Resistência no teatro
Casa Grande


24/01/2020


Maria Luiza Franco Busse (*) 

Nesta segunda-feira, dia 27 de janeiro, artistas, políticos, movimentos sociais e cidadãos e cidadãs envolvidos na luta contra o abuso de autoridade, estarão no Teatro Casa Grande para o Abraço da Resistência. Do ato, que terá início às 17:30 e término às 19:30, também sairá o abaixo-assinado que será entregue ao governador Wilson Witzel na audiência que os gestores do Casa Grande estão solicitando junto à autoridade pública.

O teatro Casa Grande, inaugurado em 1966, se transformou em mais do que uma casa de espetáculos. Foi um centro de debates democráticos. No seu palco, por exemplo, em 1978, o recém surgido líder sindical Luiz Inácio da Silva se apresentou ao público pela primeira vez no Rio de Janeiro. Falou na noite dedicada ao Sindicalismo, um dos temas incluídos nos Debates do Casa Grande. O teatro ainda abrigou, em 1979, algumas das reuniões do que viria a se transformar em Comitê Brasileiro da Anistia.

Foi palco também do anúncio do fim da censura no Brasil, em um encontro que reuniu mais de 800 pessoas, na segunda-feira, 29 de julho de 1985. Nesse encontro uma comissão de intelectuais, presidida por Pompeu de Souza, da ABI, apresentou ao governo um documento reivindicando o fim da censura em letras de músicas, teatros, cinemas e peças de propaganda. De posse do documento, o então ministro da Justiça do governo de José Sarney, Fernando Lyra, anunciou simbolicamente o fim da censura na chamada Nova República.

Hoje, o teatro está ameaçado de sair de cena. O governador do estado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, já conhecido por sua política de segurança homicida, agora investe na censura por meio da sua secretaria de Cultura e Economia Criativa, com o objetivo de cassar a cessão de uso do terreno onde o teatro está instalado há cinquenta e quatro anos.

O teatro está situado no bairro do Leblon, que tem o metro quadrado mais caro da zona Sul da cidade, e é considerado patrimônio imaterial tombado pelo município e pelo estado pelo compromisso permanente com a luta contra a repressão. No fim da ditadura, o Casa Grande foi declarado “Território Livre da Democracia” pela frente de políticos progressistas.

No dia 23 de dezembro, véspera do Natal de 2019, os gestores do teatro receberam edital de licitação que desconsiderava a história e o investimento privado feito ao longo de todos esses anos. O teatro Casa Grande foi construído, reparado e vem sendo mantido sem qualquer verba pública. Todo o recurso foi e é privado.

O Tribunal de Contas do Estado atendeu à medida cautelar impetrada pelo Casa Grande e suspendeu a licitação ao verificar irregularidades no edital. Dentre os problemas, a exigência de submeter a programação dos semestres à secretaria de Cultura para “aprovação prévia”, criar espaços de alimentação e aumentar a capacidade de público dos atuais 956 para 1.036 lugares, contrariando o limite permitido pelo corpo de bombeiros que garante a segurança do público.

O Teatro Casa Grande entrou na rota dos ataques diretos que a cultura vem sofrendo no Brasil desde o golpe de 2016, agora radicalizados pelo governo miliciano e subalterno ao império estadunidense propagador do extermínio das manifestações imateriais simbólicas ao declarar, por exemplo, que bombardearia os locais históricos do Irã, referências e patrimônios da civilização ocidental.

(*) Maria Luiza Franco Busse é jornalista e sócia da ABI

Os artigos assinados não necessariamente refletem a opinião da ABI e de sua diretoria, mas se encaixam no respeito à diversidade de idéias e da Liberdade de Expressão.