Fotojornalismo na cultura pernambucana


24/02/2010


O interesse do pernambucano Fred Jordão pela fotografia se desenvolveu na infância, quando seu pai fazia projeções de slides em casa com fotos que documentavam as viagens da família. Nas paredes do imóvel, viu suas primeiras imagens serem exibidas. Mais tarde, morando em Brasília, descobriu que, com a máquina na mão, poderia vencer a timidez e explorar seu lado curioso. Era o ano de 1985, e Fred Jordão, então com 21 anos, cursava Jornalismo no Centro Universitário de Brasília (Ceub).

Do pai, também herdou o gosto pela cultura popular, à qual procurou vincular seu trabalho como fotojornalista. Com o salário que recebia como empregado do Ministério da Fazenda, adquiriu sua primeira máquina fotográfica e começou a registrar o ambiente musical de Brasília nos anos 80, registrando performances de bandas de rock como Capital Inicial, Plebe Rude e Legião Urbana, que ganhavam destaque no panorama nacional.

Antes de se tornar um profissional em fotojornalismo e concluir o curso universitário, Fred Jordão foi estagiário de jornalismo na Rádio Nacional de Brasília, no programa “Geração Colorida”, juntamente com a hoje apresentadora Ana Paula Padrão. Passou um ano na emissora, até que teve retornar ao seu estado natal, onde terminou os estudos na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Foi nesse período, final dos anos 80, que o fotógrafo teve a oportunidade de entrar em contato com a efervescência cultural pernambucana:
— Na música, o movimento Manguebeat, encabeçado por Chico Science, estava despontando. Assim como no cinema, nas artes plásticas também estava ocorrendo uma renovação, com grupos coletivos de arte como os Caras Paranabuco, Formiga sabe que roça come e Quarta zona de arte. O teatro de João Falcão também se destacou nesse cenário.

Ao se deparar com o bom momento cultural por que passava Pernambuco, Fred Jordão não teve dúvidas: procurou se misturar aos jovens artistas, que faziam parte de sua geração, para documentar tudo o que estavam produzindo naquele momento. Foi então que convidou os fotógrafos Roberta Guimarães e Gil Vicente para o auxiliarem na empreitada, que resultou na produção do livro “Eu vi o mundo”, publicado pela editora Fanzine (2006) como uma retrospectiva:
— Eu achei a cena cultural que estava se desenvolvendo em Pernambuco muito mais original do que aquela com o qual havia tido contato em Brasília. Pensei que aquilo ia se tornar uma coisa muito maior e resolvi registrar o momento. O livro se divide em música, teatro, dança, cinema e artes plásticas, com texto de introdução escrito pelo repórter Xico Sá, que hoje trabalha na Folha de S. Paulo e na época era meu parceiro em jornais da imprensa alternativa.

Imprensa alternativa

A princípio, a maioria dos repórteres-fotográficos inicia a carreira como freelancer ou em veículos da chamada imprensa nanica, adquirem tarimba e vão buscar mercado nos grandes jornais. Com Fred Jordão foi ao contrário. Saiu da imprensa tradicional para trabalhar na alternativa, onde achava que teria mais liberdade para se expressar.

Quando decidiu trabalhar exclusivamente como fotojornalista, estava estagiando como repórter na editoria de Cultura do Jornal do Commércio de Recife, mas se sentia incomodado pelo fato de não poder expressar sua opinião nas matérias que redigia:
— Penso que o repórter tem um compromisso muito sério com a verdade, com os fatos, deixando de lado sua própria opinião. E eu queria poder me expressar, mas sabia que isso só aconteceria quando me tornasse um repórter tarimbado e pudesse assinar artigos. Então, achei que na fotografia eu teria mais liberdade e poderia realizar um trabalho mais autoral. Por exemplo, posso sacanear algum político corrupto dependendo do ângulo em que eu vá fotografá-lo.

