18/10/2006
José Reinaldo Marques |
Gilberto Gil e Muniz Sodré |
“A Biblioteca Nacional terá uma supersegurança”, avisou o professor e jornalista Muniz Sodré na véspera de ser empossado como Presidente da Fundação Biblioteca Nacional (FBN) pelo Ministro da Cultura, Gilberto Gil, no lugar do bibliófilo Pedro Corrêa do Lago. Este vinha enfrentando problemas como o descontentamento dos funcionários e roubos de obras raras do acervo da biblioteca, que continuam sendo investigados por uma comissão formada por representantes do Ministério da Cultura, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal.
Conforme havia prometido, tão logo assumiu a Presidência da FBN, Muniz Sodré instalou um moderno sistema de segurança no imóvel que abriga o acervo da Biblioteca, na Avenida Rio Branco, Centro do Rio. O equipamento (no valor de R$ 1,7 milhão) foi conseguido com o patrocínio da Petrobras e sua instalação completa está prevista para o fim do mês, com a implementação dos crachás eletrônicos de identificação para funcionários e visitantes.
Muniz Sodré lembra que a preservação do acervo da FBN era uma das suas metas principais. Os problemas maiores eram a deterioração e o roubo do material — no ano passado, por exemplo, antes de sua gestão, uma quadrilha profissional levou mil itens de uma coleção rara, avaliados em quase R$ 15 milhões:
— Com a instalação do sistema de segurança, que levou quase seis meses para ser implantado, esse tipo de crime dificilmente será novamente praticado.
Manuseio
De acordo com o Presidente da FBN, os modernos sensores e câmeras de vigilância são ultramodernos:
— A partir de sua implantação, podemos monitorar se a pessoa está carregando algum volume debaixo da roupa e ver até mesmo as obras que estão sendo manuseadas pelo usuário. Ou seja, fica impossível alguém arrancar páginas dos livros, como acontecia até recentemente. Esta era uma das formas mais comuns de roubo na Biblioteca Nacional.
Em 2005, equipamentos no setor de restauração de obras raras também haviam sido depredados. Esta questão foi resolvida ainda no ano passado, em dezembro, quando foram comprados novos aparelhos e restaurados os antigos, postos na FBN em sistema de comodato com a Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos:
— Hoje, temos aqui o melhor e o mais sofisticado laboratório de restauração do País. Aproveitei para implementar a digitalização, permitindo ao usuário visitar o site da FBN e encontrar obras clássicas inteiras, de autores como Machado de Assis e Lima Barreto, que podem ser baixadas da internet.
O melhor, segundo Muniz Sodré, é que a digitalização não custou um centavo aos cofres públicos, pois foi desenvolvida pelos funcionários da área de informática, que já vinham trabalhando no projeto:
— Nosso único gasto nesse processo é com a manutenção. Uma das características da minha gestão tem sido a austeridade na administração de recursos, até porque a BN não tem muito dinheiro.
Modernização
Criar e implantar 404 novas bibliotecas públicas no País — uma das tarefas da FBN — estava na agenda quando Muniz Sodré assumiu a Presidência do órgão, em 1º de dezembro de 2005:
— Havia um déficit dessas instalações, que já deveriam ter sido criadas desde o Governo passado. Assim que assumi o cargo, recebi uma verba de R$ 28 milhões, captada pelo Ministério da Cultura por meio de uma emenda do Senador Tião Vianna, do Acre. Desse total, R$ 23 milhões foram aplicados na criação de novas bibliotecas e o restante, na modernização das já existentes. Mesmo assim, ainda há um déficit de 700 bibliotecas que não poderá ser resolvido na minha gestão.
Muniz Sodré conta que os livros enviados para as bibliotecas públicas foram catalogados com o uso de um software, o Bibilivro, desenvolvido pela Coppe e doado à FBN pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Diz também que vem dando atenção ao desenvolvimento de projetos culturais apresentados no auditório da Sala Machado de Assis, que funciona no andar térreo da BN. O “Som do livro” fez um painel da música brasileira clássica e popular, com a exposição das 220 mil peças (entre partituras, CDs e DVDs) do acervo da FBN. No “Leituras contemporâneas”, das “Quartas às quatro” — com transmissão em tempo real no endereço www.institutoembratel.org.br —, economistas e cientistas políticos debatem temas atuais. E, mensalmente, o “Café intercom” promove discussões sobre o setor de Comunicação Social, com a participação de jornalistas e intelectuais dos grandes centros acadêmicos do País.
Além disso, a FBN vem participando da elaboração do Plano Nacional do Livro e da Leitura, juntamente com os Ministérios ligados à área:
— Que eu saiba, esta é a primeira vez que o MinC e o MEC trabalham juntos num plano para fazer da leitura uma política de Estado, envolvendo editores e professores primários, que serão treinados como mediadores para funcionar como estimuladores de leitura nas escolas. Enquanto isso, reativamos o Pro-Ler, projeto para estimular a leitura realizado no País inteiro, com agentes voluntários, e que aqui no Rio funciona na Casa da Leitura (Rua Pereira da Silva, 28 — Laranjeiras).
A FBN viu também acontecer a reativação do projeto Câmara Brasileira do Livro e da Leitura, que se reúne todo mês e é formada por 25 representantes de bibliotecas e editoras de todo o Brasil, entre eles Paulo Rocco, Presidente da Associação Nacional de Escritores, e Oswaldo Siciliano, Presidente da Câmara Brasileira do Livro.
Novas instalações
Projetos à parte, Muniz Sodré com a falta de espaço para armazenar o material da FBN:
— Esperava resolver isso com imóveis do Governo no Centro da cidade, mas os prédios que vi não têm condições para guardar livros. Os jornais que recebemos diariamente de todo o País são microfilmados e enviados para um anexo na zona portuária, que precisa de obras de ampliação. Peças raras do acervo não são mandadas para lá, pois isso demandaria uma reforma muito mais cara que, no momento, não temos condições de executar.
Preocupado com a deterioração de alguns livros, provocada por problemas técnicos de preservação, Muniz Sodré já solicitou auxílio financeiro de R$ 500 mil ao BNDES:
— Aproveitei também para pedir outra verba, de R$ 1 milhão, para investir na restauração e contenção do reboco da fachada do prédio da BN, que está caindo.
Sem tensão
Para Muniz Sodré, a conquista mais importante de sua administração foi acabar com o clima de tensão que encontrou ao chegar à FBN:
— Sinto que o que me deu mais crédito com o MinC, os servidores e usuários da Biblioteca foi ter acalmado a Casa. Quando assumi a Presidência, a FBN estava aparecendo na mídia com manchetes negativas. Consegui trazer de novo a paz para o nosso ambiente. Sou suspeito para falar de mim mesmo, mas acho que fiquei popular aqui porque, primeiro, cumprimento todo mundo e, segundo, porque sou preto. Ou seja, dessa vez os funcionários, principalmente os mais humildes, estão dizendo: “Agora temos um Presidente que é a cara da gente”.