ABI pede que PGR investigue responsáveis por violências contra jornalistas nos atos terroristas


O presidente da ABI, Octávio Costa, e os advogados Carlos Nicodemos e Andréa Pinto, da Nicodemos & Nederstigt Advogados Associados, protocolaram, na quinta-feira (12), uma Representação ao Procurador-Geral da República, Augusto Aras, por conta dos ataques terroristas ocorridos, em Brasília, no dia 8 de janeiro.

Depois de relacionar 15 (quinze) ataques aos jornalistas que trabalhavam durante o ato terrorista no Distrito Federal, a Representação requer a instauração de procedimento preliminar de apuração dos fatos desta Representação, bem como do competente inquérito civil público para a responsabilização de todos os patrocinadores dos atos terroristas do dia 08 de janeiro de 2023, que resultou entre outras violações, danos materiais e morais contra os profissionais de imprensa no Brasil.

Requer, ainda, que, ao final, seja promovida a competente Ação Civil Pública compelindo assim os perpetradores das violações a repararem os danos materiais e morais das vítimas, neste caso, profissionais de imprensa.

A ação da ABI foi citada na matéria do Jornal Nacional de segunda-Feira (16), no minuto 4:00

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Leia a íntegra da Representação:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR AUGUSTO ARAS PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA DO BRASIL.

A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA – ABI, pessoa jurídica inscrita no CNPJ/MF sob o no 34.058.917/0001-69, com domicílio na Rua Araújo Porto Alegre, 71, Centro, Rio de Janeiro, RJ, CEP 20030-012, através de seu advogado infra-assinado, com escritório na Avenida Beira Mar, no 406, Grupo no 1.205, Centro, Rio de Janeiro, RJ, CEP 20021-060, local onde recebe intimações,vem apresentar REPRESENTAÇÃO em face dos ataques antidemocráticos realizados em 08 de janeiro de 2023.

I– DA HISTÓRIA DA ABI

A Associação Brasileira de Imprensa (ABI), ilustre e conceituada entidade de atuação na defesa das liberdades de imprensa e expressão, do direito à informação e dos direitos humanos, fundada em 1908, exerce papel essencial na manutenção e efetivação da democracia, tendo por suas finalidades primordiais a defesa da ética, a promoção dos direitos humanos e das liberdades de informação e expressão, bem como a defesa da soberania nacional.

A Associação Brasileira de Imprensa, importante e dedicado defensor das liberdades constitucionais, preza pela manifestação de pensamento e de opinião. A ABI defende a democracia e tem por objeto não somente a proteção de pensamentos  ideias, mas também opiniões, crenças, realização de juízo de valor e críticas a agentes públicos, no sentido de garantir a real participação dos cidadãos na vida coletiva.

Portanto, em consonância com o disposto em seu Estatuto Social que dispõe que a ABI tem por finalidade maior a “defesa da ética, dos direitos humanos e da liberdade de informação e expressão”.

II- DA VIOLÊNCIA CONTRA OS JORNALISTAS

Como sabido por todos, no dia 8 de janeiro de 2023 tivemos o terrível ataque a Democrácia do nosso país. Este triste momento ficará marcado por toda a história do Brasil diante do ato golpista realizado por grupos extremistas. Infelizmente, em decorrência desse fato, além das destruições no Palácio do Planalto, tivemos também diversos ataques aos jornalistas que trabalhavam durante o ato terrorista no Distrito Federal. Conforme vamos relatar a seguir, diversos foram as agressões, senão vejamos:

1) Um repórter do jornal O Tempo foi agredido por criminosos que chegaram a apontar duas armas de fogo para ele, dentro do Congresso Nacional. O repórter relatou que procurou ajuda, mas os policiais militares se recusaram. Foi salvo por um técnico da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

2) Uma repórter da Rádio Jovem Pan foi xingada e seguida enquanto deixava a região da Esplanada dos Ministérios. Um homem tentou abrir a porta do carro da jornalista e apontou uma arma para ela.

