12/01/2023
Com informações do JOTA
Aos 84 anos de idade, o jornalista Luiz Orlando Carneiro, decano da cobertura do Supremo Tribunal Federal (STF), tinha mais energia — e ansiedade para ver suas reportagens publicadas com destaque — do que muitos repórteres em início de carreira. Quando o noticiário estava mais movimentado, costumava entregar 4 ou 5 matérias no mesmo dia. E se o editor demorasse a publicá-las, poderia ter certeza de que o telefone em breve tocaria com um pedido, sempre muito educado, para que a reportagem dele fosse priorizada.
Luiz Orlando Carneiro, chamado carinhosamente pelos colegas de Luiz O., exerceu o ofício com dedicação religiosa. Só se aposentou há duas semanas em razão de problemas de saúde e pediu que não se comentasse nada sobre sua saída (recusava qualquer comentário sobre uma homenagem). Era apaixonado pela profissão — paixão em patamar inferior apenas à por sua mulher, Branca, falecida em 2016, e talvez equiparável ao ritmo que explorava em suas colunas jornalísticas: o jazz.
A relação de Carneiro com o jornalismo se iniciou em outubro de 1958, quando ele começou a trabalhar como repórter-estagiário no Jornal do Brasil, periódico mais importante do país na época.
Como falava inglês e francês, foi escalado para fazer a cobertura do aeroporto do Galeão, onde desembarcavam diversas autoridades na até então capital do país. De agosto de agosto de 1959 a 1963, foi responsável pela cobertura do Itamaraty, período em que fez diversas viagens internacionais. Depois, assumiu a subchefia de reportagem do jornal.
Em 1965, participou da fundação do Clube de Jazz e Bossa, junto com Jorge Guinle, Ricardo Cravo Albin, Ary Vasconcelos, Sérgio Porto, Vinicius de Moraes e Tom Jobim. O clube de Jazz e Bossa organizou jam sessions semanais, além de homenagens a músicos importante, até 1967.
No jornalismo, Luiz O fez carreira no Jornal do Brasil. Foi chefe de reportagem (1964-1969), editor de notícias (1969-1974), chefe da redação (1974-1979), chefe da sucursal em Brasília e diretor-regional (1979-1992).
Luiz O. contava que às vésperas da eleição de Tancredo Neves, o jornal organizou um jantar para o presidente eleito em sua casa, onde compareceram mais de 300 pessoas. Em cargos de chefia ou na reportagem, Carneiro nunca deixou de escrever colunas e textos sobre jazz.
Em 1992, ainda no Jornal do Brasil, decidiu voltar a ser repórter para cobrir o STF, já que havia percebido que com a Constituição de 1988, o tribunal se tornaria um ator muito mais relevante na República.
Ninguém no país cobriu STF por tanto tempo quanto Luiz Orlando Carneiro. Quando completou 50 anos de jornalismo, em outubro de 2008, o ministro Gilmar Mendes, então presidente do STF, foi pessoalmente ao comitê de imprensa para cumprimentá-lo e condecorá-lo com uma medalha de ouro que a Corte costuma entregar apenas a autoridades estrangeiras que visitam a Casa. “Luiz Orlando é um exemplo para todos nós”, afirmou Mendes na ocasião.
Dez anos depois, Luiz O. foi novamente homenageado pelos ministros do STF, que cumprimentaram-no pelos 80 anos de idade e 60 anos de jornalismo. O então presidente da Corte, Antonio Dias Toffoli, e os ministros Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes foram até o comitê de imprensa cumprimentar o jornalista. “É um exemplo para todos nós. É uma alegria estar aqui nos seus 80 anos”, disse Toffoli na ocasião.
Luiz Orlando Carneiro foi o primeiro repórter a ser contratado pelo JOTA, no ano da fundação da empresa, em 2014. Trabalhou com afinco, sempre buscando notícias exclusivas, principalmente relacionadas a ações constitucionais, até os últimos dias de dezembro de 2022. No período, publicou 3.332 textos, uma média de 416 a cada ano, ou 1,65 texto por dia útil. Quod abundat non nocet [o que abunda não prejudica], costumava repetir e citar que o brocardo era sempre usado por seu pai, que foi desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Luiz O. era presença diária no comitê de imprensa do STF, mesmo que pudesse fazer sua cobertura de casa. Dizia, citando Jorge Luis Borges, que a rotina de trabalho lhe dava a ideia de eternidade.
O pai de Luiz O. desejava que o filho seguisse a carreira jurídica. Em 1963, Carneiro formou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade do Estado da Guanabara — que anos mais tarde se tornou a UERJ –, mas o jornalismo já o havia conquistado.
Além de milhares de reportagens, Luiz Orlando Carneiro é autor dos livros Jazz: Uma Introdução (1982); Obras-Primas do Jazz (1986); Elas Também Tocam Jazz (1989); A Nova Constituição para Crianças (1989), em coautoria com Inês Carneiro Cavalcanti; e Entrevistas Imaginárias (2017). Também é o autor do Guia de Jazz em CD (2000) e foi ele quem escreveu os verbetes sobre jazz das enciclopédias Delta-Larrousse e Mirador.
Luiz O deixa as filhas Lúcia e Teresa e o filho Paulo.
A ABI envia seu abraço solidário a todos os familiares – especialmente ao seu primo, nosso conselheiro consultivo José Trajano, amigos e colegas de trabalho. “Perdemos um grande jornalista e um amigo muito querido por todos que tiveram o privilégio de conviver com ele”, disse o presidente da ABI, Octávio Costa.
“A morte de quem me fez jornalista! O meu querido primo Luiz Orlando Carneiro, decano de cobertura do STF e um dos maiores especialistas em jazz no país, morreu hoje em Brasília, aos 84 anos. Tristeza imensa!”, escreveu Trajano no seu blog Ultrajano.
A reação no meio jurídico