Maioria dos casos de violência contra jornalistas em 2014 ocorreu em manifestações


Por Igor Waltz

22/01/2015


Presidente da Fenaj; Celso Schroeder, presidente da Fenaj; e Arcírio Gouvêa, Assistência Social da ABI (Crédito: DiPaola)

Beth Costa, secretária-geral da FIJ; Maria José Braga, 1ª Vice-Presidente da Fenaj; Celso Schroeder, presidente da Fenaj; e Arcírio Gouvêa, Assistência Social da ABI (Crédito: DiPaola)

Apesar da redução do número dos casos de violência, 2014 foi um dos anos mais brutais para a profissão de jornalista no Brasil. No ano passado, foram registrados 129 casos de violência contra profissionais em decorrência do exercício de seu trabalho, sendo três mortes, de acordo com dados do Relatório da Violência contra Jornalistas, divulgado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), nesta quinta-feira, 22 de janeiro, na sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI). O estudo aponta que houve uma redução de 33% no número total de ocorrências em relação a 2013.

De acordo com o Relatório, produzido com base em informações coletadas por sindicatos estaduais e municipais, os assassinatos de jornalistas voltaram a crescer em relação aos anos anteriores. Em fevereiro, Santiago Andrade, cinegrafista da TV Bandeirantes do Rio de Janeiro, morreu após ser atingido por um artefato explosivo durante uma manifestação popular. No mesmo mês, os jornalistas Pedro Palma, em Miguel Pereira, Estado do Rio, e Geolino Lopes Xavier, em Teixeira de Freitas, no interior da Bahia, foram assassinados em decorrência de denúncias que publicaram.

O Relatório levantou ainda a morte de três radialistas e um blogueiro, que não foram computados nos números finais por não pertencerem à categoria. Da mesma forma, integram os relatos a morte de quatro jornalistas em crimes que não tiveram relação com o exercício profissional.

De acordo com Celso Schroeder, presidente da Fenaj, mais de 50,4% das agressões, um total de 65 casos, aconteceram durante protestos. Ele afirma que esse dado aponta para uma mudança do perfil dos agressores. Se antes a maior parte dos crimes era cometida por políticos e assessores, hoje policiais militares e guardas municipais são responsáveis por 48,06% das ocorrências, seguidos por manifestantes, com 12,4%.

“Nos reunimos em três ocasiões com o Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo para pedir que ele cobrasse uma mudança de postura das polícias militares. Infelizmente, ainda não tivemos um retorno positivo, assim como ocorreu com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência”, lamentou Schroeder.

Além desses eventos, a categoria continua sofrendo com outras formas de violência historicamente recorrentes. Foram computados 17 episódios de agressão física não relacionada a manifestações (13,17%), 12 de cerceamento à liberdade de expressão por meio de ações judiciais (9,3%), 11 relacionados a ameaças e intimidações (8,52%) e sete envolvendo agressões verbais e injúria racial (5,43%).

“No Brasil, a indústria de ações judiciais para limitar a liberdade de imprensa está crescendo. O fim da Lei de Imprensa produziu um vácuo que incentivou juízes de primeira instância a atuar contra a atividade jornalística. O caso mais emblemático foi o do jornalista Cristian Góes, que foi condenado a prisão e pagamento de multas exorbitantes por uma obra ficcional publicada em seu blog”, afirmou o presidente da Fenaj.

O Relatório aponta ainda a região Sudeste como a mais violenta para a categoria, com 55,81% das agressões, e a Centro-Oeste como a menos violenta, com 18,6%. A maioria das ocorrências aconteceu contra profissionais do sexo masculino (76,74%), atuantes na mídia impressa (32,56%).

Para a jornalista brasileira Beth Costa, secretária-geral da Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ), a violência no Brasil e no mundo ainda é motivada pela certeza da impunidade. “Aproximadamente 98% dos casos no mundo inteiro não são investigados. A FIJ realiza uma campanha junto à Unesco e às Nações Unidas para que os países forcem seus sistemas judiciários a punirem os envolvidos na morte de jornalistas. Nosso objetivo é mostrar que a nossa categoria é de risco, não apenas na cobertura de conflitos armados, mas em nosso dia a dia”, disse.

Paula Mairan, presidente do Sindicato de Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, acredita que a violência não se manifesta apenas de forma pontual na cobertura de temas como violência urbana e política, mas também na precarização das relações de trabalho. “Hoje os jornalistas são mal remunerados, com sobrecarga de trabalho, atuando sem equipe, como ocorreu com Santiago em fevereiro passado”, defendeu.

Segundo a dirigente, após o episódio da morte do cinegrafista, o sindicato carioca reuniu-se como o Ministério Público do Trabalho para elaborar diretrizes de segurança para os jornalistas. As recomendações incluem a obrigação dos veículos de comunicação de fornecer equipamentos de proteção individual, capacitação e acompanhamento jurídico para notificar as ocorrências. “Todas as empresas do Rio foram notificadas, mas até hoje nenhuma cumpre à risca as determinações”, denunciou Paula.

Participaram do evento ainda o diretor de Assistência Social da ABI, Arcírio Gouvêa, e a jornalista Maria José Braga, 1ª Vice-Presidente da Fenaj.