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Mario Augusto Jakobskind – América Latina em pauta


02/10/2008


Bernardo Costa
17/10/2008

 Solange Noronha

Colunista dos noticiosos online Fazendo Media e Direto da Redação, do semanário uruguaio Brecha e do jornal Pátria Latina e integrante do Conselho Editorial do Brasil de Fato, além de membro da Comissão de Direitos Humanos e Liberdade de Expressão e do Conselho da ABI — à qual se filiou em 1972 —, Mario Augusto Jakobskind esteve vinculado ao jornalismo desde a adolescência.

Aos 16 anos, ainda um “foca”, começou a cobrir jogos de futebol. A atuação política provocou algumas interrupções na carreira, mas ele conseguiu se regularizar na profissão em 1969, com a entrada no Jornal do Brasil, onde trabalhou um ano no Departamento de Pesquisa. Paralelamente, como parte da juventude politizada que combatia a ditadura militar, atuava em jornais estudantis e de partidos políticos clandestinos, o que o pôs no alvo do regime e motivou o auto-exílio, em 72:
— A Polícia Federal foi me buscar em casa. Eu morava com meus pais e, por sorte, tinha saído na ocasião. Depois do incidente, decidi ir para a Itália e só voltei dois anos depois.

Atuando como jornalista na Europa, Mario ajudava a denunciar as atrocidades cometidas pela ditadura militar em matérias que assinava com o pseudônimo A.F. Apesar de já estar fora do Brasil, não queria chamar atenção e trabalhava na semiclandestinidade:
— Lembro como se fosse hoje. Fui à redação do Paese Sera, do Partido Comunista Italiano, para falar com o editor de Internacional. Expliquei minha situação a ele e deixei um texto sobre a prisão do mafioso italiano Tomaso Buscetta com gancho para a realidade brasileira, mostrando que havia tortura aqui. O editor pediu para eu voltar em 48 horas. Quando retornei, a recepção foi outra. Ele gostou do texto e comecei a colaborar com o jornal, sem usar meu nome. Também trabalhei em outros países europeus. Fiz até um programa sobre MPB na Rádio Varsóvia, polonesa, em 73. 

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Estação Kierunek do Warszawy

Alternativo

Quando retornou ao Brasil, Mario Augusto começou a colaborar com a imprensa alternativa, escrevendo regularmente para o jornal carioca de oposição Crítica, lançado no Governo Geisel e editado por Inácio Alencar. Um ano depois, entrou para a sucursal Rio da Folha de S.Paulo, onde trabalhou até 81:
— Lá eu cobria a área política e sindical e fazia matérias para a Geral, mas não podia participar de nenhuma cobertura oficial, presidencial, pois os órgãos de segurança do Governo recebiam a lista dos jornalistas que iam trabalhar; como eu já estava visado, não era escalado.

Nos anos 70, Mario colaborou também com O Pasquim, o Versus e, eventualmente, o Opinião:
— Neles eu encontrava a brecha para escrever certos artigos que não tinham espaço na Folha. Tive bom aprendizado no Pasquim, inclusive em termos de linguagem, pois podíamos fazer ironias etc. Eu não era da linha de frente, mas, quando ia lá entregar algum texto e descobria que haveria alguma entrevista, eu ficava. A primeira de que participei foi com o Lula, em 78, quando ele era líder sindical.

                                      Busdapeste, 1973

Mario Augusto considera igualmente importante a experiência no Versus, que era editado por Marcos Faerman e foi “o primeiro a tratar de temas relacionados à África e à América Latina por aqui”. Um momento marcante de sua passagem pelo veículo foi uma matéria com Glauber Rocha:
— Ele tinha dado uma entrevista ao Zuenir Ventura, para a Visão, em que classificara o General Golbery como “gênio da raça”, ao lado de Darcy Ribeiro, e setores da esquerda o estavam acusando de ser reacionário. Então, o Versus deu espaço para o Glauber falar sobre isso. Ele errou no tom, mas era o jeito dele. Glauber tinha um posicionamento que na época ninguém entendeu e acreditava na possibilidade de surgir na América Latina um militar com tendências reformistas, antiimperialistas, que merecia uma releitura em tempos de Hugo Chávez.

