Do surfe para o fotojornalismo


02/05/2007


Rodrigo Caixeta
23/03/2007

Não fosse o surfe, Marcelo Piu não teria descoberto o mundo da fotografia. Os ensaios iniciais foram feitos depois de comprar a primeira câmera à prova d’água, em 1992, “pois queria deixar gravadas as imagens que via quando surfava”. Antes disso, porém, amargou uma tentativa mal-sucedida:
— Tentei entrar na água com uma câmera descartável revestida de contact… mas ela acabou se afogando! — diverte-se hoje o fotógrafo, que integra o time de profissionais do Jornal do Brasil.

Marcelo tirou seu registro de repórter-fotográfico em 1998, depois de abandonar definitivamente a Marinha de Guerra, após oito anos de serviço. Ele conta que seus pais ficaram revoltados com a decisão:
— Como podia um jovem jogar fora toda a estabilidade de um emprego federal para ser fotógrafo, sem saber se daria certo? Mas eu estava confiante e ninguém ia me desviar do meu objetivo. Quando saí do esquadrão de helicópteros em que eu servia, dei uma olhada para trás, de despedida, e naquele momento soube o que queria lá fora: ser fotógrafo de um grande jornal.

A primeira foto publicada foi em 1994, num pequeno jornal informativo de bodyboarding, cujo nome Marcelo não recorda. Como cobria campeonatos no Posto 9, em Ipanema — fotografando dentro d’água —, tinha um material bem consistente. Em seguida, passou a colaborar para duas revistas, Ride It — que existe até hoje — e Style Bodyboarding:
— As fotos de dentro da água sempre me abriram as portas, até que um dia uma delas foi publicada em página dupla na revista Domingo, do Jornal do Brasil.

Primeira página

A estréia em primeira página de jornal aconteceu por acaso. Certa vez, Marcelo fazia fotos para um anúncio numa praia do Recreio, na Zona Oeste do Rio. Quando saiu da água, deparou-se com um grave acidente e não pensou duas vezes: fez os cliques e enviou as fotos para O Dia.
— Na manhã seguinte, elas estavam na primeira página do jornal. Foi a realização de um sonho.

Para ter sucesso em seu trabalho, Marcelo afirma que “o fotógrafo não pode esperar que o assunto aconteça para depois dar o clique; ele tem que se antecipar, pensar antes e disparar”:
— É fundamental estar sempre à frente do acontecido. O fotógrafo precisa ser rápido e ter respeito por todos e frieza — dependendo do assunto que está sendo fotografado — e saber onde está pisando. Descer do carro e sair disparando pode ser fatal. Em alguns lugares, a máquina fotográfica tem o mesmo peso de uma arma.

Segundo Marcelo, situações de risco estão sempre presentes quando se é repórter-fotográfico numa cidade como o Rio de Janeiro:
— Tiroteios e balas perdidas fazem parte do dia-a-dia. Infelizmente, minhas fotos mais emocionantes foram, sem dúvida, de violência. Nesses momentos, você sente a adrenalina à flor da pele e a emoção rola solta. No Complexo do Alemão, já tive que me jogar no chão quando os traficantes atiravam na direção da imprensa. Nesse tipo de cobertura, o fotógrafo precisa entender que ele deve se tornar “invisível”. Para fazer um bom trabalho e com segurança, tem que passar despercebido.

Em sua primeira matéria sobre violência, o repórter-fotográfico conseguiu driblar uma situação adversa, quando casualmente deu de frente com três traficantes:
— Eles saíram de um buraco querendo saber o que eu estava fazendo ali. Tive a frieza de dizer que tinha acompanhado o pessoal da comunidade para registrar a situação em que ficaram os barracos depois de uma troca de tiros com a polícia e que ainda precisava tirar fotos de alguns projéteis. Sem ninguém esperar, um deles sacou duas pistolas e tirou as balas, colocando-as em sua mão para eu fotografar. Fiz as fotos e eles sumiram como chegaram, imperceptíveis.

Inspiração

Marcelo, que almeja ganhar um Prêmio Esso de Fotografia, inspira-se na destreza e na perícia de Luiz Morier e também no trabalho de Evandro Teixeira, seu colega de redação:
— Ele é meu guru, meu “avozão”, e tem um charme e uma vivacidade que deixam qualquer garoto no chinelo. Sou muito observador, analiso cada passo dos grandes fotógrafos e como eles agem. Assim, estou sempre aprendendo um pouco mais.

Segundo Marcelo, “o sentimento do fotógrafo é passado para a imagem usando a câmera como via expressa”:
— A fotografia, a arte e o charme estão por trás da lente. Quem faz foto é o fotógrafo, não a câmera. Esta é apenas um instrumento de captura de movimentos.

Aos candidatos a uma vaga no mercado fotojornalístico, ele avisa que é necessário gostar muito da profissão e ter certeza de que não é só aventura, além de dispor de muito ânimo e força de vontade:
— Há matérias calmas e entediantes e é preciso fazer tudo, para todas as editorias. Um repórter-fotográfico deve ser versátil!

Entre os próximos planos, o fotógrafo pretende organizar uma exposição e viajar para lugares insólitos e picos de surfe distantes para colher imagens diferentes. Também começa a direcionar seu trabalho para um dos principais problemas da humanidade: o aquecimento e o escurecimento global.
— Tento captar imagens que sirvam de alerta para o mal do século. As pessoas, inclusive a imprensa de um modo geral, estão dando pouquíssima importância ao assunto. Isso é grave. 
 


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