Livro retrata trabalho jornalístico nas periferias


21/07/2020


 

Crédito de Kadu Martini

Por Igor Simões

No momento em que a desinformação se espalhou tão rapidamente quanto o vírus desconhecido, a pandemia do novo coronavírus fez olhos e ouvidos da audiência se voltarem ainda mais para os meios de comunicação, em busca de informação confiável. As coberturas da Covid-19 e das crises envolvendo o governo Bolsonaro impulsionaram as audiências de veículos tradicionais de mídia, mas também abriram espaço para o crescimento de outras iniciativas na imprensa, como o jornalismo das periferias.

Produções como o podcast “Em quarentena”, da Agência Mural de Jornalismo, criado por jornalistas de periferias de São Paulo, ganharam projeção na maior metrópole do Brasil e cidade que se manteve como epicentro da pandemia durante meses. Em um formato acessível, com duração média de sete minutos e distribuídos via Whatsapp, os podcastsconquistaram a confiança dos moradores e aproximaram os veículos destes consumidores de informação.

O jornalismo de periferias – movimento em efervescência nas principais capitais do país– reúne profissionais que produzem notícias fora da chamada mídia tradicional. A  jornalista Mara Rovida, professora da pós-graduação em Comunicação e Cultura da Universidade de Sorocaba (Uniso), estuda o tema e está lançando o livro Jornalismo das periferias: o diálogo social solidário nas bordas urbanas (Curitiba: CRV, 2020).

A pesquisa buscou compreender o perfil desses profissionaisque atuam em veículos cujo foco é a cobertura de bairros periféricos, a partir da perspectiva de quem vive nesses bairros geralmente colocados em segundo plano pelo Estado.“São grupos formados por jornalistas graduados e pós-graduados, em torno dos 30 anos ou menos, muitos com passagens pela mídia tradicional ou empresas. Eles são diferentes entre si, mas tem como ponto em comum a relação com o território, enxergando as periferias como locais plurais e multifacetados”, conta a professora Mara.

O livro traz os resultados da pesquisa de campo realizada pela docenteentre 2017 e 2020, com quatro coletivos de jornalistas que cobrem 39 municípios na Grande São Paulo. Em levantamento etnográfico, Mara Rovida entrevistou membros da Agência Mural de Jornalismo de Periferias, do veículo Nós, Mulheres da Periferia, da agência Alma Preta e da produtora de jornalismo de quebrada Periferia em Movimento, entre 2018 e 2019, com apoio da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Cada um dos veículos estudados adotapolíticas editoriais diferentes.Nós, mulheres da periferiaoptou por não ter um recorte de um local específico, mas trabalha as pautasa partir da perspectiva feminina das periferias. Alma Preta busca um enquadramento racial em suas pautas. Já aAgência Mural de Jornalismofaz a cobertura de todas as periferias de São Paulo e produz pautas que fujam do estereótipo de violência como costumam ser retratadas essas regiões pela mídia tradicional. E o Periferia em Movimentose concentra na questão do trabalhador urbano e o recorte das classes sociais.

Embora os critérios de noticiabilidade para a escolha da pauta sejam diferente para cada veículo, Mara Rovida ressalta o caráter eminentemente jornalístico das produções.“Sempre há a divisão, mas jornalismo é jornalismo. Isso significa que cada um dos veículos trabalha dentro dos preceitos da prática tradicional aprendida dentro das escolas de jornalismo”, afirma a docente da Uniso.

A pesquisadora acredita que o surgimento dessas iniciativas pode estar ligadoao ingresso crescente de moradores de periferias nas universidades. Muitos entrevistados relataram ser os primeiros de suas famílias a obter diploma no ensino superior. “O que é inovador nesses grupos não é a criação de espaços alternativos para se produzir jornalismo, mas a quantidade de produção e o nível de profissionalização dessa produção, que se deve, em alguma medida, às políticas de acesso ao ensino superior que a gente teve nas últimas décadas”, diz a jornalista e professora universiária.

Serviço

A pandemia do novo coronavírus levou a editora a adiar o lançamento presencial do livro. Por ora será feito uma promoção online, na próxima semana, dia 23, a partir das 19 h, em uma live organizada por Gilberto Silva, editor da Revista Partes e membro do Grupo de Pesquisa Comunicação e Sociedade do Espetáculo da Faculdade Cásper Líbero. Na ocasião, os participantes devem conversar sobre o tema com a autora e pesquisadores do grupo. Para acompanhar, basta acessar os canais youtube.com/user/revistapartes ou facebook.com/vitrinedogiba.

O livro Jornalismo das periferias: o diálogo social solidário nas bordas urbanas pode ser adquirido por R$40,00 no site editoracrv.com.br, que disponibiliza as versões impressa e digital da obra. Os interessados em comprar o exemplar autografado pela jornalista podem entrar em contato com a autora pelo email mararovida@gmail.com.