 Na redação da Manchete, em 1970

Já nos anos 80, o jornalista ingressou nos Cadernos do Terceiro Mundo, editados por Neiva Moreira e Beatriz Bissio. Pela revista, foi ao Uruguai cobrir a posse do Presidente Gregorio Álvarez, que prometia a abertura política, mas acabou sendo preso e expulso do país:
— O Uruguai vivia uma situação curiosa, com a saída de um civil ditador para entrar um militar que queria fazer a transição para a democracia. Cheguei na antevéspera da posse e comecei entrevistando lideranças políticas importantes para uma grande matéria. No dia D, bateram no meu quarto de hotel e me levaram preso e, depois de seis horas, me fizeram assinar um documento e me mandaram pro Brasil no primeiro avião. Em 2 de setembro de 81, saiu no Estadão a Manchete: “Jornalista acusado de espionagem é expulso do Uruguai”. Após 15 anos, com o hábeas-data, tive acesso às informações sobre mim arquivadas nos nossos antigos órgãos de inteligência e percebi que elas foram a base das perguntas que me fizeram lá, o que demonstra que as ditaduras atuavam juntas.

Viagem

A experiência não o fez desistir de dedicar um ano a percorrer países latinos, o que possibilitou a produção de dois livros:
— Eu era assessor de imprensa da Secretaria de Obras do Governo Brizola, quando fui contratado por uma agência de notícias sueca, criada por exilados políticos de origem latina, para fazer esta viagem. Passei um ano percorrendo a região e estudando sua situação política. A experiência resultou nos livros “América Latina — histórias de dominação e libertação”, editado pela Papirus em 85, e “Apesar do bloqueio, um repórter carioca em Cuba”, que saiu pela Ato Editorial em 86. Para a ilha, retornei em 88, quando trabalhei um ano na revista cubana de política internacional Prisma. No ano seguinte, já no Brasil, ingressei na Tribuna da Imprensa, onde fui editor de Internacional até 2004.

 Varsóvia, 1973

Para Mario, nos últimos 30 anos o relacionamento entre os países da América Latina tem avançado diplomaticamente, principalmente com a criação da Unasul (União das Nações Sul-Americanas):
— Além disso, hoje interrompemos qualquer projeto imperialista no território, dando o recado em diversos tons. O Chávez é mais contundente. Recentemente, quando o Embaixador norte-americano Philip Goldberg, estimulador do separatismo na Bolívia, foi expulso pelo Evo Morales, Lula não se opôs à decisão do governo boliviano. No Paraguai, a direita já queria dar o golpe contra Fernando Lugo, mas a Unasul se mobilizou e impediu. Sem dúvida são avanços. Falta aprofundar, principalmente, reformas sociais que possibilitem uma distribuição de renda mais igualitária.

A grande imprensa brasileira, em sua opinião, ainda olha para a América Latina com preconceito, principalmente no que diz respeito aos movimentos sociais:
— A verdade que eles passam são aquelas definidas pela Sociedade Interamericana de Imprensa, repetidas por todos os jornais. A cobertura é muito deficiente e cabe aos jornais alternativos fazer o devido contraponto.

A partir desse olhar crítico para a imprensa brasileira, o jornalista escreveu o livro “América que não está na mídia”, cujo segundo volume sairá em breve:
— O livro reúne uma série de 52 reflexões atemporais sobre as mais variadas questões relacionadas à região e sua cobertura da mídia. O primeiro saiu pela Adia em 2006 e este segundo, editado pela Europa, pretendo lançar no dia das eleições norte-americanas, 4 de novembro.

Cinema

                   Letícia Spiller e Mario Augusto

Nos últimos tempos, Mario também tem se voltado para o cinema, em parceria com o diretor Antonio Castigliola, “antigo amigo da Folha”. “Cuba, um sonho possível?” já está pronto e conta com a participação dos atores Chico Diaz, Letícia Spiller, Gerald Thomas, Dinho Valadares, Aline Bourseau e Leandro Meira. O próximo filme, ainda um projeto, será um documentário sobre o jornalista Fausto Wolff, morto recentemente:
— “Cuba” conta a história de um menino nordestino que sonha ser alguém na vida e vai parar naquele país. O filme aborda o maniqueísmo sobre os acertos e desacertos da revolução cubana, em meio às novas reformas que estão sendo empreendidas na ilha, a partir do olhar do jovem, que confronta a sua realidade com o que um repórter lhe apresenta de Cuba. Para “Fausto Wolff: um oásis na imprensa diária brasileira”, eu e o Castigliola já filmamos o velório dele e agora pretendemos reunir amigos como Chico Caruso, Ziraldo e Jaguar. Resgatei também uma entrevista que fiz com o Fausto para a TV Comunitária do Rio de Janeiro, em que ele falava de sua experiência como correspondente na guerra do Vietnã.