O Brasil na imprensa mundial


14/01/2008


José Reinaldo Marques
22/9/2006

As pautas mais comuns são sobre política e economia, mas os correspondentes radicados no País também se dedicam à produção de matérias para falar de comportamento, meio ambiente e aspectos pouco explorados da diversidade cultural brasileira. Com isso, claro, acabam sendo também um pouco responsáveis por nossa imagem no exterior.

Trabalham atualmente no Brasil cerca de 300 correspondentes estrangeiros de acordo com o Itamaraty, responsável, juntamente com a Polícia Federal, por fazer o cadastramento e liberar a documentação que permitem ao jornalista estrangeiro trabalhar aqui.

Esses profissionais — a maioria norte-americanos, ingleses e alemães, nessa ordem — prestam serviços jornalísticos para 314 veículos de mídias diferenciadas. De agências de notícias, são 87; canais de TV, 28; agências fotográficas, 9; jornais, 70; revistas, 64; rádios, 14; e sites jornalísticos, 42.

No Rio, há 119 jornalistas de 17 nacionalidades diferentes filiados à Associação dos Correspondentes de Imprensa Estrangeira (Acie). Em São Paulo, a Associação dos Correspondentes Estrangeiros (ACE) tem 116 profissionais registrados. O menor número está no Distrito Federal, onde, segundo com a Associação dos Correspondentes Internacionais de Brasília (ACI), moram 15 jornalistas internacionais.

 Larry Rohter

Poder de influência

A presença de representantes da imprensa internacional entre nós foi saudada recentemente pelo jornalista Elio Gaspari, num artigo em que elogiava o lançamento, na Internet, da página da Associação dos Correspondentes de Imprensa Estrangeira no Rio de Janeiro. “É a eles que a imprensa brasileira deveu páginas memoráveis”, escreveu o colunista do Globo, citando os ex-correspondentes do The New York Times Joe Novitsky (“relatando as brutalidades da ditadura”) e Marlise Simmons (“informando ao Brasil a importância do assassinato de Chico Mendes”) para ilustrar os resultados positivos desse trabalho em nosso País.

Vez ou outra, porém, surge a polêmica sobre o poder que os correspondentes teriam de influenciar — positiva ou negativamente — a imagem do País no cenário internacional. Vale lembrar dois episódios envolvendo o repórter Larry Rohter, do New York Times: a matéria sobre o hábito do Presidente Lula de beber cachaça, que quase lhe custou o visto de trabalho, e a da suposta ligação de autoridades do Espírito Santo com o narcotráfico, classificando Vitória como “a Medellín do Brasil”.

                     Mac Margolis

Devido à preocupação do Governo brasileiro com o teor das reportagens produzidas pelos correspondentes, o Itamaraty manteve funcionando até 2003 um núcleo que monitorava as matérias consideradas negativas para a imagem do País no exterior. De acordo com a Assessoria de Imprensa do órgão, muitas dessas informações eram repassadas pelos jornalistas lotados nas embaixadas do Brasil, com base em reportagens veiculadas no noticiário internacional.

Com a interrupção desse trabalho no Itamaraty, quem cumpre vez por outra essa função é a Secretaria de Comunicação do Planalto (Secom). Alguns jornalistas internacionais acham que isso não é mais necessário, entre eles o norte-americano Mac Margolis, da Newsweek Magazine:
— Atualmente, influenciamos muito menos. Sempre achei um exagero dizer que a gente pautava o mundo e fazia a imagem de um país. Hoje, com a variedade de notícias circulando na internet, nossos leitores estão mais qualificados e têm sua própria rede de informação. Então, se escrevemos alguma besteira ou algo que não agrade, rapidamente somos contestados. Antes, a mídia internacional representava mais ou menos a opinião pública, mas isso acabou. Os blogs e os sites acabaram com o oligopólio da notícia. Hoje, todo mundo pode ser editor.

Visto

Nem sempre é fácil para um jornalista estrangeiro conseguir a autorização do Itamaraty para atuar no Brasil. De acordo com a Acie, muitos encontram dificuldades com a renovação do visto temporário de trabalho (Vitem VI) ou para conseguir a carteira de correspondente. A Acie ressalta que a dificuldade burocrática é motivo de descontentamento dos correspondentes com o País.

Segundo a entidade, o Itamaraty e a Polícia Federal (órgãos responsáveis por liberar a documentação) aparentemente estão exercendo mais controle e concedendo menos tempo de estadia (dois anos, de acordo com o Itamaraty) nas renovações do que é permitido pela lei (quatro anos no visto e mais quatro na renovação, segundo a Acie):
— Isto muitas vezes obriga o correspondente a sair do País antes do prazo legal, para poder retornar e dar entrada em novo pedido de visto — diz a jornalista britânica Diana Kinsh, que presidiu a Acie até o fim de julho.

