29/05/2009
&bbsp; Sônia Toledo |
Teixeira Heizer, Murilo Melo Filho, Villas-Bôas, Eliomar Coelho, Maurício Azêdo e Afonso Arinos |
O jornalista Villas-Bôas Corrêa foi condecorado na noite desta quarta-feira, dia 27, com a Medalha Pedro Ernesto, em cerimônia realizada na Câmara Municipal do Rio, no Plenário. A iniciativa partiu do Vereador Eliomar Coelho (PSOL), que destacou a relevância da trajetória do homenageado para a história do jornalismo brasileiro.
Jornalistas, políticos e parentes de Villas-Bôas Corrêa participaram da homenagem, com destaque para a mulher Regina de Sá Corrêa, os filhos Marcos e Marcelo Sá Corrêa e a neta Joana Ramalho Ortigão Corrêa.
A mesa de honra, conduzida pelo Vereador Eliomar Coelho, foi formada pelo Presidente da ABI, Maurício Azêdo, o imortal e jornalista Murilo Melo Filho, o jornalista Teixeira Heizer, e o Embaixador e acadêmico Afonso Arinos.
Teixeira Heizer iniciou o discurso recordando os longos anos de amizade e de relacionamento profissional com Villas-Bôas Corrêa:
— Conheci Villas-Bôas em etapas distintas. Como grande repórter, que iniciou a carreira no jornal A Noite; como editorialista, função que sempre exerceu com brilho e ainda hoje no Jornal do Brasil nos brinda com suas colunas, que são verdadeiras aulas de jornalismo. Guardei outro momento muito importante, ocorrido nas proximidades das ruas São José e Quitanda, no Centro do Rio, onde funcionava a pequena sucursal do jornal O Estado de S.Paulo. A redação era uma bomba de nitroglicerina a ali estavam os jornalistas que, mesmo sem utilizar o recurso da pólvora, enfrentaram os momentos mais cruéis da história da imprensa e do País. Villas-Bôas era o principal redator, ao lado do Diretor Prudente de Moraes, neto. Foi a época de ouro do jornalismo e o momento áureo do Estadão no Rio de Janeiro. Ali, Villas-Bôas nos ensinou muito com seus textos brilhantes e equilibrados.
Teixeira Heizer sublinhou a atuação firme do jornalista no período da ditadura e o respeito que ele empunha aos militares:
— Villas-Bôas fazia duras críticas no espaço denominado “Destaques”. Lembro de um artigo que ele assinou a respeito do “solitário da Granja do Torto”, o general Médici. Foi um dos textos mais duros da ditadura. Nesta época, por generosidade dele, eu atuava como seu secretário. A partir daquele texto só restavam duas opções: o fim da sucursal ou o fim da ditadura. Os militares prenderam, torturaram e assassinaram jornalistas com a maior facilidade. Villas-Bôas enfrentou a todos com garra. É um exemplo de dignidade, honestidade e grandeza. Repetindo a velha expressão que aprendi com meu pai, digo que Villas-Bôas Corrêa é um homem de bem.
O Embaixador e acadêmico Afonso Arinos discursou em seguida, e destacou a sua convivência estreita com a imprensa e com o homenageado:
— Ao longo de toda a minha vida estive sempre próximo ao jornalismo. Meu pai dirigiu os jornais O Estado de Minas e Diário da Tarde, e fundou a Folha de Minas. Tenho laços familiares com Márcio Moreira Alves, um herói da batalha pelas liberdades, pela liberdade de imprensa. Minhas lembranças de Villas-Bôas Corrêa iniciam na década de 40, quando ele, muito jovem, iniciava a carreira cobrindo a Câmara dos Deputados. Recordo ainda dos nossos encontros em minha casa, em Copacabana. Eu costumava ir à redação do jornal tarde da noite para visitar Villas-Bôas Corrêa, Odylo Costa, filho, Heráclito Salles. Acompanhei a trajetória de Villas-Bôas na cobertura política que incluía nomes importantes como Carlos Castello Branco, Pompeu de Souza, Prudente de Moraes, neto, amigo fraterno de meu pai.
