19/12/2024
Por Vânia Penha-Lopes, socióloga e integra a diretoria de Igualdade Étnico-Racial da ABI
Que a Polícia Militar tem uma reputação de truculência não é de hoje. Recentemente, esse rótulo foi exacerbado pela Polícia Militar de São Paulo. Segundo dados publicados pelo Ministério Público, ela eliminou 74% mais pessoas em 2024 do que no ano anterior e o ano ainda não acabou.
Entre as 712 pessoas mortas neste ano encontra-se Gabriel Renan da Silva Soares. Acusado de tentativa de furto em uma loja, ele foi morto em novembro com mais de dez tiros pelas costas por um PM, embora estivesse desarmado. Outras vítimas no mês de novembro foram um menino de quatro anos, Ryan da Silva Andrada Santos, e dois adolescentes, baleados durante uma troca de tiros numa abordagem policial. O menino e um dos adolescentes morreram.
Neste mês de dezembro, imagens de vídeo captaram um policial atirando tranquilamente um homem de uma ponte. O policial já havia matado um homem com 12 tiros no ano passado, mas o caso foi arquivado por ter sido considerado “legítima defesa”. Desta vez, o policial e 12 de seus colegas foram afastados do serviço.
Como resultado dessas ocorrências, Tarcísio de Freitas, o governador de São Paulo, se pronunciou. Ele fez uma mea culpa, admitindo que “erramos no discurso” ao defender o uso da força policial. Porém, Adilson Paes de Souza, pesquisador e coronel aposentado da PM, alega que a mudança de postura do governador é uma questão de “sobrevivência política”, pois, segundo ele, a aceitação das táticas da polícia agrada independente da vertente política.
O comportamento desses policiais tem que ser visto dentro do contexto de uma sociedade que se apresenta como “cordial”, mas que é extremamente violenta. O fato de policiais não se importarem em ser filmados, por exemplo, denota a confiança em terem respaldo da corporação em geral e quiçá de outras camadas da sociedade.
Sabe-se que a segurança pública é uma das maiores preocupações dos brasileiros e que o adágio “Bandido bom é bandido morto” pode tanto ser proferido num momento de desespero, como pode ser o carro-chefe de uma política de estado. A questão é que, no Brasil, o rótulo de “bandido” não raro perpassa raça e classe.
A polícia – seja civil ou militar – é um serviço público de defesa da população. Portanto, não se trata de se privar a polícia de verba, como alguns vêm sugerindo ultimamente, mas sim de se modificar a formação e o treinamento de seu contingente a fim de que enxerguem a população de modo menos preconceituoso e que use de ponderação em vez de comumente se comportarem de maneira extrema.