 Diana Kinsh

Preferência

O Rio concentra o maior número de profissionais da mídia internacional, segundo Diana pelo fato de a cidade ter sido a capital do País:
— Há cerca de 150 jornalistas estrangeiros morando no Rio, nem todos filiados à Acie. Muitos são freelancers e trabalham para mais de uma publicação simultaneamente. Em segundo lugar aparece São Paulo, onde o contingente tem crescido muito. E Brasília e Salvador também têm sido o caminho de muitos repórteres vindos do exterior.

Diana é correspondente da revista inglesa Metal Bulletin, especializada no setor de mineração — que, como frila, cobre também para a agência Reuters. Antes de chegar aqui, passou por México, França e Espanha. Morando no Brasil há 18 anos e com seis filhos brasileiros adotados, ela diz:
— Economia é a pauta principal. A cobertura nessa área tem crescido muito depois da estabilização que veio com o Plano Real. Antes, aliás, não existia escritório da Metal Bulletin na América Latina. E era muito difícil fazer matérias sobre o continente a partir de Londres, por causa do fuso horário. Estava no México quando apurei que a indústria brasileira de minério e aço estava em expansão. Percebi que isso ia dar mais oportunidades para uma boa cobertura jornalística do setor. Então, em 1988, tomei a decisão de vir para cá e convenci a chefia da revista de que era uma boa inaugurar um escritório brasileiro.

Depois do Brasil, segundo Diana, os países da América Latina que mais atraem jornalistas vindos da Europa, Estados Unidos, Ásia e África são México, Argentina e Venezuela:
— O Brasil atrai mais por ter se consolidado como uma nação economicamente forte, globalizada e moderna. Além disso, o País tornou-se um grande exportador de commodities, é muito carismático e também oferece muita pauta nas áreas de meio ambiente, esporte e cultura.

Sucessora

                                          Paula Gobbi

Outra jornalista internacional bem adaptada ao Rio é a argentina Paula Gobbi, que mora na cidade há 24 anos e é uma das mais antigas correspondentes em atividade no País. Em agosto, ela assumiu a Presidência da Acie, prometendo seguir os passos de sua antecessora e se esforçando “para que a Associação tenha mais participação de seus membros em trabalhos de grupo e troca de idéias”.

 Posse da nova Diretoria da Acie

Paula acha que os cariocas podem se orgulhar de a cidade ser a mais procurada como base dos jornalistas estrangeiros, e relembra o escritório coletivo, que ficou conhecido como Casa da Urca, montado em 1984 por um grupo que incluía John Arden (BBC Television), Jean Mentens (Rádio Belga), Juan de Onis (Los Angeles Times), Walter Tauber (Der Spiegel), Lucrecia Franco (Telemundo), Pedro Varela (jornal Eco), Barry Came (Newsweek) e Mac Margolis — o único que continua no Brasil.

Quem conheceu diz que a Casa tinha uma vista deslumbrante da Baía da Guanabara, fonte de inspiração para todos:
— Ali eram formuladas as reportagens mais ilustrativas que os correspondentes produziam sobre o Brasil. Os tempos eram outros, não havia tanta pressão. Aconteceu na era pré-internet, quando as matérias eram enviadas via telex e levavam horas para chegar às redações — diz Paula.

Celeiro 

Atualmente cobrindo o setor agrícola para o site norte-americano OTR, Paula trabalha em casa, com prazos mais flexíveis, “a tendência da rotina dos correspondentes”:
— Trabalhei durante 22 anos para o Los Angeles Times. Em dezembro do ano passado, eles fecharam o escritório no Rio e me tornei freelancer. Além do OTR, colaboro com o guia Lonely Planet, fazendo matérias sobre cotas raciais, cultura nas favelas e reciclagem de materiais. E estou às voltas com a produção de um documentário para o canal de TV Australian Broadcasting Corporation sobre o conflito de terra na Amazônia, enfocando a BR-163. O potencial do Brasil como celeiro do mundo — é o maior produtor de café, carne e açúcar e o segundo de soja — tem grande interesse, pois há muitas multinacionais investindo neste mercado.

Segundo ela, a regra de ouro do correspondente é observar as características do país onde vai trabalhar:
— Cabe ao jornalista se integrar à cultura local e conhecer profundamente os costumes da população, para poder relatar suas particularidades com autoridade.

Paula ganhou recentemente o prêmio Golden Reel, com uma matéria sobre as questões raciais brasileiras transmitida pela BBC e pela rádio PRI, dos Estados Unidos. Impressionada com as dimensões do Brasil, ela diz que quer conhecer mais nossas questões socioculturais e adorou as séries de reportagens que fez para a Paramount e para a BBC que a levaram ao Norte, ao Nordeste e ao Sul do País:
— O Brasil é muito vasto e rico culturalmente e eu me encontro sempre descobrindo vários novos Brasis. Essa diversidade é uma fonte inesgotável para o correspondente.

Sobre o interesse dos leitores do site pelas matérias que escreve, ela comenta:
— E difícil avaliar, muitas vezes sinto que mando a matéria e falta feedback. Às vezes recebo uma mensagem do meu editor cumprimentando minhas reportagens, mas isso não é comum. 

 Atração por temas pouco explorados

 Das agências para o resto do planeta