Afonso Arinos ressaltou também a relevância de Villas-Bôas Corrêa no cenário político nacional:
— Com a mudança da política para Brasília, Villas-Bôas, que já era indispensável, passou a ser uma espécie de bússola a nos conduzir ao melhor caminho, cobrindo os fatos com integridade, isenção, espírito público. Um exemplo que o Brasil merece ter e seguir na imprensa e também no Legislativo, no Executivo e no Judiciário. As denúncias que acompanhamos diariamente envolvendo os Três Poderes da República viraram regra, quando no passado eram apenas exceção. O Brasil precisa de homens como Villas-Bôas Corrêa para que o Direito volte a prevalecer na vida política brasileira.
Entusiasmo
Villas-Bôas sendo condecorado pela sua neta Joana, ao lado, a mulher Regina e Eliomar Coelho |
Em seguida, o jornalista e imortal Murilo Melo Filho falou sobre os momentos que marcaram o início da carreira de Villas-Bôas Corrêa:
— Ele começou como simples foca, mas logo em seguida era promovido a repórter político. E foi aí que nos conhecemos pessoalmente, quando testemunhamos a década de ouro da Democracia Brasileira, entre 1950 e 1960, antes da transferência da Capital para Brasília. Extasiados, assistimos nós dois, Villas e eu, a históricos debates, ali no Palácio Tiradentes, com suas galerias repletas de entusiasmados participantes, que acompanharam o permanente e diário exercício de grandes talentos oratórios, travados por cultos e eruditos parlamentares, entre os quais Café Filho, Octávio e João Mangabeira, Adauto Cardoso, Aliomar Baleeiro, Raul Pilla, Carlos Lacerda, Vieira de Meio, Bilac Pinto, Nelson Carneiro, Tancredo Neves, José Maria Alkmim, Ulysses Guimarães, Roberto Morena e Breno da Silveira.
O acadêmico citou grandes talentos que, ao lado do homenageado, construíram a história da imprensa no Brasil:
—Aqueles foram anos dourados, exercidos na imprensa por mestres, entre eles, Carlos Castello Branco, Heráclio Sales, Prudente de Morais, neto, Benedito Coutinho, Otacílio Lopes, Mário Martins, João Duarte, Filho, Pompeu de Souza, Joel Silveira, Osório Borba, Mauritônio Meira, Otto Lara Resende, Rubens Amaral, Evandro Carlos de Andrade, Murilo Marroquim, Octávio Malta, Paulo Costa Lima, Maria da Graça, Odylo Costa, filho e muitos outros, todos eles pioneiros do nosso Jornalismo. Somos os últimos remanescentes dessa reportagem política, num modelo criado então e que, ainda agora, 60 anos depois, provoca muitas saudades.
De acordo com Murilo Melo Filho, ao longo de seis décadas, fortes mudanças foram impostas à imprensa brasileira:
— Villas-Bôas e eu somos do tempo em que a Câmara era constituída de 200 deputados. E quase todos eles moravam no Rio, garantindo presença certa nos trabalhos dos Parlamentares, em vez da semana de três dias, como agora acontece. Não eram poucos os que preferiam morar em modestos hotéis do Flamengo, de Botafogo ou do Catete. E Villas reconhece que os tempos do Jornalismo atual são bem diferentes do Jornalismo daqueles anos. Quando ele entra numa redação, tem a impressão de estar entrando numa maternidade, com todo mundo voltado para a tela da sua televisão; ninguém conversa, porque, para falar com o colega bem ao lado, prefere mandar-lhe, pelo computador, um e-mail ou um site. Estamos homenageando um homem de bem, corajoso, coerente, honrado, digno, marido e pai exemplares, uma lição muito bonita e um exemplo de vida a serem imitados pelos seus contemporâneos.
Indignação
Dando seqüência à solenidade, o Presidente da ABI, Maurício Azêdo, saudou a todos os presentes e parabenizou o Vereador Eliomar Coelho pela iniciativa de homenagear Villas-Bôas Corrêa:
—Vossa Excelência está prestando uma homenagem, não só ao jornalista Villas-Bôas Corrêa, mas a todos nós que tivemos e temos o prazer de enriquecer o nosso conhecimento e o nosso arsenal de emoções ouvindo os depoimentos dos componentes desta mesa de honra.
