O poder da imagem revelado ao mundo


04/07/2008


 AP Photo — Itsuo Inouye

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Cerca de 300 fotografias que passaram por processos de falsificação ou manipulação e foram publicadas na imprensa ao longo dos últimos cem anos, em todo o mundo, estão reunidas em “Imagens que mentem”, cartaz atual do Museu de Comunicação de Berna, na Suíça. A mostra exibe as imagens antes e depois da alteração, acompanhadas de textos sobre o processo.

Para Ulrich Schenk, curador da exposição, o objetivo é chamar a atenção das pessoas para as montagens:
— Da mesma maneira que precisamos avaliar o que estamos lendo, é importante investir um tempo maior nas imagens estampadas na frente dos nossos olhos.

       Michael Jensch, Axel Thünker©

  A poça d’água vira um rastro de sangue

Criado pela Casa da História Alemã, o projeto itinerante “Imagens que mentem” tem atraído a curiosidade de museus de todo o mundo, como o de Berna:
— Eu me surpreendi ao ver que existem tantos exemplos de adulteração de imagens aqui na Suíça — diz Ulrich Schenk. — Em pouco tempo de pesquisa, conseguimos encontrar um grande número de fotos divertidas ou chocantes para incluir na exposição em nosso país, como a que foi feita em 1906, na abertura da primeira linha de ônibus dos Correios Suíços. O motorista do veículo teve a sua enorme barriga suprimida na imagem. Outro exemplo é dos anos 70, quando jogadores de futebol “perderam” misteriosamente o nome do patrocinador em suas camisetas.

Um dos destaques da exposição é a fotografia, feita em novembro de 1997, que mostra uma grande poça formada pela água que escorria do templo de Hatschepsut, no Egito. A imagem foi clicada após o atentado terrorista ocorrido no local, conhecido como o “Massacre de Luxor”, em que 62 pessoas morreram, entre elas 36 cidadãos suíços. Após a tragédia, o jornal populista Blick e um canal público de TV — ambos da Suíça —, com o recurso de softwares especiais, tingiram de vermelho a poça d’água, para transformá-la em sangue. A manipulação foi rapidamente descoberta por leitores mais atentos e os dois órgãos de imprensa foram obrigados a se desculpar publicamente. O fato gerou ampla discussão em âmbito mundial sobre o poder da imagem.
 

 Michael Jensch, Axel Thünker©

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Reputação

Há casos ainda em que as falsificações atingiram fortemente a reputação de pessoas públicas, como o ex-Embaixador da Suíça na Alemanha Thomas Borer:
— A carreira do brilhante diplomata foi arruinada depois que jornais sensacionalistas revelaram um suposto caso amoroso entre ele e uma cabeleireira. As provas, no entanto, eram fotos truncadas. Posteriormente, o jornal que as publicou foi obrigado a se retratar publicamente e pagar uma indenização. Mas o estrago já havia sido feito. Borer abandonou o serviço diplomático e hoje atua como consultor de empresas na Suíça — conta Schenk.

Questionado se a falsificação de imagens é sinônimo de avanço tecnológico, o curador afirma que a prática é anterior às novidades nesta área:
— Eu iria mais longe e diria que a falsificação ou a “interpretação” de imagens remonta ao surgimento de processos anteriores à fotografia. 

        Museu Nacional de História de Moscou

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Como exemplo, ele cita telas de reis e rainhas cujas imagens eram costumeiramente “retocadas” por seus autores, para melhorar a aparência dos monarcas. A prática da adulteração também era utilizada por alguns representantes de regimes totalitários, segundo Schenk:
— No início do século passado, o ditador Stálin solicitava a supressão, em fotos históricas, das imagens de pessoas que não lhe eram mais simpáticas, como os dissidentes do regime.

Contudo, o curador ressalta que as técnicas de manipulação vão se tornar cada vez mais acessíveis em decorrência da evolução do mercado:
— Em pouco tempo, uma simples câmera vai retirar automaticamente alguns pixels, eliminando, por exemplo, traços de envelhecimento dos rostos fotografados, sem o auxílio de um software. Estou bastante curioso para ver as futuras inovações na área. Porém, acho importante que todas as mudanças efetivadas em uma imagem sejam especificadas ao público.