Universidade discute fim da Lei de Imprensa


29/05/2009


                                                              &bbsp;                                      Angelo Cuissi

Ivan Cavalcanti Proença, Maurício Azêdo, Presidente da ABI, Ancelmo Gois e José Eudes

Na manhã desta quinta-feira, dia 28 de maio, alunos de Jornalismo das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), em Botafogo, lotaram o auditório da instituição, para assistirem a uma palestra sobre o fim da Lei de Imprensa, com ênfase na questão do direito de resposta. A Mesa que coordenou o evento foi formada com o Presidente da ABI, Maurício Azêdo; o jornalista Ancelmo Góis, colunista de O Globo; além dos professores Ivan Cavalcanti Proença e José Eudes, este último na função de mediador.

No início da sua exposição, Maurício Azêdo contextualizou o momento em que a Lei de Imprensa foi editada. Segundo o Presidente da ABI, o intuito do Governo militar ao sancioná-la era “acabar com as publicações que contestavam a ditadura”:
— Esta Lei data de 1967 e surge para colocar como legal as intervenções ilegais que as redações já vinham sofrendo por parte dos militares desde as primeiras horas do golpe de 1964. O objetivo deles era acabar com todos os veículos de comunicação que pudessem contestá-los. Assim, foram extintos jornais como Novos Rumos; Brasil Urgente, dos padres franciscanos de São Paulo; e A Liga, de Francisco Julião. 

Censura

                                    Maurício Azêdo

Segundo Maurício Azêdo, o que se verificou desde então foi a padronização do pensamento na imprensa:
— A partir daí, passaram a circular somente os jornais da grande imprensa, que adotaram a censura interna e apresentavam as versões dos fatos que vinham direto da Rua da Relação (Centro), onde ficava o Dops (Departamento de Ordem Política e Social).

O Presidente da ABI destacou que nesse período, mesmo sob censura, alguns jornalistas encontravam maneiras para expressar pontos de vista opostos aos dos militares, o que motivou o estabelecimento da Lei de Imprensa:
— Dessa forma, foi adotado um meio de controle dos jornalistas e dos órgãos de comunicação. Tivemos então um período em que a liberdade de imprensa ficou castrada por essa Lei.

Ao contar uma experiência pessoal, o professor Ivan Cavalcanti Proença afirmou que ainda existe censura interna na imprensa brasileira:
— Eu citaria três revistas como exemplo: Veja, IstoÉ e Época, as quais denomino “Não Veja”, “Isto NãoÉ” e “Fora de Época”. Em certa ocasião, uma delas me procurou para uma matéria que mostrava o quanto o professor universitário era bem-remunerado, que essa história de que no Brasil o professor ganha mal é balela. Eu discordei completamente disso durante a entrevista. Quando fui ler a reportagem, o único depoimento que não foi publicado foi o meu. 

Entulho

O Presidente da ABI explicou aos alunos que a derrubada da Lei de Imprensa só foi possível devido à atuação do Deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) que, por meio de seu partido, apresentou a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 130 pedindo sua revogação total, definindo-a como o “último entulho da ditadura”. Neste processo, a ABI também teve participação ativa:
— Nós apresentamos moção no STF como amicus curiae (amigo da Corte) pedindo, assim como Miro Teixeira, a revogação total da Lei, que foi acatada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por sete votos a quatro.

Para Ivan Cavalcanti Proença, que presidiu o Conselho Deliberativo da ABI de 2005 a 2006, o último entulho da ditadura não é a Lei de Imprensa, e sim a da Anistia:
— Nunca fomos consultados se queríamos o perdão para ambos os lados. Nesta história, nós servimos de limão para a limonada deles. Já conseguimos derrubar a Lei de Imprensa, agora temos que concentrar esforços para acabar com a Lei da Anistia. Assim como o Uruguai e a Argentina, nós temos que colocar nossos torturadores no banco dos réus.

Resposta

Com a revogação total da Lei de Imprensa, surgiu a polêmica sobre a regulação do direito de resposta, trazida à tona pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes, no primeiro dia de votação da matéria.

 José Eudes

Citando um recente editorial do jornal O Estado de S. Paulo, intitulado “Por uma nova Lei de Imprensa”, que enfatizava a necessidade de regulação do direito de resposta, Maurício Azêdo expôs aos alunos a posição da ABI:
— Na nossa opinião, essa questão está sendo superdimensionada, pois o direito de resposta não pode servir de pretexto para a edição de uma nova Lei de Imprensa, que pode, inclusive, abrigar agressões ao exercício da liberdade de expressão. Entendemos que o Código Civil já supri essa lacuna. Quem se sentir agredido, que entre com uma ação na Vara Cívil e pleiteie seu direito de resposta.

José Eudes citou um editorial da Folha de S. Paulo, que também defendia a criação de uma nova Lei de Imprensa. O professor questionou qual seria o interesse das empresas de comunicação, em postularem a necessidade de uma nova regulamentação para o exercício do jornalismo.

Ancelmo Gois, por sua vez, disse não perceber essa intenção nas Organizações Globo:
— Lá eu não sinto isso. E concordo com a posição da ABI de que não é necessária uma nova regulação para o direito de resposta. O Código Civil já abriga essa questão.

Desculpas

                Maurício Azêdo e Ancelmo Gois

O colunista do Globo enfatizou a necessidade de os jornalistas fazerem mea-culpa:
— Nós não pedimos desculpas, isto não está na cultura do brasileiro. Batemos na manchete e só vamos nos desculpar dentro da seção de cartas dos leitores de uma forma imperceptível que ninguém vê.

Sobre esse contexto, Ancelmo citou o frustrado atentado ocorrido no dia 1º de maio de 1981, quando militares tentaram colocar uma bomba no centro de convenções Riocentro (RJ), onde diversos artistas da MPB faziam um show em comemoração ao Dia do Trabalhador:
— Acredito que nossas Forças Armadas, em sua grande maioria, sentem grande constrangimento pelo fato, mas até hoje nenhum militar pediu desculpas. As pessoas têm vergonha de dizer “eu errei”. Essa questão é interessante ser observada quando falamos em direito de resposta.

Para o professor Ivan Cavalcanti Proença, que integrou os quadros das Forças Armadas, este pedido de desculpas por parte dos militares nunca vai acontecer:
— Há uma lavagem cerebral permanente nas escolas de cadetes. Se você chegar agora à Vila Militar vai ver os soldados se exercitando e cantando “um, dois, três o MST é terrorista” ou “um, dois, três comunismo nunca mais”.