Memória de Olinto é saudada na ABL


22/09/2009


Evanildo Bechara, Alberto da Costa e Silva, Cícero Sandroni, Ivan Junqueira e Nelson Pereira dos Santos

O imortal, escritor e jornalista Antonio Olinto, morto no último dia 12, no Rio de Janeiro, foi homenageado nesta quinta-feira, 17, na “Sessão de Saudade”, realizada no Salão Nobre do Petit Trianon, na sede da Academia Brasileira de Letras (ABL). Prestigiaram a concorrida solenidade, acadêmicos, jornalistas, escritores, pesquisadores, como Haroldo Costa e Ricardo Cravo Albim, além de professores e estudantes da Escola Padre Dr. Francisco da Motta e do Colégio Sonja Kill, subordinados a Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência.
—Nos últimos anos, o escritor Antonio Olinto participava sempre dos nossos eventos culturais, como a festa que realizamos em 5 de novembro, em comemoração ao Dia Nacional da Cultura. Ele gostava muito da escola, especialmente da nossa biblioteca. Deixou em todos nós uma saudade muito grande e viemos homenageá-lo, disse Regina Ribeiro de Souza, diretora da Escola Padre Doutor Francisco da Motta.

Antonio Olinto foi eleito para a ABL em 31 de julho de 1997, ocupando a cadeira nº 8, que tem Claudio Manoel da Costa, como patrono, Alberto Oliveira, como fundador, e Oliveira Viana, Austregésilo de Athayde e Antonio Callado como sucessores.

O Presidente da ABL, jornalista Cícero Sandroni, deu início à solenidade conduzindo a mesa de honra formada pelos acadêmicos Evanildo Bechara, Alberto da Costa e Silva, Ivan Junqueira e Nelson Pereira dos Santos.
—Estão reunidos aqui os amigos de Antonio Olinto nesta homenagem singela como toda “Sessão da Saudade” é. Uma sessão de concentração, de seriedade, lembrança e memória daquele confrade, acadêmico, irmão nosso, Antonio Olinto, que nos deixou. Não é uma sessão de alegria. Lembraremos, consternados, a figura de Antonio Olinto, disse Sandroni, que, em seguida, anunciou o recebimento de mensagens de pesar encaminhadas à ABL pelo Vice-presidente da República, José Alencar, o jornalista Arthur Poerner, e o Presidente da Academia Mineira de Letras, Murilo Badaró, entre outros.

Dedicação

Acadêmicos durante a homenagem

Cícero Sandroni passou, então, a palavra aos acadêmicos, que direcionaram suas mensagens de pesar aos familiares e amigos de Antonio Olinto, com destaque especial para a jornalista Beth Almeida, assessora do jornalista e escritor ao longo de 26 anos.

Os confrades aplaudiram em Antonio Olinto a jovialidade de espírito, a postura fraternal e alegre, a consagrada trajetória nas letras, a expressão do talento em diversos gêneros literários como o romance, a poesia, o conto, o jornalismo, a crítica literária, e ainda sua rica contribuição à cultura nacional, principalmente no enlace Brasil-África, como introdutor da temática africana na literatura brasileira.

Respeitando os critérios de antiguidade dos acadêmicos, Murilo Melo Filho iniciou a leitura da mensagem enviada por Arnaldo Niskier, que ressaltou os longos anos de convivência com Antonio Olinto na ABL e na direção do Jornal de Letras.
—Sentirei muito a ausência, principalmente por causa dos sábios conselhos, os quais só pode dar aquele que chega gloriosamente aos 90 anos. Poderia fazer mais? Não há dúvida. Quis o destino, entretanto, que agora houvesse esta interrupção. (…) Esteja certo, querido amigo, que não iremos desonrar a sua memória.

A sessão prosseguiu com a leitura dos textos enviados por acadêmicos ausentes, como Evaristo de Moraes Filho, Marcos Vinicios Vilaça, João Ubaldo Ribeiro, Paulo Coelho, Alfredo Bosi, Marco Maciel.

Na seqüência, discursaram os imortais presentes, entre eles, Lêdo Ivo, Cândido Mendes de Almeida, Tarcísio Padilha, Afonso Arinos de Melo Franco, Carlos Heitor Cony, Ivan Junqueira, Alberto da Costa e Silva, Ana Maria Machado, Moacir Scliar, Antonio Carlos Secchin, Domício Proença Filho, Luiz Paulo Horta.

Legado

A forte convivência com Antonio Olinto e os aspectos históricos que influenciaram a obra do escritor foram destacados pelo acadêmico Lêdo Ivo:
—Olinto se inscreve na galeria dos meus amigos. Nos conhecíamos há mais de 30 anos. Assim como outros autores brasileiros, como Afonso Arinos de Melo Franco, Joaquim Nabuco, Érico Veríssimo, Olinto teve no exterior uma experiência que o enriqueceu de maneira extraordinária, começando pela África, mostrando a ligação do Brasil com os povos africanos. Olinto foi o poeta da África, assim como Alberto da Costa e Silva foi o prosador da África brasileira.