3) Um repórter da TV Band teve o celular destruído enquanto filmava o ato. Ele disse que não foi agredido.

4) Uma repórter fotográfica do Metrópoles foi derrubada e espancada por 10homens. Ela teve o equipamento danificado.

5) Uma jornalista e analista política do portal Brasil 247 foi ameaçada, perseguida e agredida pelos terroristas. Ela teve de apagar os registros feitos no celular. Ao pedir auxílio da Polícia Militar, teve como resposta um fuzil apontado em sua direção. Relatou que só saiu sem ser linchada porque teve ajuda de uma pessoa que participava do ato.

6) Uma correspondente do jornal The Washington Post foi agredida com chutes e derrubada no chão. Ela teve o material de trabalho roubado. Um repórter do jornal O Globo que testemunhou a agressão recorreu à equipe do Ministério da Defesa, que ajudou a jornalista.

7) Um repórter fotográfico free-lancer teve o equipamento de trabalho e o telefone celular roubados pelos vândalos. Os agressores deram socos no rosto dele e quebraram os óculos do profissional.

8) Um repórter da Agência Anadolu, da Turquia, levou tapas no rosto enquanto cobria o vandalismo no Palácio do Planalto.

9) Um repórter da Agência France Press teve o equipamento (incluindo o celular) roubado e foi sido agredido.

10) Um repórter fotográfico da Folha teve o equipamento roubado.

11) Um repórter fotográfico da Agência Reuters teve o material de trabalho e o celular roubados.

12) Um repórter da Agência Brasil teve o crachá puxado pelas costas, enquanto registrava a destruição. Ele ficou com escoriações no pescoço.

13) Um repórter fotográfico do portal Poder360° foi agredido e tentaram levar o equipamento dele.

14) Um repórter fotográfico da Agência Brasil precisou sair da Esplanada dos Ministérios após vândalos ameaçarem empurrá-lo da marquise do Congresso Nacional.

15) Um jornalista do portal Congresso em Foco relatou que um agente da Polícia Rodoviária Federal impediu que ele ficasse em local seguro e o que o obrigou a ir para o meio dos terroristas. Ele também foi cercado por agentes da Força Nacional de Segurança Pública e só conseguiu ficar em segurança após ser resgatado por um integrante da assessoria do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Conforme podemos ver nos fatos supracitados, além das agressões físicas e verbais, ocorreram também agressões contra o patrimônio dos jornalistas que tiveram seus equipamentos roubados, como celulares e máquinas fotográficas. Mostrando que os agressores não só violaram o Estado Democrático de Direito, mas também outras
garantias constitucionais, como a liberdade de imprensa.

Sabemos que o direito a liberdade de imprensa é garantida pela Constituição Federal em seu art.220 “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”. Sendo que os veículos de comunicação exercem um papel de extrema importância para a sociedade.

É por meio da imprensa que a população tem a acesso a um informação verdadeira, sem qualquer tipo de censura ou restrição. Este direito liberdade de imprensa é um dos maiores pilares da sociedade, sendo um dos direitos e garantias fundamentais da nossa Carta Magna.

A necessidade do constitucionalismo em relação a este direito não é descabida, a sociedade reconhece que a atuação do jornalista é necessária para a construção de uma sociedade livre e justa. Podendo enfrentar qualquer ato para trazer a informação para todos, inclusive, atos antidemocráticos como o ocorrido em Brasília.

Desta forma, a liberdade de imprensa e expressão são valores preciosos para democrácia, devendo ser utilizada para evitar abusos do Poder Público e de extremistas, devendo ser respeitada e protegida por todos.

As agressões ocorridas são veemente repudiadas, devendo os responsáveis pelo ato ocorrido ressarcir os Jornalistas por todos os danos materias, além da responsabilidade criminal, diante de todas as lesões sofridas pelas vitímas.

