10/01/2025
Michel Silva, em Fala Roça (*)
O anúncio de Mark Zuckerberg sobre as mudanças no Facebook e no Instagram joga um balde de água fria em quem luta diariamente por informação de qualidade, especialmente no jornalismo hiperlocal. Para territórios vulneráveis como as favelas e periferias, onde o acesso à educação midiática já é precário, a decisão de encerrar o programa de checagem de fatos e relaxar as políticas de moderação tem um impacto potencialmente devastador.
As redes sociais, gostemos ou não, são a principal fonte de informação para milhões de brasileiros. Em muitos territórios, moradores criam e se informam por grupos no WhatsApp e Facebook, principalmente. E é nesse contexto que o jornalismo local, feito nas favelas e periferias e para as favelas e periferias, tenta resistir. Em territórios onde a mídia tradicional muitas vezes só aparece para mostrar tragédia, iniciativas comunitárias trabalham com o que têm para informar sobre o que realmente importa: os problemas, as soluções do dia a dia, as conquistas locais e as lutas por direitos básicos, como saneamento e saúde.
Agora, imagine a seguinte cena: um território inteiro é bombardeado por fake news dizendo que vacinas são perigosas ou que um serviço essencial será suspenso. Antes, iniciativas de checagem de fatos ajudavam a corrigir essas mentiras. Agora, com a substituição dos fact-checkers por “notas de comunidade” — algo que mal sabemos como vai funcionar —, quem vai garantir que essas informações sejam contestadas a tempo?
Um exemplo claro desse impacto aconteceu em 2021, quando mais de 4 mil pessoas na Rocinha não tomaram a segunda dose da vacina contra a covid-19. Foi necessária uma reportagem para resgatar a história dos mutirões de vacinação no território e alertar sobre os cuidados contra a covid-19, combatendo as fake news sobre a eficácia das vacinas. Sem esforços como esse, muitas pessoas poderiam ter permanecido desinformadas, com consequências graves para a saúde coletiva.
A justificativa de Zuckerberg para as mudanças é reduzir a censura e voltar às “raízes da liberdade de expressão”. Mas, na prática, isso parece mais uma estratégia para agradar certos grupos políticos do que uma real preocupação com a pluralidade de vozes. A liberdade de expressão é um direito fundamental, claro. Mas ela precisa vir acompanhada de responsabilidade. E desinformação não é “expressão livre”; é manipulação.
(*) cria da Rocinha, Diretor Institucional e de Jornalismo do Fala Roça, formado em Jornalismo pela PUC-Rio e pós-graduado em Jornalismo Investigativo pelo IDP