Preconceito e rivalidade


30/03/2006


A participação das mulheres nas coberturas esportivas enfrenta ainda dois preconceitos: em relação ao sexo e em relação à própria editoria, que teria repórteres menos preparados ou cultos.

Mariana Becker, da Globo, diz que na Reportagem da emissora há dez homens e uma mulher, mas há cerca de cem profissionais envolvidos na edição e produção e mulheres em todas as áreas. Sobre a crença de que mulher não entende de esporte, comenta:
— Já passei por algumas situações de preconceito, geralmente veladas. Às vezes surge na expressão de surpresa quando você demonstra conhecimento, cultura em determinados assuntos. E eu acho que o trabalho responde melhor do que qualquer discussão.

Glenda Kozlowski, também da TV Globo, diz que jamais sofreu algum tipo de preconceito:
— Fazemos de tudo e quem forja a editoria é o profissional. Por exemplo, o Marcos Uchôa hoje é chefe no escritório de Londres, o Renato Ribeiro está na Alemanha e o João Pedro Paes Leme está em Paris como correspondente. São três profissionais que começaram no Esporte e ganharam o mundo. Precisa dizer mais alguma coisa? 

 Marluci Martins e Ronaldinho

Marluci Martins conta que no Dia o quadro de repórteres tem quatro mulheres e cinco homens e observa uma tendência de as mulheres preferirem cobrir esportes olímpicos:
— Não entendo isso e venho tentando convencê-las a ampliar o leque de preferências, pois vão lucrar com isso na profissão. Ainda há muito espaço a ser conquistado pela mulher e admito que elas estão se interessando mais por esportes. Hoje esbarro com muito mais mulheres nas coberturas esportivas do que na Copa de 94, quando havia menos de meia dúzia.

Denise Mirás, do Jornal da Tarde, enfrenta o preconceito da seguinte forma: deixa entrar por um ouvido e sair pelo outro.
— Nenhum homem que conheça uma jornalista que cubra bem Esporte se mete a dizer que ela não entende do assunto, porque na primeira pergunta que ela fizer a ele, o fulano não vai saber responder.

Heleni:conquista

Já Heleni Felippe, do Estadão, diz que o preconceito diminuiu, embora ainda exista no futebol:
— Mas isso é coisa do homem brasileiro, não do jornalista em particular. Se aparece alguma menina bonita, eles sempre comentam que ela “bate um bolão” — pelas costas e entre eles, é claro! —, antes de reconhecer que é uma boa repórter. Acredito que conquista de espaço está proporcionalmente ligada à competência. E a escolhas. Ainda não são muitas as mulheres que escolhem Esportes, mas o espaço aumentou, e muito, nas duas últimas décadas.

Também do Estadão Amanda Romanelli reforça que é totalmente preconceituosa a alegação de que o repórter de Esporte é o menos preparado que o de outras editorias:
— Alguns dizem que, para escrever algo popular, é necessário empobrecer a linguagem. Não me consta que Nelson Rodrigues, grande cronista de futebol, fosse um despreparado.

Para Deborah Lannes, do Jornal dos Sports, jornalista bom trabalha em qualquer setor:
— Esporte tem concorrência e busca por furos e exige muita dedicação como qualquer outra editoria. O preconceito existe, mas é menos evidente hoje. Sinceramente, não me preocupo com isso. Acho tão ultrapassado ter este tipo de pensamento que prefiro me concentrar em outras coisas.

Glenda Carqueijo, do JT, acredita que as mulheres só precisam de oportunidade:
— É preciso parar com essa história de que mulher não entende de esportes. Se você escolheu esta área é porque se interessa, porque gosta.

Sanny Bertoldo, do Globo, diz que os homens hoje estão mais acostumados com a presença das mulheres em um ambiente que já foi exclusivamente deles.
— Se ainda existe preconceito é no futebol, que não faz parte da minha pauta. Cubro especialmente atletismo, vela, ginástica, hipismo e esportes radicais, que adoro.

     Andréa, da Rádio Globo-RJ

Carla Matera, da Rádio Globo-SP, conta:
— Certa vez, durante uma coletiva, um treinador se chateou com uma pergunta que fiz e discutiu comigo no ar. Depois, orientado por sua assessoria, ligou para a rádio e pediu para entrar no ar, sob a alegação de que achava ter sido grosseiro comigo. Jogou confete em mim, disse que sou dedicada etc, mas, no fim, soltou a pérola: “Queria mesmo me desculpar e dizer que a Carla, apesar de mulher, é uma excelente repórter!”

Andréa Maciel, da Rádio Globo-RJ, diz que a mulher tem que provar sempre que sabe do assunto e, quando faz um comentário, é muito mais exigida:
— O torcedor de futebol não tolera erros dos repórteres masculinos, imagina de uma mulher. Mas, de forma geral, sempre tive apoio dos meus colegas e nunca fiquei de saia justa.