Nocaute voltará quando passar a tempestade


31/07/2020


Por Lívia Ferrari, jornalista e membro da Comissão de Cultura e Lazer da ABI

Entrevista com Vladimir Putin (Imagens: Nocaute)

O anúncio foi feito pelo próprio jornalista e escritor Fernando Morais em seu blog. O Nocaute encerra suas atividades nesta sexta-feira, 31 de julho, logo após a exibição do quarto e último episódio da minissérie Entrevistas com Putin, dirigida por Oliver Stone. Mas Morais promete voltar com o canal “quando passar a tempestade”.

Depois de quase quatro anos de jornalismo crítico, progressista, independente, Nocaute, blog de notícias, entrevistas e reportagens sobre política, cultura e economia, lançado em outubro 2016, não resistiu.

Mesmo tendo batido a marca de 110 mil seguidores no Youtube,  com mais de 15 milhões de visualizações, de ter ganho placa de prata, o canal  teve morte previamente anunciada: “Nos últimos meses vivemos sem saber se haveria recursos para bancar os gastos do mês seguinte, mesmo diante de uma estrutura bastante enxuta: uma redação com quatro pessoas, contando com a  moça da água”, diz Morais, em conversa com o site da ABI.

As contribuições de centenas de generosos amigos e leitores  sustentaram o canal ao longo dos anos. Mas tonaram-se insuficientes para os gastos com aluguel de uma salinha, impostos, custos de internet. A equipe restrita se junta a brilhantes times de colunistas e colaboradores da imprensa.

“Com a pandemia, reduziram-se as contribuições”, afirma o jornalista, que fez de tudo para continuar, até “vender minhas coisas para levantar dinheiro”. Foi assim com a motoclicleta BMW, ano 1951, e com a obra de Tomie Ohtake que ganhou de presente da própria artista plástica. “Tudo por uma boa causa. Certamente Tomie  está aplaudindo do céu”, assegura ele, em tom de brincadeira.

Morais reconhece a dificuldade de contar com patrocinadores e anunciantes,  mesmo para um canal que atinge mês a mês mais de 400 mil pessoas. “Imagina se um Itaú vai anunciar num blog que considera os resultados dos bancos agiotagem oficial”  …   Além disso,  ele admite ter “vergonha de pedir dinheiro” a possíveis apoiadores.

Morais lamenta não existir no Brasil mecanismos independentes de financiamentos, como há nos Estados Unidos, Citou o caso do  ex-pré-canditado presidencial pelo Partido Democrata Bernie Sanders, que arrecadou milhões de dólares para sua campanha em contribuições pela internet; “apenas US$ 17 por cabeça, e sem a dependência de Wall Street”, destaca.

Apesar das dificuldades, tudo indica, porém, que o fim do Nocaute não será definitivo.  Espera que o retorno seja em breve.   Enquanto isso, dará “ mergulho profundo” nas páginas finais da biografia de Lula que ele está escrevendo e prevê entregar em dois ou três meses o primeiro Tomo à Companhia das Letras. A obra deverá ser lançada até o final do ano.

Nesse intervalo, até a volta do Nocaute, os seguidores não ficarão a seco. Morais conta que todo o conteúdo publicado/postado  no blog ao longo desses anos ficará armazenado num provedor e poderá ser facilmente consultado. Entre as exclusivas nacionais e internacionais estará a entrevista com o colega Julian Assange, feita na embaixada do Equador em Londres em janeiro de 2017, uma das grandes matérias de estreia do blog.

Morais garante que voltará com mais fôlego ainda. Para provar, cita versos da canção Perseguição, de Sérgio Ricardo, da trilha sonora do filme Deus e o diabo na terra do sol, de Glauber Rocha:

– Se entrega, Corisco!

– Eu não me entrego, não!

Não me entrego ao tenente

Não me entrego ao capitão

Eu me entrego só na morte

De parabelo na mão

Morais tem razão. Afinal, “mais forte são os poderes do povo!”, como diz a mesma canção.