Os anos de chumbo na Argentina


05/06/2009


Atração da sessão desta quinta-feira, 4 de junho, do Cine ABI o filme “História oficial” é uma obra que representa um retrato fiel da ditadura militar na Argentina. Dirigido pelo argentino Luis Puenzo foi o primeiro longa-metragem latino a conquistar o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.

Considerado um clássico do cinema político mundial, o filme conta a história da professora de História Alicia, que, aos poucos, vai tomando consciência do que se passou nos terríveis anos da repressão, que terminou com saldo de 30 mil desaparecidos.

A princípio, Alicia parece alienada das duras questões políticas enfrentadas pelos argentinos durante a ditadura militar. Mas esse comportamento vai-se alterando à medida que ela começa a perceber a crueza do regime:
— Ela começa a atentar para a realidade da Argentina, a partir dos questionamentos de um de seus alunos sobre as verdades apresentadas nos livros de História. Outra personagem que tem papel importante nesse sentido, é uma amiga de Alicia recém-chegada do exílio, que conta para ela as atrocidades que aconteciam nas prisões políticas do País — diz Valmiria Guida, Secretária-geral da Casa da América Latina, sempre presente às sessões do Cine ABI.

Um dos fatos narrados pela amiga de Alicia, diz respeito às mulheres grávidas que davam à luz nas prisões e tinham seus filhos vendidos ou doados a outras famílias, sem que houvesse questionamento sobre a origem das crianças. 

Alerta

Essa informação desperta em Alicia a desconfiança de que sua filha adotiva, Gaby, então com cinco anos de idade, teve os pais assassinados pelos militares e que seu marido, que trouxe a criança para casa, seria um agente da repressão:
— O filme serve como um alerta para que as pessoas conheçam o que passou e o que se passa no País onde vivem — diz Guida. — Como era alienada politicamente, Alicia não desconfiava que sua família estava sustentada no sofrimento e no esfacelamento de outra. 

A partir da tomada de consciência, Alicia começa a investigar a origem da pequena Gaby e encontra, na Praça de Maio, durante protesto de parentes de desaparecidos, uma senhora que supostamente era avó da menina, com quem passa a se encontrar regularmente. Com as conversas e investigações, Alicia começa a questionar o marido, que se mostra profundamente irritado.

Para o Diretor de Cultura e Lazer da ABI, Jesus Chediak, o filme é um retrato fiel do que se passou na Argentina durante os anos de chumbo:
— A ditadura lá foi uma das mais ferozes da América Latina. Em 1982, eu estive em Buenos Aires e pude constatar o terror dos argentinos diante de um sistema impiedoso, que se refletia na vigília permanente das mães da Praça de Maio clamando por seus filhos desaparecidos. 

Anistia

Para o jornalista e conselheiro da ABI, Mario Augusto Jakobskind, embora a Lei da Anistia na Argentina tenha sido revogada pelo então Presidente Nestor Kirchner, ainda há resquícios do período ditatorial na sociedade daquele País:
— Basta ver que algumas pessoas que iriam testemunhar contra os opressores da época, tiveram um sumiço inexplicável. É o caso de Orlando Gonzáles que testemunharia contra o torturador Francisco Camilo Orce.

Segundo Valmiria Guida, a possibilidade de revogação da Lei da Anistia no Brasil é quase nula:
— Aqui, há muitos negócios em jogo. A apuração dos crimes cometidos por militares brasileiros vai causar diversos conflitos de interesses. Até hoje os arquivos militares continuam fechados. E a questão do massacre no Araguaia é escamoteada inclusive pelo PCdoB, partido ao qual muitas vítimas eram filiadas.