Rapidez e audácia nos bastidores do cinema


03/09/2008


Cláudia Souza
05/09/2008

 Gina Lollobrigida/1971

O termo paparazzo, de origem italiana, é definido nos dicionários como sinônimo de fotógrafo, em geral freelancer, que persegue agressivamente celebridades e outras figuras notórias, com o intuito de registrar fotos indiscretas e vendê-las para publicações sensacionalistas. A expressão, que causa arrepios nos famosos, foi cunhada em 1960 por Federico Fellini, durante as filmagens do clássico “La dolce vita”, que conta a história do repórter Marcello Rubini, que trabalha para um tablóide e faz dupla com o fotógrafo Signore Paparazzo.

Para compor o roteiro, Fellini procurou o fotojornalista Tazio Secchiaroli, conhecido à época pelas fotos não-autorizadas que fazia na Via Veneto, avenida freqüentada por estrelas de cinema que filmavam nos estúdios da Cinecittà, em Roma. A conversa entre os dois rendeu muitas cenas ao filme e, a Tazio, a amizade do cineasta, que o apelidou de “paparazzo”:
— Virei um neologismo! —, costumava dizer Secchiaroli, em tom de brincadeira.

Pioneiro no gênero pelo qual é reconhecido como o “pai” dos paparazzi, Secchiaroli foi também o primeiro repórter de cinema da história da fotografia italiana.

A arte e a técnica primorosa do artista estão em cartaz no Caixa Cultural, no Centro do Rio, até o próximo dia 21, na mostra inédita “Tazio Secchiaroli — O cinema no olhar”, que reúne 90 imagens de astros e estrelas do cinema mundial registradas ao longo de três décadas pelo fotógrafo, morto em 1998, aos 73 anos:
— Os apaixonados por fotografia poderão admirar a técnica de Secchiaroli, que tem sua origem nas ruas de Roma como fotógrafo de turistas, fotojornalista e paparazzo. Rapidez e audácia misturam-se ao seu ponto de vista único — destaca o curador Antonio Cava.

Técnica afinada

Dramaturgo e diretor teatral, ele fez questão de privilegiar o cinema como tema central da mostra:
— Escolhi este foco porque, em Cinecittà, ao lado de grandes diretores de fotografia, Secchiaroli afinou e desenvolveu a técnica e, junto a cineastas como Fellini, Antonioni e De Sica, teve a oportunidade de aperfeiçoar os enquadramentos, a atenção com a luz, a escolha do filme e da câmera. Acho surpreendente que, no auge do sucesso como paparazzo, ele tenha decidido entrar no mundo da fantasia cinematográfica, tornando-se o primeiro repórter de cinema da história da fotografia italiana.

As imagens exibidas na exposição pertencem ao Archivio Tazio Secchiaroli, dirigido pelo filho do fotógrafo, David Secchiaroli, que prestigiou a inauguração da mostra e comentou:
— As fotografias, que estão sendo apresentadas pela primeira vez no Rio de Janeiro, retratam o período mais interessante, e certamente espetacular, de um artista que revelou ao mundo o povo de Roma, a “dolce vita” e a Cinecittà através de uma máquina fotográfica.

Profissionalismo

As lentes de Tazio Secchiaroli registraram sets de filmagem de muitos diretores, como Pasolini, Sergio Leone, Ettore Scola, Charlies Chaplin e Federico Fellini, este último nos filmes “Oito e meio”, “Cidade das mulheres” e “Amarcord”. Foi também devido ao seu interesse pelo cineasta que Antonio Cava conheceu o talento do fotógrafo:
— Fui curador de uma mostra em homenagem a Fellini, em 2003. Durante a minha pesquisa sobre sua obra, descobri o trabalho de Secchiaroli no livro de imagens de “Oito e meio”, publicado pela Editora Motta. Já admirava a direção de fotografia do filme, feita pelo mestre Gianni Di Venanzo, e fiquei ainda mais admirado com a reportagem fotográfica dos bastidores. Nela, para obter a textura do preto e branco do filme, Secchiaroli usou a mesma película que o diretor, em uma demonstração de profissionalismo e cuidado que me chamou atenção. A reportagem de “Oito e meio” foi o primeiro trabalho dele na Cinecittà e é o meu preferido.

Para o curador, a exposição é a prova do mergulho apaixonado do italiano na sétima arte:
— O cinema que ele fotografou não existe mais, porém suas imagens nos fazem sonhar com um tempo em que o cinema preenchia um vazio, era uma arte refinada e transmitia sentimentos. O cinema no olhar de Secchiaroli é elegante e misterioso. O olhar de um anjo-demônio com uma câmera nas mãos.


Trajetória

 Secchiaroli e Sophia Loren em 1970, num intervalo das filmagens de “O pecado”

Tazio Secchiaroli nasceu em Centocelle, na periferia da capital da Itália, em 26 de novembro de 1925. Desde cedo, divertia-se tirando fotos dos amigos com a câmera que ganhou de uma tia. Em 1944, começou a trabalhar como scatino, gíria romana para fotógrafo ambulante.

Após a morte prematura do pai, sustentou a mãe e duas irmãs fotografando turistas. Em 1951, foi colaborador da agência VEDO e conheceu Adolfo Porry-Pastorel, mestre do fotojornalismo italiano, com quem aprendeu os truques da profissão. Quatro anos depois, junto com Sergio Spinelli, fundou a agência Roma Press Photos.

A fama foi conquistada no verão de 58, com as fotos de personalidades na Via Veneto, que fizeram sucesso em jornais como L’Espresso e Il Giorno e inauguraram na Itália o mercado das imagens denominadas d’azione (de ação) ou d’assalto.

Em 1960, tornou-se o primeiro profissional a cobrir os bastidores do cinema na Itália. Muitos atores, que antes fugiam de seus flashes indiscretos, o elegeram como fotógrafo particular, como Marcello Mastroianni e Sofia Loren — a atriz, inclusive, só permitia que uma pessoa entrasse nos sets antes dela: Secchiaroli, que definia como “um verdadeiro artista”. 

Elegância, poesia e humor são os elementos essenciais na obra de Tazio Secchiaroli, que morreu em 25 de julho de 1998, deixando um precioso registro da sociedade e do cinema italianos. 

                                              Clique nas imagens para ampliá-las:

 

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