Sobre o fato ocorrido, nos últimos dias foram publicadas diversas notícias que monstram as agressões aos jornalistas em frente ao Palácio do Planalto em Brasília, conforme podemos ver no link: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimasnoticias/2023/01/11/jornalistas-agredidos-cobertura-abraji.htm, discorrem sobre a atuação dos extremistas, aduzindo que ao menos 40 (quarenta) jornalistas sofreram os
ataques no domingo. Ainda, segundo a resportagem, tais atos não ocorreram somente em Brasília,
mas também em diversos estados. Tais agressões, conforme já relatado, foram feitas de forma física e verbal, com roubos de equipamentos e ameaças “Pelos relatos que recebemos no sindicato, os terroristas tiveram um padrão de abordagem com os jornalistas, tanto em termos de agressões verbais e físicas, pegando os equipamentos,
mandando apagar os arquivos, ou até mesmo roubá-los”
(https://www.correiobraziliense.com.br/cidades-df/2023/01/5065149-aumenta-onumero-de-jornalistas-agredidos-durante-atos-terroristas.html).

De acordo com a reportagem do Correio Brasiliense, diversas foram as agressões relatadas, como por exemplo, uma repórter fotográfica do site Metrópoles, que foi derrubada e espancada por 10 (dez) homens “Eu tentei sair um pouco, e aí foi a hora em que vieram ao meu redor, fizeram um cercadinho. Eu, instintivamente, me
agachei no chão e alguém me deu um murro na barriga, tiraram minha máquina do pescoço”. Tais atos violam os preceitos Constitucionais, ferindo amplamente os direitos a liberdade de imprensa e expressão. Além de adentrar o campo da Seara Criminal, diante das agressões físicas, psicológicas e de cunho patrimonial.

III- DA COMPETÊNCIA FEDERAL NA INVESTIGAÇÃO

Sabemos que os fatos ocorridos em 08 de janeiro de 2023 estão elencados nos crimes contra o Estado Democrático de Direito, isso significa dizer que para a aplicação das penas será levado em consideração o que aduz a Lei n.º 14.197/2021 que revogou a Lei n.º 7.170/83 que tratava dos chamados “Crimes contra a segurança Nacional”.
Por óbvio, esses crimes jamais poderão ser considerados comuns, visto que, além de atentarem contra o Estado Democrático de Direito, incorreram de forma conexa com diversos outros crimes, por exemplo, crimes contra a honra, integridade física, saúde e bem estar dos jornalistas, bem como crimes patrimoniais.

Assim sendo, todos os indivíduos que praticaram os tipos penais elencados pela Lei n.° 14.197/2021, cometeram um crime político, devendo portanto ter seu processo e julgamento baseado tanto na Constituição Federal, como também, na Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito.

Conforme aduz o art. 109, IV, da Carta Magna:
“ Aos juízes federais compete processar e julgar: os crimes políticos e asinfrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral”.

Neste diapasão, verificamos que de fato tais crimes são politícos, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal:
“Crimes políticos, para os fins do artigo 102, II, b, da Constituição Federal, são aqueles dirigidos, subjetiva e objetivamente, de modo imediato, contra o Estado como unidade orgânica das instituições políticas e sociais e, por conseguinte, definidos na Lei de Segurança Nacional, presentes as disposições gerais estabelecidas nos artigos
1º e 2º do mesmo diploma legal. 2. “Da conjugação dos arts. 1º e 2º da Lei nº 7.170/83, extraem-se dois requisitos, de ordem subjetiva e objetiva: i) motivação e objetivos políticos do agente, e ii) lesão real ou potencial à integridade territorial, à soberania nacional, ao regime representativo e democrático, à Federação ou ao Estado de
Direito. Precedentes” (RC 1472, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, Rev. Ministro Luiz Fux, unânime, j. 25/05/2016 v.g. RC n. 1473-SP, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJ 18.12.2017).

Tais crimes praticados contra os Jornalistas tiveram como motivação principal a política doentia dos extremistas e os atos terroristas realizados, restringindo a livre imprensa e expressão dos profissionais. Além de violar de forma direta e inequívoca o Estado Democrático de Direito, coibindo que as informações referentes ao ato antidemocrático chegassem até a população brasileira.

