Artista visual lança livro sobre arte contemporânea e ditaduras na Guatemala


01/08/2023


Por João Batista de Abreu, conselheiro da ABI

“A memória guardará o que valer a pena. A memória sabe de mim mais que eu; e ela não perde o que merece ser salvo.”

A frase do escritor uruguaio Eduardo Galeano, inspirou a artista visual e professora da Escola de Belas Artes da UFRJ, Julie Brasil, a mergulhar em sua memória familiar e escrever Do Genocídio, da violência e da arte contemporânea em uma República das Bananas (editora Riobooks). O livro será lançado no dia 5 de agosto entre 14h e 18h, nos jardins do Museu da República, em frente à Galeria do Lago, no bairro do Catete, Rio de Janeiro.

Nascida na Guatemala, filha de pai guatemalteco e mãe brasileira, Julie veio refugiada com a família para o Brasil aos 10 anos de idade, ela guarda na memória uma história de medo e resistência. O pai, militar, não comungava das ideias predominantes na Guatemala da década de 1970. Perdeu a patente para preservar a vida. Dele e da família.

No Rio de Janeiro, Julie Brasil estudou em diversas escolas públicas, entre elas o Colégio Amaro Cavalcanti, no Largo do Machado, até ingressar no curso de Publicidade do Instituto de Arte e Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense. Como profissional de marketing trabalhou em várias empresas de porte, como a Gillette do Brasil e a Coca-Cola.

No livro, mais do que a história familiar, Julie procura fazer um resgate da relação entre a arte e os movimentos populares na América Latina, particularmente em seu país, berço da cultura maia, com 16 milhões de habitantes e 108 mil quilômetros quadrados.

– Meu livro propõe pensar a violência, o poder, as relações sociais e políticas através da produção artística no contexto pós-colonial, com ênfase no período do pós-guerra na Guatemala. Busquei pensar a arte como expressão cultural, que pode afetar os indivíduos ao promover maior compreensão das complexidades da natureza da violência, seus legados e a sua relação com o espectador”, explica a autora.

De acordo com Julie Brasil, a pesquisa é pontuada por reflexões, textos e obras de quatro artistas contemporâneos guatemaltecos: Mario Santizo, Jorge de León, Regina José Galindo e Anibal López, escolhidos por afinidade afetiva que a autora tem com sua arte. “O arco temporal da produção deles vai ao encontro da pesquisa. Tem a ver com a linguagem associada a um contexto urbano e político e à sensibilidade com a violência local e global”.

A professora enfatiza o poder da arte em nosso cotidiano. “Somos seres sociais e culturais. Não é possível transpor o saber da arte. Ela promove a socialização, o desenvolvimento emocional, transpõe as opacidades e organiza o entendimento de conteúdos simbólicos que complementam outros conhecimentos. Aprendemos juntos. Temos memórias vivas para intercambiar conhecimento, histórias, afetos e manifestações artísticas como instrumento para expressar a dor e o amor que vivemos”, observou Julie.

A literatura latina está presente por meio de escritores como Javier Payeras, Miguel Ángel Asturias e Gabriel Garcia Márquez. Há textos e imagens coletados em campo, páginas de diário, e fragmentos de entrevistas com artistas, intelectuais e familiares.

Um dos bloco do livro relembra os diversos genocídios ocorridos na região da Guatemala ao longo dos tempos. Mas a autora frisa que poderia ser em qualquer lugar chamado pejorativamente de República das Bananas”. “

– Falo a respeito da origem, colonização e reflexão sobre o outro e seu apagamento – como o etnocídio e o racismo. Resgato eventos históricos da América Latina, que são retomados na medida em que o texto avança.

O livro navega em companhia de pensadores como Bartolomé de las Casas, Carlos Skliar, Eduardo Galeano, Elena Casaús, Elton Hübner, Mario Morales e Tzvetan Todorov, Hanna Arendt, Nietzsche e Bourdieu, entre outros.

Navega, portanto, em boa companhia, diria Galeano, o uruguaio mais latino-americano de todas as letras. Qualquer que seja o ambiente, qualquer que seja o quadro político, Eduardo Galeano abre as veias e nos estimula a confiar em nossas ideias. “A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais a alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar”.

A edição especial com tiragem limitada pode ser encomendada no endereço www.riobooks.com.br.