Pobre do Maracanãzinho


20/07/2022


Por Octávio Costa, em Ultrajano

Sobre o encontro de Bolsonaro com os embaixadores, tudo já foi dito. Uma vergonha, uma agressão ao Estado de Direito e também uma tremenda tolice, como bem disse Gaspari. A Associação Brasileira de Imprensa endossou a nota de protesto de mais de 20 entidades em defesa da Democracia, e a sociedade civil mostrou que saberá reagir às ameaças do desvairado do Planalto contra o processo eleitoral. Por mais que ele e seus generais de estimação esperneiem, teremos eleições gerais no dia 2 de outubro. O ex-presidente Lula permanece à frente, como o grande favorito. E tudo indica que teremos uma grande festa popular no Eixo Monumental de Brasília no dia 1º de janeiro de 2023.

Mesmo assim, acordei nesta quarta-feira com uma ponta de tristeza, pensando no que vai acontecer no Maracanãzinho no próximo domingo. O tradicional ginásio da Tijuca, de tantos eventos marcantes, não merecia receber a convenção do PL que vai lançar a candidatura de Bolsonaro à reeleição. Não merecia ser palco de reunião de milícias fascistas. Vizinho à UERJ e com o morro da Mangueira ao fundo, o belo ginásio tem uma memória a zelar, tanto no esporte quanto na cultura. Seu nome homenageia Gilberto Cardoso, o ex-presidente do Flamengo, que morreu ali em 1955 quando assistia a uma final de basquete em que seu clube foi campeão.

Por falar em basquete, no dia 25 de maio de 1963 o Brasil se tornou bicampeão mundial masculino, diante de um Maracanãzinho lotado por mais de 20 mil pessoas. O time dirigido pelo experiente Kanela venceu a Seleção dos EUA na final por 85 x 81, com 48 pontos somados da dupla Amaury Pasos e Wlamir Marques. Kanela, que havia comandado a Seleção Brasileira na conquista de 1959 em Santiago do Chile, voltou a contar com a lendária seleção formada por Wlamir, Amaury, Ubiratan, Carlos Massoni, Paulista, Rosa Branca, Jathyr, Menon, Sucar, Victor, Valdemar e Friedrich Braun. Num tempo em que não havia a cesta de três pontos, Amaury foi o cestinha do Mundial com 110 pontos.

Em feito bem mais recente, no último dia da Olimpíada de 2016, no Rio, o Brasil venceu a Itália por 3 sets a 0 e conquistou sua terceira medalha de ouro no vôlei de quadra masculino. Mas é bom que os mais jovens saibam que em sua história o ginásio tijucano também foi sede de eventos culturais inesquecíveis. Em noites de gala, lá se apresentaram, por exemplo, Nat King Cole e Ray Charles. Em abril de 1959, Nat King Cole emocionou a todos ao cantar em português enviezado “Quero chorar/ Não tenho lágrimas/ Que me rolem nas faces/ Pra me socorrer”. Já Ray Charles, na primeira vinda ao Brasil, cantou ao piano no Maracanãzinho em setembro de 1963. E o público fez coro em I can’t stop loving you.

Mas, para minha geração, o que mais marcou (eu estava lá com minha irmã Nanda) foi a decisão da fase nacional do Festival da Canção em 29 de setembro de 1968. Como todos sabem, o júri deu o primeiro lugar à música Sabiá, de Tom Jobim e Chico Buarque, mas a torcida queria a vitória de Caminhando (Pra não dizer que falei de flores), de Geraldo Vandré. Assim que foi anunciado o segundo lugar para Caminhando, Tom e Chico receberam a maior vaia de suas vidas. A vaia só foi interrompida a pedido de Vandré. Depois de exigir respeito a Tom e Chico, Vandré gritou: “Gente, por favor: a vida não se resume em festivais!…” E então começou a cantar a música que se tornou hino de resistência. Nas arquibancadas do Maracanãzinho, quase 20 mil pessoas acenavam com lenços brancos na mão (ainda não havia celulares). Dizem que Tom chorou na direção de seu carro ao voltar para Ipanema.

Essas são histórias famosas do nosso Maracanãzinho. Infelizmente, os milicianos fascistas de Bolsonaro ocuparão o ginásio no domingo. Eles escolheram o local errado. O Maracanãzinho é sinônimo de festa e de alegria. Não devia ser usado por quem prega o discurso do ódio.