Ademais, conforme noticiado pela mídia, o Ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, informou que realizará a abertura de 3 (três) inquéritos para investigar os ataques ocorridos, tendo como objetivo principal descobrir quem são os indivíduos que financiaram os atos.

Portanto, os crimes elencados pela Lei n.º 14.197/21 exclusivamente de Competência Federal para o seu julgamento.

IV- DO DIREITO A LIBERDADE DE IMPRENSA E EXPRESSÃO NO PARÂMETRO INTERNACIONAL

Tanto a liberdade de imprensa quanto a de expressão são considerados como direitos fundamentais, garantidos no artigo 5.º da Carta Magna. Assim sendo, a liberdade de imprensa traduz o direito de informação do Cidadão para acesar diversas informações, dados, fonte verídicas de informação, sem a interferência Estatal.

Ademais, a liberdade de expressão está intrisecamente ligada ao direito de manifestação do pensamento, da liberdade do indivíduo de expressar suas opiniões, idéias e atividades intectuais e artísticas. Dessa forma, o Direito Internacional atua pela a liberdade, tanto do cidadão, como dos jornalistas na realização do seu trabalho.

A Declaração Universal dos Dieitos Humanos (DUDH) define em seu artigo XIX, esse direito como a liberdade de emitir opniões e ter acesso as informações, senão vejamos:

“Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão”.

Ademais, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, estabelece em seu art. XIX, o direito à liberdade de expressão:

Artigo 19 1. Ninguém poderá ser molestado por suas opiniões. 2. Toda pessoa terá direitoà liberdade de expressão; esse direito incluirá a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza, independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro meio de sua escolha.

E a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), estabelece de forma categorica em seu art. XIII a liberdade de pensamento e expressão:

1. Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua escolha.

Por óbvio, se faz certo destacar que tais direitos não são absolutos, devendo o seu exercício ser baseado em deveres e responsabilidade, podendo, inclusive, estar sujeito a certas restrições com base em critério de ponderação. No entanto, devemos nos atentar ao fato de que os jornalistas estavam presentes naquele momento para registrar o terrível ato realizado pelos terroristas, buscando levar imagens e notícias para a população brasileira diante do receio de uma possível ruptura do Estado Democrático de Direito, que felizmente não ocorreu.

Em suma, o Direito a liberdade de imprensa e expressão são difusos, não se restringem somente a um sujeito isoladamente, mas sim sobre toda a sociedade e todo o processo comunicativo, sendo essencial à democracia.

III- DOS PEDIDOS

Assim sendo, conforme todo o exposto, contando com a compreensão de V. Exa. sobre a grave a situação fática com nítida violação ao direito humanos à liberdade de expressão e de imprensa, além das violações de caráter físico, moral e material aos jornalistas e das irregularidades narradas e identificadas, REQUER:

1. Seja instaurado procedimento preliminar de apuração dos fatos desta Representação;

2. A partir da apuração preliminar, seja instaurado o competente inquérito civil público visando consolidar a investigação preliminar e estabelecer mecanismos de responsabilização de todos os patrocinadores dos atos
antdemocraticos do dia 08 de janeiro de 2023, que resultou entre outras violações, danos materiais e morais contra os profissionais de imprensa no Brasil.

3. Sejam adotadas, da conveniência e possibilidade, mecanismos de ajustamento de conduta dos investigados.

4. Ao final, não havendo medida resolutiva reparatória, seja promovida a competente Ação Civil Pública compelindo assim os perpetradores das violações a repararem os danos materiais e morais das vítimas, neste caso,
profissionais de imprensa.

E. ProvidênciasRio de Janeiro, 12 de janeiro de 2023.

OCTÁVIO COSTA
Presidente da ABI- Associação Brasileira de Imprensa

CARLOS NICODEMOS
OAB/RJ n.º 75.208

ANDRÉA PINTO
OAB/RJ n.º 209.582