Lula apoia fundador do WikiLeaks


01/10/2010


O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou, nesta quinta-feira, 9, a prisão do jornalista Julian Assange, fundador do site WikiLeaks, classificando-a como um ato restritivo à liberdade de imprensa. Durante a cerimônia de balanço dos quatro anos do Programa de Aceleração do Crescimento(PAC), Lula disse ainda que se surpreendeu com a ausência de manifestações em favor da liberdade de expressão:
—O rapaz do WikiLeaks foi preso e não estou vendo nenhum protesto pela liberdade de expressão. É engraçado. Não tem nada, nada pela liberdade de expressão e contra a prisão de um rapaz que estava fazendo um trabalho melhor do que muitos embaixadores. Então, WikiLeaks, minha solidariedade pela divulgação das coisas e meu protesto contra o cerceamento da liberdade de expressão. Assange foi preso nesta quarta-feira, 8, no Reino Unido, acusado dos crimes de coerção ilegal, abuso sexual e estupro na Suécia.
 
O jornalista permanecerá preso até o dia 14, quando será realizada audiência sobre sua deportação. O juiz responsável pelo caso negou fiança ao jornalista. A Suécia expediu o primeiro mandado de prisão para Assange em 18 de novembro, mas a ação foi invalidada por um erro processual. Um novo mandado foi emitido no último dia 2.
 
Segundo o jornal americano The New York Times, as acusações contra Assange são baseadas em encontros sexuais com dus mulheres. As relações, que começaram consentidas pelas envolvidas, acabaram não consentidas quando Assange não quis mais usar camisinha. A pena máxima prevista é de quatro anos.
 
Lula é o primeiro líder internacional a se manifestar contra prisão do jornalista. O Presidente expressou solidariedade ao fundador do WikiLeaks, afirmou que a prisão do jornalista pode ter conotação política, e orientou o fotógrafo do Presidência da República a postar o protesto presidencial no Blog do Planalto:
—Aí aparece o tal de WikiLeaks, desnuda a diplomacia que parecia inatingível, a mais certa do mundo, e começa uma busca. Eu não sei se não colocaram cartazes como no faroeste, de ‘Procura-se, vivo ou morto’, mas prenderam o rapaz, que estava apenas colocando aquilo que ele leu. E se ele leu porque alguém escreveu, o culpado não é quem divulgou, o culpado é quem escreveu. Portanto, em vez de culpar quem divulgou, culpe quem escreveu a bobagem, porque senão não teria o escândalo que tem.
 
Dentre o extenso material divulgado pelo WikiLeaks, estão documentos nos quais o Ministro da Defesa, Nelson Jobim, se refere ao Secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães, como alguém que “odeia os Estados Unidos”. A citação foi feita pelo Embaixador americano no Brasil, Clifford Sobel.
—A Dilma tem que falar para os seus ministros que se não tiver o que escrever, não escreva nada. Não escreva bobagem, disse Lula./DIV>

 
A alta-comissária de Direitos Humanos da ONU, Navi Pillay, também manifestou preocupação em relação ao caso WikiLeaks:
—Estou preocupada com os relatos sobre a pressão sendo exercida sobre empresas privadas, inclusive bancos, empresas de cartões de crédito e provedores da internet, para fecharem as linhas de crédito para donativos ao WikiLeaks, bem como para hospedar o site. Se o WikiLeaks cometeu algum ato ilegal reconhecível, isso precisa ser tratado por meio do sistema judicial, e não por meio de pressão e intimidação, inclusive contra terceiros.O caso desperta questões complexas de direitos humanos a respeito do equilíbrio entre liberdade de informação, o direito das pessoas a saberem, e a necessidade de proteger a segurança nacional ou a ordem pública. Esse equilíbrio é difícil.
 
Mensageiro
 
No mesmo dia da prisão de Assagen, o jornal The Australian publicou um artigo assinado pelo jornalista, onde ele exorta o governo “a não matar o mensageiro”.
—A tormenta que gira em torno do WikiLeaks atualmente só reforça a necessidade de defender o direito de todos os meios de comunicação de revelar a verdade, diz em um trecho.
 
