Congresso em Foco: Presidente censura e ainda manda pagar


09/07/2021


Por Amanda Audi, Diretora-executiva do Congresso em Foco

No mês passado, um advogado entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal pedindo para que o presidente Jair Bolsonaro desbloqueasse o perfil deste Congresso em Foco no Twitter.

O advogado em questão não tem ligação com o site além de ser leitor, mas se sentiu lesado pelo fato de o presidente cercear o acesso de jornalistas a um dos principais meios de comunicação usados por ele.

Esta semana, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) revelou que Bolsonaro já bloqueou seis veículos de comunicação (The Intercept Brasil, DCM, Aos Fatos, Repórter Brasil e O Antagonista, além do Congresso em Foco) e 69 perfis individuais de jornalistas.

O caso foi parar no gabinete do ministro Dias Toffoli, que negou a liminar que cobrava o desbloqueio. Agora, a advogada de Bolsonaro, Karina Kufa, ainda parece que está tentando constranger o advogado. 

Em peça protocolada na terça-feira (6), ela não apenas pede que o ministro rejeite a ação, como também solicita que o advogado pague honorários para ela. Ou seja: um cidadão que tomou uma atitude pró-democracia pode ter que desembolsar até R$ 20 mil para pagar a advogada da presidente.

Kufa argumenta que o perfil de Bolsonaro no Twitter é “pessoal”, apesar de ser usado para publicar anúncios, decisões e feitos do governo. Ela também alega que qualquer pessoa pode ter acesso à conta do presidente, mesmo se for bloqueado.

Tenho uma certa preguiça de repetir o óbvio, mas neste caso me parece importante:

  1. A conta de Bolsonaro deixa de ser pessoal a partir do momento em que ele se torna uma figura pública, é identificado na rede como tal e usa a ferramenta para se comunicar a população. Este, aliás, é o entendimento da Justiça norte-americana na decisão que impediu o ex-presidente Donald Trump de bloquear indivíduos.
  2. Existem muitos meios de acessar conteúdo bloqueado. Mas isso envolve utilizar contas falsas ou navegação privada, o que não é razoável em uma democracia e numa comunicação entre atores públicos e idôneos.
  3. Outro argumento da decisão norte-americana ajuda a entender a gravidade do assunto. Uma vez que o presidente de um país bloqueia jornalistas e veículos de comunicação, ele atropela o debate. Em vez de propor mais diálogo, ele fecha portas. Sua página acaba virando um fórum em que ele fala sozinho e quaisquer outras visões são silenciadas.

Aproveito para replicar palavras de Bernardo Kucinski, professor aposentado da USP e um dos primeiros jornalistas a denunciar a tortura do Estado na época da ditadura. À Abraji, ele afirmou: “Dado que uma das características centrais do meio digital é a interlocução e o diálogo permanentes e contínuos, a autoridade que opta pela comunicação vertical, unidirecional, não dialogada, está se revelando especialmente autoritária e atrasada”.

Para mim, Amanda, a situação é bem clara. Mas gostaria de ouvir o que você pensa. Se quiser, pode responder (amanda@congressoemfoco.com.br) e eu vou ler.

No mais, recomendo a leitura da matéria abaixo, de autoria da editora Marina Oliveira. Trata-se de um ponto importante, que levou até às confusões envolvendo a ex-candidata Hillary Clinton, mas que continua nas sombras do debate brasileiro.