27/06/2016
O jornalista Chico Marés e outros quatro profissionais do jornal Gazeta do Povo, de Curitiba, podem ser condenados por terem faltado a uma audiência na Justiça na sexta-feira (24). Eles não compareceram porque tinham outra oitiva marcada para praticamente o mesmo horário a 400 quilômetros de distância. Desde que foi publicada a reportagem sobre supersalários do Judiciário e Ministério Público no Estado, em fevereiro deste ano, os magistrados e promotores entraram com diversas ações pedindo indenização moral.
“Fisicamente é impossível. A não ser que a gente se teletransportasse de um lugar para o outro, não teria como comparecer as duas ao mesmo tempo”, afirmou Marés.
As reportagens tinham como base dados dos portais da transparência dos órgãos e foram publicadas em fevereiro deste ano. O material apontou que magistrados receberam, em média, mais de R$ 500 mil em 2015.
O número de ações movidas contra os jornalistas chega a 48, e eles são obrigados a comparecerem a todas as audiências marcadas em diferentes comarcas. Desde abril eles já percorreram mais de nove mil quilômetros – o que corresponde a distância entre Curitiba e o Canadá.
“O que está em questão aqui não é se eles têm ou não o direito de entrar na Justiça, mas a forma como eles entraram na Justiça que é uma agressão. Uma agressão à gente, uma agressão ao nosso trabalho, uma agressão à Gazeta do Povo, e sobretudo, uma agressão à liberdade de imprensa”, afirmou Marés.
No último dia 21, o Diretor de Redação da Gazeta do Povo, Leonardo Mendes Júnior, agradeceu o apoio da Associação Brasileira ao jornal diante do constrangimento a que um grupo de jornalistas do veículo está sendo submetido com 48 processos instaurados, em diferentes cidades, por juízes e promotores do Estado do Paraná. Segundo a ABI, esse movimento coordenado revela justamente o que se pretende ocultar: intimidar jornalistas e cercear a liberdade de imprensa, um dos pilares do Estado Democrático. No último dia 9, a instituição divulgou uma Nota Oficial sobre o caso.
A Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar) considera que os juízes passaram a sofrer constrangimento e disse que não há tentativa de intimidação nem ação coordenada. Já a Associação Paranaense do Ministério Público (APMP) declarou que as ações não representam tentativa de ferir o direito de informação.
O jornal entrou com uma reclamação no Supremo Tribunal Federal (STF), mas a liminar foi indeferida. A Gazeta do Povo recorreu e ainda aguarda o resultado. Na sexta-feira, a ministra Carmem Lúcia falou sobre o caso durante o 11° Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo da Abraji, em São Paulo.
“O que for considerado como atingindo expectativa, interesse ou direito vai se entrar no poder Judiciário, vai se ingressar, na condição de parte. Por isso que chamei a atenção que não sabemos a decisão que um juiz pode provocar. Porque, realmente, se ele tiver qualquer impossibilidade de julgar com imparcialidade, a parte contra aquele jornalista ou aquela empresa jornalística que ele considerou, esse juiz não poderá julgar”, considerou a ministra.