20/06/2025
Nós, trabalhadores e trabalhadoras sociais do campo da cultura e da memória, do campo dos museus, da museologia e do patrimônio, queremos expressar publicamente a nossa solidariedade ao povo palestino, vítima de um dos maiores massacres já visto na história da humanidade. Entendemos que a museologia deve servir à VIDA e, por isso, nos manifestamos contra esse genocídio em curso.
Um genocídio que visa destruir o povo originário da Palestina para atender às aspirações expansionistas de um Estado colonial, criado artificialmente pelas grandes potências mundiais da Europa e pelos EUA, sob a ratificação e a organização da ONU, em 1948.
Um genocídio condenado pelo Tribunal Penal Internacional, principal órgão judiciário das Nações Unidas – ONU, organismo transnacional que teve mais de 200 dos seus trabalhadores humanitários mortos na Palestina, pelo exército israelense.
Um genocídio declarado e exposto orgulhosamente por diversos agentes estatais do governo israelense, por colonos civis e militares, nas suas próprias redes sociais e nas suas declarações públicas.
Um genocídio que repete métodos já vistos na História da humanidade, com o claro objetivo de exterminar o povo palestino, com um sistema de apartheid imposto há quase 80 anos, campos de concentração, deslocamentos forçados, sequestros, torturas e abusos sexuais. Métodos que destroem sistematicamente todas as condições de vida do país e que utilizam a fome como um instrumento de guerra, com números catastróficos de crianças — e das suas famílias — martirizadas pela doença da fome.
Um genocídio que mata uma criança a cada 10 minutos em Gaza.
Um genocídio transmitido diariamente em nossas telas, há quase 20 meses, a destruir qualquer forma de vida no território palestino, seja de pessoas, animais, seja até mesmo de árvores e plantas, como as oliveiras, que registram a presença secular de um povo no chão da Palestina.
A Palestina é hoje uma grande cova a céu aberto, sem hospitais, escolas, universidades, bibliotecas, museus e patrimônios materiais histórico-culturais. Tudo isso foi destruído pelo Estado sionista, porém, a memória coletiva palestina mostra-se inquebrantável, apoiada no conceito central palestino do ‹‹sumud››, uma forma ativa de resistência não violenta, com permanência na terra, preservação da cultura e da vida comunitária.
É com esse povo com o seu território ocupado, com suas formas de organização política não devidamente reconhecidas em termos da formação de seu Estado soberano; sem forças militares, sem sistema de defesa antiaérea e, agora, absolutamente sem condições mínimas de subsistência; é com esse povo que o Estado de Israel diz travar uma guerra. Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, desde outubro de 2023 até abril de 2025, mais de 55.000 pessoas foram assassinadas e 104.000 foram feridas pelos militares e colonos israelenses, sem incluir as mortes por doenças e enfermidades e as pessoas soterradas sob os escombros dos bombardeios. Dessas mortes em Gaza por Israel, a ONU aponta que quase 70% são de mulheres e crianças.
Mesmo diante de fatos irrefutáveis, documentados por organismos internacionais, os meios de comunicação sionistas ou desacreditam esses dados ou os colocam sob o manto de um silêncio imposto pelas forças políticas e econômicas dos países ocidentais, principalmente da Europa e dos EUA, mas também de governantes e empresários árabes coniventes. Um silêncio criminoso que desumaniza o povo palestino, instrumentaliza a memória do Holocausto para blindar Israel dos seus crimes e para institucionalizar a impunidade. Ao mesmo tempo, Israel promove um ‹‹apagão da mídia››, impedindo a entrada da mídia internacional e silenciando cerca de 200 profissionais palestinos, assassinados seletivamente em Gaza.
Como trabalhadores e trabalhadoras sociais, não podemos desviar o olhar de Gaza, não podemos silenciar ante mais uma barbárie da história humana neste planeta. A nossa opção é por uma utopia dinâmica, por um sonhar como “ato político necessário” (Paulo Freire), mas também por um estar no mundo dentro da história, a rejeitar o imobilismo e a mera adaptação a uma única maneira de pensar e estar no mundo.
Nossa museologia é pela VIDA e, por isso, rejeitamos humanismos seletivos, guerras, terrorismos, mas também nos indignamos contra o silêncio covarde dos que desviam o olhar e continuam a distrair-se com os seus objetos extraordinários.
Como pensadores da museologia, defendemos a ideia de que o museu não deve ser visto de forma isolada, como um meteoro que se desprendeu de uma galáxia desconhecida. Esse olhar sistêmico para o museu nos faz resistir à doce ilusão de que um silêncio obsequioso nos fará passar incólumes ao que está acontecendo no Oriente Médio.
É vital entendermos que temos à nossa frente a versão 2025 da velha luta de classes. É fundamental essa compreensão, porque disso depende a nossa própria sobrevivência. Estamos assistindo a um experimento perigoso promovido por forças ricas e poderosas do planeta, que não irão relutar em escalar essa violência globalmente e colocar em jogo a existência da nossa espécie, para defender os seus interesses.
Nesse consórcio de senhores das guerras, cabe a Israel atacar de forma preemptiva os países eleitos como seus inimigos, como faz agora com o Irã. Se der ‹‹tudo certo››… se os EUA, Israel e a União Europeia derem a solução final para o povo palestino; se Gaza for transformada num belo balneário turístico, já não haverá mais impedimento para a ‹‹palestinização›› de qualquer lugar do planeta.
Por isso, nós, trabalhadores e trabalhadoras sociais da museologia e dos museus, da cultura e do patrimônio, não vamos nos contentar em proteger e promover os despojos e as ruínas dos erros contínuos dos poderosos. Nos negamos a utilizar os nossos conhecimentos para legitimar o acúmulo dessas ruínas em nossos museus. Nos recusamos a lustrar os troféus das barbáries dos vencedores na história oficial.
Nossas ideias e práticas são frontais às ruínas produzidas por um sistema político-econômico que, desde o seu nascedouro, acumulou guerras, genocídios de povos originários, ocupações e colonialismos, devastações de florestas e destruições de ecossistemas, tráficos humanos e escravidão.
Se a história é obra das sociedades humanas — história que é mudança na sociedade, continuamente —, então podemos, devemos e queremos agir no presente para transformar os nossos museus em agentes da derrocada de um sistema destrutivo da própria vida no planeta e, ao mesmo tempo, para torná-los espaços de reflexão e de organização para uma revolução paradigmática nas políticas, nas instituições e na vida coletiva.
Por uma Palestina livre e soberana!
Pela punição aos crimes de guerra de Israel e EUA!
Pela VIDA!
MINA – Museologías Insurgentes en Nuestra América
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