Ivan Junqueira

A trilogia sobre a África é o grande legado de Antonio Olinto, na opinião de Ivan Junqueira, para quem a morte do acadêmico representa “o fim de uma geração especial de escritores”:
—Antonio Olinto foi um guerreiro que nos legou pelo menos uma obra para a eternidade: sua trilogia Alma da África, formada pelos romances “A Casa da Água”, “O Rei de Keto”, e o “Trono de vidro”. Desta experiência resultou o livro “Brasileiros na África”, sobre o retorno dos ex-escravos brasileiros. Uma obra de referência desde a sua publicação em 1964.

Cosmopolita

As raízes mineiras e o perfil cosmopolita de Olinto foram lembrados por Cândido Mendes de Almeida:
—“Quero ser santo”. Este foi o seu empenho e esta foi a primeira distinção de Antonio Olinto, seminarista, repreendido pelo padre reitor no sentido de que o importante para a santidade não era o sofrimento, mas a generosidade, o reconhecimento. Assim começou a sua caminhada de reconhecimento, iniciada em Ubá com o livro sobre Ari Barroso. É difícil encontrarmos uma militância de escritor com a de Antonio Olinto, com sua produção permanente e a versatilidade como poeta, crítico literário, sempre aberto às novas gerações, numa visão universal, cosmopolita.

Evanildo Bechara

O viés multifacetário da carreira do escritor também foi sublinhado pelo imortal Evanido Berchara:
—Feliz a criatura de Deus que contemplando seu trajeto de vida se pode comparar a um caleidoscópio. Qual bela harmonia dos caleidoscópios foi a vida e as atividades de Antonio Olinto nesta jornada terrena de seus 90 anos bem vividos, pois nela sempre pode compor um quadro de harmônicos sucessos como homem das letras e das artes, do trabalho burocrático, de sua passagem pelo magistério.

O acadêmico e embaixador Afonso Arinos de Melo Franco aplaudiu a importante contribuição de Antonio Olinto para o desenvolvimento do País:
—Ele se desdobrou para divulgar a literatura brasileira no exterior, não apenas como operoso adido cultural nas Embaixadas do Brasil na Nigéria e na Grã-Bretanha. Desde quando, a convite do Governo da Suécia em 1950 para as comemorações do cinqüentenário do Prêmio Nobel, proferiu conferências nas universidades de Estocolmo e Uppsala. Nomeado para Lagos, em 1962, trabalhou muito na África Ocidental. De 1965 a 1967, lecionou na Universidade de Columbia, em Nova York, e em vários outros centros de estudo superior nos EUA. Adido em Londres, a partir de 68, Olinto desenvolveu atividade incessante na Inglaterra, Escócia, Irlanda, Dinamarca, França, Itália, Rússia, Japão, Coréia, Argentina, entre outros países. Foi, assim, o caixeiro viajante do Brasil. A ABL e particularmente a nossa bancada mineira ficaram empobrecidas em quantidade e qualidade pela sua perda.

Jornalismo

Murilo Melo Filho recordou os longos anos de amizade com o escritor e as experiências que trocaram na cobertura jornalística internacional.
—Olinto foi um escravo, um servo das palavras, colocando ao serviço das letras toda a sua capacidade de trabalho e sabedoria. (…) Nosso primeiro encontro data do ano de 1953, em plena campanha eleitoral nos Estados Unidos, quando estávamos fazendo a cobertura jornalística, Olinto pelo Globo, eu, pela Tribuna da Imprensa. A convite do Departamento de Estado dos EUA, Olinto percorreu 36 estados americanos falando sobre a cultura e os intelectuais brasileiros. Também fez diversas conferências no continente africano, onde viveu durante três anos. Como adido cultural em Londres, em 1968, desenvolveu intensa atividade, editando durante vários anos a revista The Brazilian Gazette. (…) Já octagenário, Olinto esbanjava saúde e energia como editor do Jornal de Letras. Foi eleito para a cadeira nº 8 desta Academia tendo como patrono o poeta Claudio Manoel da Costa, como fundador, outro poeta parnasiano, Alberto de Oliveira, como antecessores o sociólogo Oliveira Viana e os jornalistas Austregésilo de Athayde e Antonio Callado. A sua cadeira é assim, a cadeira da poesia, da sociologia e do jornalismo, essencialmente da palavra. Simples, humilde, honesto, digno, culto, competente, que ao longo de 90 anos nos ministrou gloriosa missão e generoso exemplo de vida.

