Ditadura, censura e tortura Nunca Mais!


31/03/2024


Ilustração: Elifas Andreatto

Hoje, dia 1º de abril, completa 60 anos o golpe civil-militar de 1964 que jogou o país em 21 anos de ditadura, horror e sofrimento.

Ao contrário do que determinou aos seus ministros o presidente Lula, é preciso sim lembrar tudo que aconteceu a partir do golpe de Estado que derrubou João Goulart, para que não se esqueçam os crimes cometidos e nunca mais se repitam.

Passado não é exemplo, é lição, principalmente para as novas gerações. A memória serve, também, para afastar e neutralizar as ameaças golpistas que ainda rondam ameaçadoramente o país, como demonstraram os episódios de 8 de janeiro de 2023.

Algumas iniciativas como o Projeto Brasil Nunca Mais, a Comissão de Investigação da Vala de Perus, o Comitê Feminino pela Anistia, o Comitê Brasileiro pela Anistia, a Comissão Especial dos Mortos e Desaparecido Políticos, criada no governo Fernando Henrique Cardoso, em 1995, e a Comissão de Anistia, criada em 2002, deram início ao processo de resgate dos crimes da ditadura.

Em 2007 foi publicado o livro-relatório Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, sistematizando a análise, investigação e julgamento dos processos relativos aos 339 casos de mortos e desaparecidos apresentados, que se somam a outros 136 nomes já reconhecidos no próprio Anexo da Lei nº 9.140/95. O livro foi lançado na data que marcou os 28 anos da publicação da Lei de Anistia, em 1979.

Apenas em maio de 2012, no governo de Dilma Roussef, 27 anos após o fim da ditadura, foi criada a Comissão Nacional da Verdade, que durou até dezembro de 2014, além de várias Comissões Estaduais da Verdade e outras em universidades e sindicatos.

O trabalho da Comissão deu origem a três volumes de relatório final, realizado a partir de audiências públicas, com documentos, fotos e depoimentos de acusados e vítimas da ditadura. Em cerca de 2 mil páginas, o relatório apresentou detalhes sobre a atuação do regime militar, prisões, torturas, repressão política e assassinatos, e identificou 434 mortes e desaparecimentos de vítimas da ditadura.

Entregue no dia 10 de janeiro de 2014 à presidenta Dilma Rousseff no Palácio do Planalto, o relatório final apontou 377 agentes do Estado como responsáveis por crimes como sequestros, torturas, assassinatos, desaparecimentos forçados, violências sexuais e ocultação de cadáveres.

Ao fim do trabalho da CNV, foram elaboradas 29 recomendações ao governo federal, entre elas a punição de agentes públicos, indenizações às vítimas, desmilitarização das polícias estaduais, preservação da memória, transformação dos centros de tortura — como o DOI-CODI de São Paulo; a Casa da Morte, em Petrópolis; o DOI-CODI do Rio de Janeiro, na Rua Barão de Mesquita; a Casa de Itapevi, em São Paulo, entre outros — em Memoriais. E também a proibição de comemorações do golpe militar de 1964.

Nenhuma dessas recomendações foi cumprida até hoje.

Ao contrário do que aconteceu em outros países da América do Sul como Argentina, Chile e Uruguai, no Brasil nenhum dos agentes do Estado denunciados por graves violações dos direitos humanos, torturas, assassinatos e desaparecimentos foi condenado por seus crimes.

Apesar dos registros imprecisos e obscuros e da documentação destruída ou ocultada, sabe-se que dezenas de jornalistas foram mortos no país entre 1964 e 1985 e centenas foram arbitrariamente presos e torturados, muitas vezes sem nenhuma denúncia formal.

A Comissão da Verdade do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, em 2017, listou 25 casos de profissionais assassinados pela ditadura, entre eles, Djalma Carvalho Maranhão, Ieda Santos Delgado, Jane Vanini, Luiz Eduardo da Rocha Merlino, Luiz Inácio Maranhão Filho, Orlando da Silva Rosa Bonfim Júnior, Vladimir Herzog e Wânio José de Mattos.

Além disso, houve grupo de comunicação que agiu como agente do sistema. O caso mais famoso é do Grupo Folha, que cedeu pessoal e carros para a Operação Bandeirante utilizar na busca e captura de opositores do regime. Caminhonetes da empresa eram vistas frequentemente no pátio do DOI-CODI. Pesa ainda contra o Grupo Folha o fato de ter demitido três jornalistas por “abandono de emprego” no período em que estavam presos no DOI-CODI de São Paulo: Rose Nogueira, Sérgio Gomes da Silva e Vilma Amaro.

A centenária Associação Brasileira de Imprensa, fiel ao seu histórico compromisso em defesa da democracia, da liberdade de imprensa e do respeito aos direitos humanos, vai debater o golpe de 1964 e seu rastro de sequelas na 2ª Semana Nacional de Jornalismo, em parceria com várias universidades, de hoje a 5 de abril, em Juiz de Fora, Natal, São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro.

E, neste 1º de abril, em respeito à memória dos mortos e desaparecidos políticos, a ABI junta sua voz a centenas de entidades da sociedade civil e dezenas de universidades para bradar:

Ditadura Nunca Mais!
Censura Nunca Mais!
Tortura Nunca Mais!
Democracia Sempre!

Rio de Janeiro, 1º de abril de 2024
Octávio Costa
Presidente