Aniversário de Zico inaugura seção no site da ABI


13/02/2008


José Rezende
29/02/2008
 

A terça-feira 3 de março de 1953 era um dia comum para os moradores da Rua Lucinda Barbosa, do pacato subúrbio de Quintino, no Rio de Janeiro. Porém, na casa da família Antunes vivia-se a expectativa da chegada de mais um herdeiro. Às 7h25, a parteira Dona Maria gritou: “É menino!” Nascia Arthur Antunes Coimbra.

Zico cresceu entre flamenguistas. Edu, um de seus irmãos e cracaço de bola, explica a origem rubro-negra dos Antunes:
— Meu pai, Seu Antunes, um apaixonado por futebol, começou a torcer pelo Flamengo depois de um jogo em que o time perdeu para o América de goleada. Ele se encantou pelas cores, ficou sensibilizado com a derrota, inverteu as coisas e passou a torcer pelo Flamengo. Ele era um marqueteiro de primeira grandeza — e foi o primeiro que o Flamengo teve na praça. Era estranho, porque todos diziam: “Como um português pode torcer pelo Flamengo?” Ele respondia que não era português. Português era sabão e vascaíno. Ele era lusitano.

 Entre os irmãos Tonico e Antunes

Depois de um tempo assistindo às peladas promovidas pelos irmãos, primos e colegas do bairro, Zico começou a participar das brincadeiras, mostrou intimidade com a bola e entrou para o time, batizado de Lucinda Futebol Clube.

Coincidentemente, o locutor esportivo Celso Garcia, rubro-negro fanático, morava na Rua Lucinda Barbosa. O radialista começou a ver os jogos dos irmãos Antunes e logo notou que todos eram bons de bola: Tonico, Antunes, Nando, Edu e Zico, que levou à Gávea, onde o deixou aos cuidados do paraguaio Modesto Bria — que formou a famosa linha média rubro-negra com Biguá e Jaime, na década 40 e início dos anos 50. 

Com 12 anos, franzino, Zico ficou sob os cuidados das equipes médica e de preparação física do Flamengo, para ganhar massa muscular. Sobre o assunto, Edu contesta certas opiniões:
— Sou contrário àqueles que dizem que o Zico é um jogador de laboratório. Não é, não. O Zico foi cedo pra Gávea; queriam encontrar um super-homem? Foi o meu caso no América; só não cresci porque essa é a minha genética. O Zico ainda cresceu um pouco mais e foi ajudado pelo tratamento que teve, mas o grande laboratório foi Quintino, os pais e os irmãos. Sobre isso, eu brigo mesmo, porque não gosto de ninguém que quer ser o “pai da criança”. Pai ele só teve um, o Seu Antunes. 

Substituição

Em 1971, depois de cinco derrotas consecutivas, a Diretoria do Flamengo demitiu Yustrich, substituindo-o pelo paraguaio Fleitas Solich, que havia comandado o tricampeonato carioca de 1953, 54 e 55. O destino quis que o “Feiticeiro”, como era conhecido, fosse o lançador de Zico no time principal, como fizera em 54 com o alagoano Dida — ídolo do craque de Quintino — e, por coincidência, diante do mesmo adversário, o Vasco da Gama, no 1º turno da Taça Guanabara. No dia 29 de julho, Zico pisava o gramado do Maracanã ao lado de Ubirajara, Murilo, Washington, Fred, Tinteiro, Liminha, Tales, Nei, Fio e Rodrigues Neto. O Flamengo venceu o Vasco por 2 a 0.

 Com Leandro, Júnior, Lico e Andrade no Mundial

Em 1972, Zico ainda integrava a equipe juvenil do Flamengo. Na decisão contra o Vasco, o time rubro-negro ganhava por 1 a 0, quando ele ampliou o marcador:
— Aos 36 minutos do 2º tempo, o lateral Nei cruzou da direita, matei a bola na coxa e, com leve toque tirei o zagueiro da jogada. Antes que a bola caísse, soltei a bomba de esquerda. Um golaço que nos assegurou o título e me abriu as portas para o time principal.

A presença do jogador é tão marcante na vida do Flamengo, que, quando se escreve sobre a história do clube, cita-se sempre a Era Zico como um capítulo a parte. No período de 1972 a 1983, os títulos foram muitos: nos campeonatos estaduais — 1972, 1974, 1978, 1979, 1979 (especial) e 1981 —, nos Brasileiros — 1980, 1982 e 1983 —, na Libertadores da América — 1981 —, no Mundial Interclubes — 1981. E Zico liderou a artilharia dos estaduais de 75 (30 gols), 77 (27 gols), 78 (19, ao lado de Roberto), 79 (26 e 34 gols, no 2º estadual) e 82 (21 gols) e no Brasileirão de 80 (27 gols) e 82 (21 gols). Na final da Taça Libertadores, no Estádio Centenário, em Montevidéu, contra a equipe chilena do Cobreloa, marcou os dois gols da vitória rubro-negra por 2 a 0, em 23 de novembro de 1981:
— Ganhávamos por 1 a 0 e o goleiro Wirth cometeu toque fora da área, aos 33 minutos do segundo tempo. Cobrei a falta com perfeição, no canto direito. Ganhamos o título e a passagem para Tóquio. Nossa maior conquista.


