O suicídio de Vargas e a deposição de Dilma: fundamentos comuns


10/05/2022


Publicado no jornal O Dia e no blog de Joao Batista Damasceno

A operação Lava Jato não passou de uma estratégia bem-sucedida dos Estados Unidos para minar a autonomia geopolítica brasileira. Preocupava os EUA o crescimento de empresas que colocariam em risco seus próprios interesses e a falta de completa submissão do Brasil à sua política externa.

Em 2007, durante o governo de George Bush as autoridades estadunidenses demonstraram incômodo com a falta de cooperação brasileira com sua política intervencionista a pretexto de combate ao terrorismo. O Brasil não se mostrou disposto a embarcar na histeria estadunidense. Demonstrando alguma contribuição, o Brasil se dispôs a criar um grupo de especialistas e aprender os métodos estadunidenses.

Naquele ano, o juiz Sergio Moro foi convidado a participar de um encontro, financiado pelo Departamento de Estado dos EUA, e fez contato com diversos representantes do FBI, do Departamento de Justiça e do próprio Departamento de Estado. Simultaneamente, os EUA criaram um posto de “conselheiro jurídico” na sua embaixada no Brasil, a cargo de Karine Moreno-Taxman, especialista em combate à lavagem de dinheiro e ao terrorismo.

Em 2009, Karine Moreno-Taxman discursou na conferência anual dos agentes da Polícia Federal brasileira, em Fortaleza. Diante de mais de 500 profissionais ensinou os brasileiros a fazer o que os EUA queriam: “Em casos de corrupção, é preciso ir atrás do ‘rei’ de maneira sistemática e constante, para derrubá-lo. Para que o Judiciário possa condenar alguém por corrupção, é preciso que o povo odeie essa pessoa”, afirmou. Sendo mais explícita disse que: “A sociedade deve sentir que ele realmente abusou de seu cargo e exigir sua condenação”. Nenhum nome foi citado e nem precisava.

O governo brasileiro não viu o monstro que estava sendo criado. Ao contrário, a eleição da presidente Dilma em 2010 pavimentou o caminho. Seus auxiliares pouco demonstraram conhecer das instituições políticas brasileiras e negligenciaram o papel dos EUA na nossa política interna. Um grupo anticorrupção da OCDE, amplamente influenciado pelos EUA, começou a pressionar o Brasil por leis mais duras de combate à corrupção.

Os EUA implementaram um programa chamado “Projeto Pontes” para disseminar os seus métodos consistentes na criação de grupos de trabalho anticorrupção, aplicação de sua doutrina jurídica que inclui um sistema de recompensa para as delações e o compartilhamento “informal” de informações sobre os processos, ou seja, fora dos canais oficiais.

Em 2013, por pressão dos EUA, o Brasil aprovou a lei anticorrupção. Naquele mesmo ano o procurador geral adjunto estadunidense, James Cole, anunciou a vinda de agentes estadunidenses com o intuito de “instruir procuradores brasileiros”. Juristas destacaram o caráter “imprevisível e contraditório” da lei e a ausência de procedimentos de controle e, preocupados, alertaram sobre a possibilidade de qualquer membro do Ministério Público poder abrir uma investigação em função de suas próprias convicções, com reduzidas possibilidades de ser impedido por uma autoridade superior. Ainda assim a presidenta Dilma Rousseff sancionou a lei. A lei antiterrorismo também foi sancionada e possibilita a criminalização dos movimentos sociais.

Em janeiro de 2014, a lei anticorrupção entrou em vigor e em março o procurador-geral da República da época, Rodrigo Janot, chancelou a criação da “força-tarefa” da “lava jato”. A orquestração das prisões e o ritmo da atuação do Ministério Público e do ex-juiz Sergio Moro transformaram a operação em uma novela político-judicial, com acentuada e sem precedente espetacularização midiática.

No mesmo ano a procuradora estadunidense Leslie Caldwell afirmou que “a luta contra a corrupção estrangeira não é um serviço que nós prestamos à comunidade internacional, mas sim uma medida de fiscalização necessária para proteger nossos próprios interesses em questões de segurança nacional e o das nossas empresas, para que sejam competitivas globalmente”. Em 2015, os colaboracionistas procuradores brasileiros se reuniram com agentes dos EUA e lhes passaram todas as informações que precisavam. Em troca pediram cerca de R$ três bilhões arrecadados nos EUA fossem repassados para uma fundação que criariam. Os EUA aceitaram.

Em 1953, em razão da criação da Petrobras, os EUA patrocinaram brasileiros para infernizar a vida de Getúlio Vargas, levando-o ao suicídio no ano seguinte. Desde 1823, o presidente estadunidense declarara que nenhuma potência poderia se estabelecer no continente e fixou o lema da Doutrina Monroe: “América para os americanos”. O Brasil não se tornará um país soberano sob as asas dos EUA e enquanto perdurar a atuação dos vendilhões da pátria.

 

Fonte: Publicado originariamente no jornal O DIA, em 05/04/2022. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2022/05/6395533-joao-batista-damasceno-o-suicidio-de-vargas-e-a-deposicao-de-dilma-fundamentos-comuns.html