De acordo com o site de notícias do Yahoo, The Cutline, veículos importantes como a Associated Press, a NBC e a Reuters, deixaram de se referir ao WikiLeaks como “um site de vazamento de informações”.  Tom Devine, Diretor jurídico do projeto Government Accountability, a maior organização de defesa dos informantes, ou vazadores de informação, nos EUA, participou de um debate na NPR, rede pública de rádio do país, sobre o site.
—O Wikileaks é a única alternativa que testemunhas de fraude ou corrupção têm para fazer uma denúncia anonimamente. É o que nos resta. Se o Congresso agir racionalmente, garantirá um outro meio de revelar segredos anonimamente. Esperamos que os políticos tenham bom senso suficiente para tomar uma atitude que evite que o WikiLeaks se torne um padrão na nossa sociedade.
 
Criado em dezembro de 2006, por Assange, ex-hacker, e PhD em Física, o site WikiLeaks vem provocando polêmica entre governos, autoridades e empresas de vários países por revelar informações secretas sobre a diplomacia norte-americana.
—Eu gosto de criar sistemas grandiosos e gosto de ajudar pessoas vulneráveis. E gosto também de esmagar os cretinos. É um trabalho adorável, afirmou o jornalista em entrevista à revista alemã Der Spiegel.
 
O site oferece a qualquer usuário a oportunidade de postar, anonimamente, através de uma conexão cifrada, textos, áudios ou vídeos confidenciais, cuja autenticidade o site se encarrega de verificar. A equipe é formada por cinco voluntários em tempo integral e entre 800 e mil colaboradores, entre técnicos de informática, advogados e jornalistas.
 
Em 2008, o WikiLeaks recebeu o prêmio de meio de comunicação do ano pela revista Economist. Em 2009, o portal e seu fundador venceram o Prêmio da Anistia Internacional na categoria de Novas Mídias por relatos sobre matanças no Quênia.
 
O site também causou polêmica ao colocar à disposição, em novembro de 2009, meio milhão de telefonemas, emails e SMS emitidos e recebidos pelo FBI e pela Polícia de Nova York no 11 de setembro. Um dos casos de maior repercussão foi a divulgação de um vídeo no qual um helicóptero Apache americano abate, em 2007, uma dezena de civis em Bagdá. O vídeo teve mais de quatro milhões de acessos em 72 horas no YouTube. As imagens mostravam entre os mortos o cinegrafista da Reuters Namir Noor e seu motorista Saeed Chmagh. O vídeo foi denunciado por organizações de jornalistas, obrigando o Pentágono a abrir uma nova investigação sobre o ataque.
 
Em novembro último, o Wikileaks divulgou 250 mil documentos secretos da diplomacia norte-americana. São despachos diários trocados por mais de 270 embaixadas e consulados em todo o mundo, desde 1966.
 
O vazamento das informações sigilosas deixou os Estados Unidos em uma situação desconfortável com o resto do mundo. A Justiça dos Estados Unidos abriu investigação criminal contra o Wikileaks.
 
Entre os segredos da diplomacia americana estão: ordens da Secretária americana de Estado Hillary Clinton para que autoridades da ONU fossem espionadas e pedidos da Arábia Saudita para os Estados Unidos atacarem o Irã.Foram divulgados ainda relatórios nos quais o Presidente venezuelano Hugo Chavez é comparado a um louco. E a Rússia seria um estado mafioso dirigido por “Batman e Robin”.
 
Nos documentos, o Embaixador Clifford Sobel informa a Washington que suspeitos de financiar o terrorismo foram presos no Brasil sob outras acusações. O motivo seria não chamar a atenção da mídia e evitar a comparação das ações das autoridades brasileiras à política antiterror dos EUA e a perseguição a muçulmanos.
 
O Governo brasileiro negou que houvesse atividades terroristas na região de tríplice fronteira com a Argentina e o Paraguai. O Itamaraty e a Polícia Federal não comentaram o caso.
 
A partir das acusações contra Assange, várias empresas suspenderam o serviço que viabiliza a transferência de doações para o WikiLeaks, entre as quais a Visa, Mastercard, e Amazon. Segundo o jornal britânico The Guardian, a administradora de cartões de crédito Mastercard teve seu site atacado nesta quarta-feira, dia 8, por um grupo de ativistas online identificado como Anonymous (Anônimos), que teria realizado um ataque de negação de serviço, deixando o site inacessível para muitos usuários.
 
A ação foi chamada de “Operation: Payback” (“Operação: Troco”). O grupo de ativistas teria publicado um manifesto em defesa de Assange. O Paypal, site usado para pagamentos online, também foi alvo dos hackers.
 
Embora o WikiLeaks tenha sido bloqueado, centenas de outros sites tornaram seus documentos disponíveis na internet.

*Com informações de O Globo, Portal Terra, Kinght Center for Journalism.