Internacional

Em 12 de dezembro daquele ano, em Tóquio, Zico e seus companheiros conquistaram diante do Liverpool o maior título da história do Flamengo: campeão da Copa Intercontinental, o Mundial de clubes. No Estádio Nacional da capital japonesa, 62 mil pessoas assistiram ao show de bola do “Galinho de Quintino”. O Flamengo venceu por 3 a 0 — gols de Nunes, aos 13 e aos 41 minutos do 1º tempo; e Adílio, aos 34 do 2º. A equipe da Gávea atingia o auge da Era Zico e a massa rubro-negra guarda até hoje na memória e no coração os nomes de seus heróis: Raul, Leandro, Mozer, Marinho e Júnior; Andrade, Adílio e Zico; Tita, Nunes e Lico.

 No jogo com o  Liverpool, em Tóquio

Em 1983, depois de ser bicampeão brasileiro, Zico foi negociado e passou a vestir a camisa do Udinese, da pequena cidade de Udine. Nos três anos em que ficou na Itália, logo na primeira temporada ele foi vice-artilheiro do campeonato do país com um gol a menos que o francês Michel Platini, que atuava no Juventus. E a primeira vitória diante do Roma, com o “Galinho” marcando o único gol da partida, ficou para sempre no coração dos torcedores udinenses. 

Em 1985, o craque retornou ao Flamengo. Leandro, agora como zagueiro de área, Mozer, Andrade e Adílio eram os remanescentes do timaço de sua Era. No dia 29 de agosto, jogando contra o Bangu pelo campeonato estadual, Zico sofreu grave contusão:
— Recebi a bola na intermediária e parti para a área. Fugi da falta do primeiro adversário, que me deixou meio desequilibrado. O segundo veio para cima, mas me livrei dele também. Aí veio o Márcio Nunes, voando baixo. Os pés dele passaram por cima da bola sem a menor preocupação em acertar nela. O alvo era meu joelho esquerdo. Pegou com tudo. 

O jogador passou a conviver com freqüentes problemas no joelho atingido. Mesmo assim, conseguiu, com a camisa rubro-negra, os títulos de campeão estadual de 86 e de campeão da Copa União de 87 — este último título não reconhecido pela CBF, porque o Flamengo se recusou a disputar a final com o Esporte Clube Recife, campeão da Segunda Divisão. 

Com a seleção brasileira, Zico esteve em três Copas do Mundo: em 78, na Argentina, sob o comando de Cláudio Coutinho; e em 82, na Espanha, e 86, no México, com Telê Santana como técnico. Em 98, na França, exerceu o cargo de Coordenador. 

Técnica

 Com Sócrates e o técnico Telê: seleção de 82

Mesmo sem ser campeão do mundo, Zico teve momentos marcantes com a camisa do Brasil. Ele, Falcão e Sócrates formaram um meio-de-campo altamente técnico no time de Telê, em 82. Numa partida contra a Iugoslávia, em Fortaleza, marcou um gol espetacular, depois de driblar vários adversários e deixar a bola praticamente dentro da meta iugoslava. Em 86, o pênalti perdido diante da França, que poderia mudar o resultado do jogo e classificar o Brasil para a fase semifinal, não diminuiu o futebol de Zico, nem seu prestígio junto ao torcedor brasileiro. 

Em 2 de dezembro de 1989, aos 36 anos, num Fla x Flu em Juiz de Fora, pelo Campeonato Brasileiro, o “Galinho” fez sua última partida oficial pelo Flamengo, após 19 anos, 730 jogos e 508 gols com a camisa rubro-negra. Jogou 52 minutos, tempo suficiente para deixar sua marca de artilheiro ao abrir a contagem aos 22 minutos de jogo. O Flamengo ganhou por 5 a 0 e os outros gols foram marcados por Renato, Luís Carlos, Uidemar e Bujica.

Depois de se despedir do Flamengo, Zico rumou para o Japão, onde defendeu o Kashima Antlers e contribuiu decisivamente para o crescimento do futebol do país, como jogador e técnico. Exemplo de profissional, assumiu a direção técnica da seleção nacional e classificou-a para o mundial de 2006, na Alemanha.

As palavras de Ricardo Pinto, goleiro do Fluminense, depois do jogo de despedida do “Galinho”, retratam bem a admiração e o respeito que os companheiros sempre dedicaram a ele: “Sinto-me honrado em ter levado o último gol de Zico.” Hoje, o cidadão Arthur Antunes Coimbra segue sua carreira de técnico na Turquia, obtendo excelentes resultados, e mantém o Centro de Futebol Zico (CFZ), na Barra.