Estudo do NetLab da UFRJ diz que YouTube privilegia vídeos pró-Bolsonaro em recomendações a usuários


14/09/2022


O algoritmo do YouTube privilegia a Jovem Pan e vídeos a favor do presidente Jair Bolsonaro (PL) em suas recomendações, indica estudo do NetLab, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Durante o levantamento, em 18 visitas-teste à plataforma com perfis diferentes, os canais do grupo Jovem Pan foram indicados 14 vezes na página inicial do YouTube, com um ou mais vídeos sugeridos. O mais recomendado aos usuários foi o da participação de Bolsonaro no programa Pânico, no dia 26 de agosto.

A entrevista foi recomendada em oito visitas-teste, em cinco versões (cortes), que juntas somam 9,6 milhões de visualizações. No vídeo, o presidente faz alegações infundadas sobre o processo eleitoral, como a de que as Forças Armadas descobriram “centenas de vulnerabilidades” nas urnas eletrônicas.

O objetivo era identificar quais os canais e os conteúdos noticiosos tiveram visibilidade destacada pelo algoritmo de recomendação do YouTube durante o período de 23 a 30 de agosto.
Assim, o usuário era “virgem” —não tinha histórico de interação com determinados conteúdos que pudesse alimentar o algoritmo e influenciar as recomendações. Mesmo sem curtidas ou visualizações em canais de direita, o YouTube recomendou vídeos da Jovem Pan e pró-Bolsonaro na maior parte das vezes.
Conteúdos dos canais da emissora apareceram como a primeira recomendação em 55% das visitas (10 de 18), bem à frente de outros canais de notícias como UOL (5), CNN Brasil (1) e Band Jornalismo (1).

Na página inicial, os mais recomendados, por grupo de comunicação, foram Jovem Pan (25), UOL (16), Grupo Bandeirantes (9), CNN (8), Correio do Povo (7), SBT (6), Metrópoles (5) e Fundação Padre Anchieta (5).

Outros vídeos da Jovem Pan sugeridos no teste apresentam Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como “chefe de quadrilha” e “doente mental”, dizem que o petista estaria atrás de Bolsonaro em pesquisa de intenção de voto do Ibope e afirmam que o STF (Supremo Tribunal Federal) tem uma aliança com o ex-presidente.

“É muito grave o YouTube, uma plataforma com mais de 130 milhões de usuários no Brasil, privilegiar um veículo de mídia no seu sistema de recomendação, diante de tantas outras fontes. Ainda mais por [a Jovem Pan] ser um veículo hiperpartidário, claramente bolsonarista, que não dá isonomia aos candidatos”, afirmou Marie Santini, diretora do Netlab, a Patrícia Campos Melo, na Folha de São Paulo.

“Essa situação cria um desequilíbrio nas eleições, faz propaganda com o uso do algoritmo, pois a recomendação é uma forma de moderação de conteúdo.”

Principais resultados do relatório Recomendação no Youtube: o caso Jovem Pan. Netlab UFRJ. 5 de Setembro de 2022, Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil.

  1. O Google privilegia conteúdos da Jovem Pan sistematicamente – Nas 18 visitas-teste, os canais do grupo Jovem Pan foram identificados 14 vezes na primeira página, com um ou mais vídeos. Os vídeos dos canais Jovem Pan aparecem como primeira sugestão em 55% dos testes.

  2. Conteúdo pró-Bolsonaro – Em nossa análise, o vídeo mais recomendado foi da entrevista concedida por Jair Bolsonaro ao Programa Pânico na sexta-feira (26/08). O programa deu espaço ao presidente para exaltar seu atual governo e atacar a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva, rebatendo a sabatina do ex-presidente no Jornal Nacional, realizada na noite anterior.

  3. Recomendação tem efeito de publicidade – A recomendação de conteúdo tem forte impacto nas escolhas dos usuários, especialmente por fazer acreditar que os vídeos recomendados são baseados em critérios de relevância, e não guiados por acordos comerciais ou outros interesses.

  4. Ciclo de feedback loop – O favorecimento da Jovem Pan pelo sistema de recomendação do YouTube ocorre em dois níveis de mediação: (1) como primeiro vídeo sugerido na homepage e (2) na recomendação de vídeos relacionados ao primeiro clique. Isto é, quando se consome o conteúdo sugerido na primeira página do YouTube, o usuário é levado a mais vídeos da emissora mergulhando em um ciclo de retroalimentação auto-referenciado. Este fenômeno é chamado por Benkler et al. (2018) de “propaganda feedback loop” e seu impacto se intensifica especialmente quando se considera que 70% do que os usuários assistem é fornecido a eles por meio de recomendações.

  5. A criação de desequilíbrio entre os candidatos ameaça a democracia.