização, é importante garantir que a cultura da empresa acolha a liberdade de pensamento e expressão e estimule a curiosidade e a colaboração. Propósito claro e cultura adequada favorecem a criatividade e a inovação. Nesse contexto, a tecnologia é percebida como uma ferramenta útil e poderosa, mas não como uma finalidade em si mesma. A finalidade é ampliar a satisfação dos stakeholders, com especial atenção aos clientes, que são a fonte geradora de receita.

Flávio Ferrari, ao lado de Luiza Pastor, jornalista e associada do Copenhagen Institute for Futures Studies

Pensando na transformação digital dos veículos de comunicação, quais são as lições a serem ainda aprendidas? Que ‘gaps’ e oportunidades você identifica neste mercado?

De um modo geral, o que observo é que os veículos de comunicação, em sua grande maioria, seguem ‘apegados’ à sua história. Repetindo uma analogia que utilizei outro dia, são como borboletas que ainda pensam como lagartas. A tecnologia derrubou muitas das barreiras de entrada no setor.  Qualquer veículo pode produzir e distribuir seu conteúdo em múltiplas plataformas. Produção, distribuição e acesso já não definem o veículo.  Entretanto, a dificuldade maior vem sendo a transformação dos modelos de negócio.

O veículo que nascer Jornal ou Revista ainda tem a venda do ‘anúncio’ estático como sua principal fonte de receita, muitas vezes na plataforma impressa (papel). O que nasceu Rádio segue comercializando, prioritariamente, o ‘spot’ de 30 segundos. O mesmo vale para as emissoras de Televisão. Podemos considerar o Rádio e Televisão como casos especiais, em função do regime de concessões públicas (que garantem uma ‘reserva de mercado’) e da ainda precária estrutura da internet no país, onde o acesso à banda larga fixa não chega a 20% dos domicílios e a móvel tem custos elevados.

A oportunidade está na redefinição do papel dos veículos e de seus modelos de negócio.  Os veículos de comunicação são, em essência, marcas curadoras de conteúdo para seus consumidores e geradoras de momentos de atenção para potenciais anunciantes. O conceito de ‘curadoria’ pode ser melhor explorado.  A fonte original (produtora do conteúdo) pode ser qualquer um dos stakeholders e até ‘concorrentes’, desde que devidamente referenciados.

Outro ponto importante é a interdependência dos agentes do mercado, que torna imperativa a disposição para a colaboração. Tomando um exemplo simples, uma emissora de Rádio pode transmitir em vídeo o seu programa no Youtube (que é do Google) utilizando um provedor de acesso de banda larga fixa, e o consumidor poderá acessar esse conteúdo em seu smartphone através de outro provedor de acesso de banda larga móvel, utilizando um aplicativo de curadoria desenvolvido por algum outro agente. O sucesso é coletivo, não individual.  O negócio precisa ser repensado a partir dessas definições e possibilidades.

No livro, você fala da revisão do conceito de mídia. De que forma isso ajuda a repensar o modelo de negócio, e as relações entre os veículos e os consumidores?

 

Usando a Física Quântica como referência analógica, podemos dizer que Mídia é o que acontece quando o consumidor encontra o conteúdo, em algum momento de sua jornada, acessando-o através da plataforma de sua conveniência. Antes desse encontro, temos apenas uma nuvem de probabilidades; nada existe de fato. Uma vez que, em função das tecnologias disponíveis, os veículos já não estão presos ao seu vertical de origem (de produção e distribuição de conteúdo), é importante conhecer a jornada e compreender as necessidades e desejos do consumidor em cada momento, procurando garantir a relevância do conteúdo e a conveniência do acesso – esses dois aspectos definem o valor.

As oportunidades de monetização vêm do valor oferecido ao consumidor do conteúdo e de potenciais interessados em utilizar os momentos de atenção (quando o consumidor interage com o conteúdo distribuído pela marca de mídia) para transmitir mensagens a esse consumidor, ou mesmo do expertise da marca na gestão desse processo (que pode ser tratada como produto/serviço comercializável). Cada momento de atenção tem características singulares, determinadas pelas características da marca de mídia, do momento da jornada e do formato/dispositivo de acesso.  Todo modelo de negócios pode ser revisto considerando-se essas singularidades.

Tão importante quanto isso, a forma de comunicar também pode ser revista, sob a ótica ‘transmidiática’. A singularidade do encontro deve determinar a forma da comunicação. Aí surgem os mesmos elementos que mencionei para o processo de transformação digital: propósito, cultura, criatividade, inovação e colaboração.  Um olhar externo (consultores) e o benchmark com outros players globais (agentes do mercado) podem ser inspiradores da transformação.

Fonte: Portal Imprensa