Morre Theodomiro Romeiro, primeiro condenado à morte pela ditadura militar brasileira


15/05/2023


Do 247

Morreu neste domingo (14), aos 70 anos, Theodomiro Romeiro dos Santos, o primeiro condenado pela ditadura militar brasileira quando tinha apenas 18 anos de idade. A informação do falecimento foi divulgada pelo escritor e jornalista, Emiliano José, em sua página oficial no Facebook.

Ainda jovem, Theodomiro se tornou um destacado militante na luta contra a ditadura militar, fato que o levou a ser perseguido, preso e condenado à morte pelo Conselho Especial da Aeronáutica em março de 1971.

Em 27 de outubro de 1970, na avenida Vasco da Gama, em Salvador, Bahia, Theodomiro Romeiro, Getúlio de Oliveira e Paulo Pontes , todos membros do então clandestino Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), receberam voz de prisão de quatro agentes da ditadura. Na ocasião Getúlio conseguiu fugir, sendo perseguido por um dos agentes, mas Theodomiro e Paulo Pontes foram presos e algemados um ao outro. Com a mão esquerda livre, ao entrar no automóvel que os conduziria à prisão, Theodomiro sacou o revólver que estava em sua pasta e disparou três vezes, acertando dois dos agentes: um sargento da aeronáutica, que morreu com um dos tiros; e um agente da polícia federal, que saiu ferido.

Exilou-se na França e retornou ao Brasil apenas em 1985, após a expiração de sua condenação, e se graduou em Direito. Theodomiro aposentou-se como juiz do Tribunal Regional do Trabalho de Pernambuco. Recebeu anistia, mas, por motivações ideológicas, jamais pleiteou qualquer indenização.

Postagem de Emiliano José no seu Facebook:

“Theo partiu.
Para nossa geração, tempo de partidas.
De homens partidos.
Porque quando um dos nossos se vai, vamos um pouco também.
Theodomiro Romeiro dos Santos, meu querido amigo, companheiro de luta, de prisão.
Teve um grave AVC hemorrágico em 2018.
Resistiu até hoje, 14 de maio de 2023.
Partiu serenamente.
A notícia de Virgínia, amorosa companheira dele, amorosa assim num limite pouco conhecido, agora, pouco depois das 19 horas, me envolveu em tristeza profunda.
Theo é um dos nossos heróis.
Está certo: triste do país que precisa de heróis.
Nós precisamos – a ditadura cobrou a existência deles.
Primeiro, militante cristão em Natal. Cedo, muito cedo, liga-se ao Partido Comunista Brasileiro Revolucionário, e foi na condição de militante desse partido a chegada dele à Bahia.
Foi durante um bom tempo o mais famoso preso político do País.
Aos 18 anos, em Salvador, reagiu a uma prisão arbitrária, como todas do período.
Matou um sargento da Aeronáutica, e por muito pouco não foi assassinado pelos militares, e aquele era um momento de pura barbárie.
Fui preso pouco depois dele, e por quatro anos convivemos na Galeria F da Penitenciária Lemos Brito, em Salvador.
Condenado à morte em março de 1971, tornou-se o símbolo de uma campanha nacional e internacional, e a ditadura foi obrigada a recuar.
Tornaram a pena de morte perpétua, e no vai e vem dos tantos recursos, terminou condenado a coisa de 16 anos e alguma coisa.
Depois de quase nove anos de prisão, pede liberdade condicional a que teria direito.
Negado liminarmente.
Resolveu fugir, às portas da anistia, em agosto de 1979.
Tinha convicção: libertados os demais companheiros, ele sozinho na Lemos Brito, seria morto de um jeito ou de outro.
Estava jurado de morte pelos militares.
Foge, e termina na embaixada do Vaticano em Brasília.
De lá para o México, depois pra Paris.
Volta somente em 1985, com o fim da ditadura.
Contei tudo isso na número um da revista Caros Amigos, na matéria “Fuga histórica”.
Torna-se juiz do Trabalho em Pernambuco, e conhece Virgínia.
Casam-se.
Tiveram uma vida de muito amor e companheirismo.
Creio tenha ele conseguido viver com algum conforto durante esses anos graças a Virgínia, aos cuidados extremados dela, muito amor.
Estive com ele mais de uma vez depois do acidente hemorrágico.
Em uma delas, conseguimos alguma interlocução.
Um momento de rara emoção.
Um revolucionário partiu.
Um homem bom.
Fui testemunha, na prisão e depois, do espírito solidário dele.
Como poucos, exercitava a solidariedade.
Como poucos, sabia ser amigo.
Triste, muito triste.
O bom é poder recordar dele com tanta amizade, admiração, amor.
Meu filho leva o nome dele.
Adeus, meu querido companheiro e amigo.
Jamais o esqueceremos.”