Motivado pela necessidade de ter mais liberdade, Fred Jordão juntou-se com amigos da faculdade para formar uma “rede de frilas”, para a qual surgiam diversas oportunidades de trabalho, principalmente na imprensa alternativa, em jornais como O Rei da Notícia e O Príncipe, e em outros vinculados a sindicatos, nos quais começou a trabalhar como fotógrafo com mais regularidade:
— Os repórteres me chamavam para registrar passeatas e manifestações, e eu fui aprendo a me posicionar, a buscar os melhores ângulos. Esses jornais foram para mim uma espécie de curso primário.

A faculdade mesmo, conta Fred, foi cursada na redação do Jornal do Commércio, para o qual retornou como fotojornalista, em 1988. Na época, após ter sido comprado pelo empresário João Carlos Paes Mendonça, o jornal pernambucano estava passando por uma reformulação, que era conduzida pelos jornalistas Ivanildo Sampaio, Antônio Portela, Fernando Menezes e Ronildo Maia Leite:
— Eles já me conheciam da agência Itaity, na qual trabalhamos juntos, e me levaram para o jornal, onde aprendi muito com uma equipe chefiada pelo exigente Wladimir Barbosa, que já venceu o Prêmio Esso de Fotografia. Lembro que ele olhava os negativos e já sabia se a foto era boa ou não.

Nesse retorno ao JC, Fred conta que era comum ouvir dos profissionais mais antigos provocações do tipo: “você se formou em Jornalismo e quer tirar nosso emprego aqui na fotografia, por que não vai para a Redação?”
— Naquela época, em 88, o tipo de profissional que entrou no jornal como ascensorista, foi trabalhar no laboratório de fotografia e depois se tornou fotojornalista não existia mais, e eu fui um dos representantes da primeira geração de fotógrafos que passaram por faculdade, que tinham que aprender um outro idioma. Esse embate me trouxe algumas dificuldades.

Espaço

Para Fred Jordão, um dos principais problemas enfrentados hoje pela classe diz respeito à falta de espaço para as fotografias nos jornais:
— O jornal de hoje tem uma presença muito forte de anúncios, sendo alguns publicados inclusive na capa dos cadernos, e as fotos tiveram um espaço reduzido. Qual matéria é publicada hoje com duas fotos? Isso implica queda de interesse dos jovens pela profissão e da qualidade do trabalho final. E aí entra a maluquice da objetividade: quem, quando, onde, como e por quê. Traduzir esse lead do repórter para a fotografia limita muito o profissional.

O fotojornalista lembra do tempo em que fotografava o tradicional bloco carnavalesco pernambucano Galo da Madrugada — que anualmente coloca um milhão de foliões nas ruas de Recife — para as revistas Manchete e Fatos & Fotos, que davam amplo destaque para as imagens:
— Eram publicadas umas oito fotos, algumas em páginas duplas. O trabalho rendia. Hoje, se a matéria não for especial nem foto tem, mas o anúncio está lá.

Ainda com passagens pelo Diário de Pernambuco e pela Veja 28º, Fred Jordão fundou, em 1991, a agência Imago Fotografia, e passou a se dedicar a frilas para empresas nordestinas, agências de publicidade, Governo do Estado de Pernambuco e para publicações como a revista Trip. Além de “Eu vi o mundo”, também publicou os livros “PE 5 décadas de arte”, “O Rio São Francisco”, “Pernambuco Popular”, “Pernambuco preservado” e “Projeto lambe-lambe”. Atualmente, está envolvido em três projetos:
— Estou fazendo as fotos para o livro do pintor pernambucano José Claudio, para um trabalho em conjunto com o historiador Frederico Pernambucano de Melo, sobre o ciclo do cangaço, e desenvolvendo o projeto “Coqueiros”, no qual eu a fotógrafa Roberta Guimarães estamos ilustrando o texto do pesquisador Raul Lodi sobre toda a cultura popular que cerca o coco, ritmo de origem pernambucana. 

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