Maurício enfatizou o talento jornalístico e a postura corajosa do homenageado na defesa da sociedade brasileira:
—Villas-Bôas Corrêa é um infatigável escritor de jornal a nos iluminar com textos que revelam o seu domínio da arte de escrever e, sobretudo, a sua indignação diante das mazelas que marcam a vida brasileira hoje. Ele imprime seu traço neste setor especial da nossa admiração que é o alto sentido ético no desempenho profissional, na compreensão da vida brasileira e na necessidade de incorporarmos aos nossos costumes e práticas políticas aqueles valores que atualmente são desdenhados com uma freqüência que nos causa estupor e vergonha. A Associação Brasileira de Imprensa, representada por mim e por Lênin Novaes, Primeiro-secretário do Conselho Deliberativo da Associação, aplaude a iniciativa de Vossa Excelência, Vereador Eliomar Coelho, que celebra o que Villas-Bôas Corrêa representa desde o inicio de sua atividade jornalística em A Notícia e de sua corajosa atuação na sucursal do Estado de S. Paulo. Villas-Bôas Corrêa é uma referência do jornalismo brasileiro e do comportamento ético na vida pessoal e profissional.
Agradecimento
Ao final dos depoimentos, o Vereador Eliomar Coelho enalteceu a figura de Villas-Bôas Corrêa e a relevância da solenidade:
—Esta é uma noite especial, e a Medalha Pedro Ernesto é uma forma de agradecimento que a Cidade do Rio de Janeiro, através de sua Câmara de Vereadores, presta às pessoas que contribuíram para tornar nossa cidade mais humana, digna e melhor de se viver. E o Villas fez muito por nós todos, cariocas e brasileiros. Com 60 anos de profissão, é o mais importante cronista da vida política brasileira. Aos 85 anos, é o último sobrevivente de uma geração que forjou o modelo de reportagem política que ainda hoje se pratica no jornalismo brasileiro. Estamos diante de um mestre que sempre praticou um jornalismo onde o espírito crítico e a capacidade de isenção são as molas mestras das análises imparciais carregadas de credibilidade que caracterizam sua vasta produção jornalística.
Teixeira Heizer, Murilo Melo Filho, Eliomar Coelho, Villas-Bôas e Maurício Azêdo |
Elogios
Após a cerimônia de condecoração, Villas-Bôas Corrêa, muito aplaudido, agradeceu a homenagem e as palavras dos companheiros que participaram da mesa. Em seguida, detalhou a sua trajetória profissional:
— Procurei meu sogro, Bitencourt de Sá, pois precisava conseguir mais um emprego para pagar a cesariana do meu segundo filho. Meu sogro me encaminhou ao jornalista Silva Ramos, do jornal A Notícia, que me deu a oportunidade. Seis meses depois, fui autor de um furo jornalístico, uma denúncia envolvendo autoridades políticas importantes do Governo do Presidente Dutra, em transação de venda de dormentes para a Central do Brasil. Fui alçado à reportagem política e, ao lado de Carlos Castello Branco, ajudei a forjar o modelo que está aí até hoje. Era o momento de ouro do jornalismo, impulsionado pelo fim da ditadura Vargas, a Constituinte de 46 e o grande interesse da sociedade pelo noticiário político e suas repercussões. É preciso entender um pouco deste tempo para fazer a crítica. Para vocês terem uma idéia, nós, repórteres, atravessávamos o Centro da cidade a pé. Ninguém tinha carro. Apenas um do grupo tinha, era um repórter do jornal A Noite. Mas o carro dele só andava para frente, não tinha marcha à ré (risos).
Segundo Villas-Bôas, a mudança da Capital para Brasília promoveu profundas transformações no País:
— O rumo da reportagem mudou e a realidade política também, até chegarmos aos dias atuais com o pior Congresso da história do país, cercado por escândalos e denúncias de toda a sorte. Contudo, sou grato por poder contar aqui um pouco da minha vida, na presença de toda a minha família e amigos, até mesmo para justificar a torrente de elogios que recebi de todos. Me senti um Deus. Se eu fosse menos humilde estaria aqui a operar milagres (risos). Agradeço ao Vereador Eliomar Coelho, aos amigos Teixeira Heizer, Murilo Melo Filho, Afonso Arinos, Maurício Azêdo e a todos os presentes.