Relação que gera qualificação


22/05/2007


Nos chamados países de primeiro mundo, há mais entrosamento na relação entre as redações e a academia. É nesta que os profissionais e os veículos de comunicação buscam o desenvolvimento de suas atividades — e até financiam estudos com esse objetivo, pois os empresários entendem que a importância de uma relação que qualifica o seu produto e gera maiores dividendos.

No Brasil, o processo está muito longe do ponto ideal, embora comecem a surgir iniciativas, como as da Rede Paranaense de Comunicação (RPC) e do jornal O DiaEM>. A primeira uniu, em 2005, o Instituto Rede Paranaense de Comunicação (IRPC), a Universidade Federal do estado (UFPR) e a PUC-PR, que criaram o Programa de Extensão em Comunicação, voltado para especializar e ampliar a formação técnica dos profissionais da área. Aulas teóricas e práticas foram ministradas por professores das duas instituições de ensino e por jornalistas da RPC, mas, no momento, o convênio só está funcionando na PUC.

Rosa Maria Dalla Costa, professora da UFPR que participou da coordenação dos cursos, diz que o desenvolvimento do programa foi muito positivo: de um lado, jornalistas interessados na possibilidade de aumentar sua qualificação; do outro, pesquisadores buscando enriquecer seus conhecimentos com as experiências cotidianas trazidas pelos profissionais das redações. O objetivo principal era propiciar justamente a troca de experiências e saberes e cada módulo foi pensado de forma a ter um professor universitário e um profissional da RPC que atuasse na área do curso proposto.

 Arnaldo César Ricci Jacob

Aproximação

Arnaldo César Ricci Jacob, ex-Diretor de Jornalismo da Band Rio, considera o desentendimento uma perda muito grande para ambos os lados:
— O momento exige que, cada vez mais, as redações se aproximem das universidades, para poder qualificar os seus quadros — diz.

Ele lembra que, quando trabalhava no Dia, o jornal fez um convênio com uma universidade e criou um curso de pós-graduação em Jornalismo, que durava oito meses e era ministrado por profissionais da redação e por professores da universidade:
— Assim foi possível transmitir conhecimentos acadêmicos e práticos. As turmas tinham em média 30 alunos e a idéia era que os cinco melhores fossem contratados como trainee. Mas, geralmente, acabavam sendo aproveitadas cerca de 15 pessoas. Chegou-se a um ponto em que 30% do pessoal da redação do Dia tinham passado pelo curso.

Arnaldo César diz que a falta de diálogo entre pesquisadores e jornalistas acontece por pura vaidade e chama a atenção para as mudanças tecnológicas que estão ocorrendo e não devem ser desprezadas por nenhuma dos lados:
— Os produtos digitais são caros, normalmente ultrapassam o orçamento dos estabelecimentos de ensino. Então, cabe aos profissionais que lidam com essa tecnologia transferir esse conhecimento para as universidades. Precisamos acabar com a vaidade. O jornalista que está na redação se acha mais jornalista que aquele que se encontra na universidade. Isso é uma grande besteira.

Vazio

             Gerson Luiz Martins

Um dos aspectos que mais incomoda os acadêmicos é que os profissionais de imprensa sempre recorrerem a especialistas de diversas áreas para sustentar e apoiar suas matérias, mas não seguirem o mesmo padrão quando o assunto é o próprio jornalismo:
— Os pesquisadores da área são considerados “críticos vazios”. Pesquisam, escrevem livros, refletem sobre um objeto que, no entender dos jornalistas, não é concreto. Para os profissionais da mídia, o objeto “jornalismo” não é encarado como ciência; ele é de trabalho, não de estudo — diz Gerson Luiz Martins, da SBPJor.

A dificuldade está na interpretação incorreta da matéria-prima comum a ambos os lados, que, no entender de Gerson, demonstra preconceitos:
— Os profissionais de imprensa alegam que os professores e pesquisadores não conhecem a realidade das redações; os acadêmicos reclamam que os jornalistas não refletem sobre o seu trabalho e não dedicam tempo para qualificar sua atividade.

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 Caio Túlio

Caio Túlio, ex-ombudsman da Folha de S. Paulo, doutorando em Ciências da Comunicação na ECA (USP) e professor de Ética no Jornalismo, também considera que existe um ruído na comunicação entre teoria e prática:
— As empresas recorrem pouco aos pesquisadores porque eles não conseguem fazer sua produção chegar às redações. Como jornalista, eu, por exemplo, nunca recebi informações sobre revistas especializadas em comunicação; os congressos e eventos são feitos sem divulgação eficiente. Só depois que voltei ao ambiente acadêmico é que pude ver que há muitos encontros e uma razoável produção de pesquisa, embora ainda defasada em relação à realidade do mercado.

Caio Túlio discorda de Gerson na questão de a produção acadêmica ser considerada “crítica vazia”, lembrando que há pesquisadores importantes que foram para o jornalismo prático, como Carlos Eduardo Lins da Silva, e pesquisadores que têm produção constante, como Manuel Carlos Chaparro (USP) e Norval Baitello (PUC-SP):
— A lista é extensa e respeitável, mas as universidades — principal e paradoxalmente na área de Comunicação — de fato não conseguem divulgar o que fazem e os jornalistas, em geral, são muito preguiçosos para sair atrás de informação sobre aquilo que acham que dominam melhor do que ninguém.

                    Aluízio Maranhão

Aluízio Maranhão, editor de Opinião do jornal O Globo, acha que o diálogo entre o campo da pesquisa e a área prática é prejudicado porque a imprensa brasileira ainda cobre pouco a própria imprensa e concorda que há falta de conhecimento e de aproximação entre as partes:
— Quando as pesquisas conseguem chegar às redações ou os jornalistas descobrem a sua existência, elas se tornam uma ferramenta de trabalho. Mas, freqüentemente, seu uso fica limitado ao período eleitoral.

Para Maranhão, o ideal é que haja uma aproximação, “pois a preocupação final das duas áreas é a mesma: informar da maneira mais eficiente possível”.