Domício Proença Filho também ressaltou aspectos da carreira jornalística de Antonio Olinto:
— Ele fez de tudo no jornal do Dr. Roberto Marinho. Chegou mesmo a ser responsável pelo consultório sentimental, por uma coluna de cinema e até por uma coluna social. Durante toda a sua vida Olinto foi jornalista. Do jornal para a televisão o percurso foi imediato. Coube a ele dirigir e apresentar os primeiros programas literários televisivos do Brasil.
A conceituada coluna “Porta de Livraria”, que Antonio Olinto assinou em O Globo, foi apontada pelo jornalista, escritor e acadêmico Carlos Heitor Cony, como um marco na história das letras no Brasil:
— Durante anos Antonio Olinto foi o cronista literário mais influente do País, tendo a sua “Porta de Livraria” como referência principal para aqueles que se interessassem por livros e eventos editoriais.

A Coleção “Porta de Livraria”, lançada na década de 1960, consagrada à poesia, representou “um diferencial na trajetória poética de Antonio Olinto”, conforme as palavras do acadêmico Antonio Carlos Secchin.

Amor

Alberto da C. e Silva

O perfil empreendedor de Antonio Olinto e sua relação de troca e generosidade com os iniciantes nas letras pontuaram o discurso do também africanista Alberto da Costa e Silva:
—Quero recordar aqui o Antonio Olinto muito especial: aquele que estimulou gente jovem a escrever, que ajudava os escritores novos, que procurava editar os escritores novos, que tinha sempre uma palavra de estímulo no difícil mundo das letras e na difícil função de escrever. A este Antonio Olinto deve também a Academia esta homenagem.

Para Tarcísio Padilha, Antonio Olinto foi um operário das letras e um exemplo de dedicação ao próximo:
—Ele transitou pelo mundo dos homens demonstrando amor à vida, uma permanente alegria e jovialidade cativante. Esta alegria, certamente, lhe abriu todas as portas, pois a comunicação se fazia sempre com o reconhecimento do outro. Era um homem de pensamento, um homem de realizações. Estão aí as dezenas de bibliotecas que ele reformou e inaugurou. Sempre seguindo o vínculo visceral com o livro, a pena, a palavra escrita.

Carlos Nejar também acentuou o empenho amoroso de Antonio Olinto às atividades literárias:
—Ativista cultural como raros, abria bibliotecas com a alegria de quem atinava um poder mágico e instaurador dos livros. Não tinha idade. Não quis acatar idade alguma, salvo a incrível volúpia de amar o que fazia, cercando nobremente as pessoas com sua sombra operosa.

Os acadêmicos Luiz Paulo Horta, Moacir Scliar, Nelson Pereira dos Santos enfatizaram o entusiasmo, a simpatia, o interesse, a disposição e o vigor com os quais Antonio Olinto brindava os confrades e todas os compromissos relacionados a Academia. Para Ana Maria Machado, a mais forte lembrança do jornalista e escritor:
—Das múltiplas facetas de Antonio Olinto, a mais remota lembrança que eu guardo é do crítico e colunista literário, de quando, eu ainda adolescente, lia regularmente a sua “Porta de Livraria”. A mais recente é a de incansável trabalhador da área cultural, de quando eu, já na Academia, via-o sempre assíduo e disponível às mais variadas atividades externas, com mais disposição do que outros confrades mais jovens, entre os quais me incluo.

Alegria 

Pouco antes do encerramento da homenagem, Cícero Sandroni declarou aberto o período de inscrição para a cadeira nº 8, que segue até o dia 17 de outubro. A eleição, segundo Sandroni, será realizada em sessão extraordinária em 16 de dezembro. Finalizando o encontro, o Presidente da ABL, falou sobre os laços de amizade com Antonio Olinto e a sua relevância histórica para a ABL e o Brasil:
—Estou inconformado com a morte de Antonio Olinto. É como se a presença dele estivesse aqui conosco. Tive o primeiro contato com ele em 1953, eu como foca do Correio da Manhã, ele, colunista e repórter de O Globo. Sempre alegre, ativo, demonstrando a sua erudição sem se demonstrar um erudito. Olinto organizava caravanas de escritores, e eu, como foca do Correio da Manhã, também participava. Fomos a São Paulo duas vezes. Desde este momento eu já admirava Antonio Olinto. Em 1965, fizemos uma revista de literatura, de ficção, com textos de Jorge Amado, do próprio Olinto, Breno Acioli, Érico Veríssimo, entre outros. Foram dois números com autores brasileiros jovens. Uma excelente experiência. A mulher de Olinto, Zora, me disse certa vez que ele seria um velhinho de mais de 90 anos aplaudido em praça pública pelo povo do Rio de Janeiro. Isto realmente aconteceu nos dois desfiles das escolas de samba Mangueira e Padre Miguel, nos quais a língua portuguesa e a ABL foram homenageados. Antonio Olinto foi aplaudido pelo povo, como profetizou Zora. Estes dois acontecimentos integraram o momento de especial alegria e entusiasmo pela vida que Antonio Olinto estava vivendo atualmente. 

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