22/06/2009
Alexandre Horta |
![]() |
Câmara Municipal do Rio de Janeiro |
Na manhã desta segunda-feira, dia 22, foi realizada a primeira manifestação no Rio de Janeiro, em repúdio à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que declarou inconstitucional a exigência de diploma de nível superior para o exercício da profissão de jornalista, na última quarta-feira, dia 17.
Estudantes, jornalistas e representantes do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro (SJPMRJ), da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e da Associação de Repórteres Fotográficos e Cinematográficos do Rio de Janeiro (Arfoc-Rio) se concentraram em frente ao edifício-sede da ABI, no Centro do Rio, às 10h, caminhando em direção à Câmara Municipal do Rio de Janeiro, e em seguida, à Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj).
A mobilização estudantil para a passeata começou na internet, quando alunos de Jornalismo, através de uma comunidade do Orkut, se organizaram para a realização do protesto, que, segundo Marcele Batista, uma das estudantes que iniciaram o movimento na rede, aconteceu simultaneamente em outros estados como São Paulo, Piauí, Brasília e Rio Grande do Sul.
![]() |
Rogério Marques |
Salários
Ainda em frente à sede da ABI, os manifestantes — trajando roupas pretas e exibindo faixas com mensagens como “Pesquisa com a sociedade confirma: 74,3% querem que os jornalistas tenham o diploma.” — ensaiaram os primeiros gritos de ordem. Ao som de “ão, ão, ão, diploma é obrigação” e “não é mole não, o meu diploma virou pano de chão”, as pessoas utilizaram o megafone para registrar o descontentamento.
Rogério Marques, Vice-Presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, recordou o período anterior a 1969, quando não havia a exigência do diploma:
— Naquela época predominava o que ficou conhecido como a imprensa marrom, altamente sensacionalista e com padrões éticos questionáveis. Além de muitos jornalistas que mais pareciam policiais, e policiais, amigos de jornalistas, que faziam matérias como um bico”. Tenho muito receio de que a profissão volte a ser encarada daquela maneira e que a ética seja deixada de lado, em detrimento ao sensacionalismo.
Para o sindicalista, a partir da decisão do STF, a tarefa de organizar a categoria ficará mais difícil, os salários poderão ser nivelados por baixo, e os patrões sairão ganhando.
— As empresas vão baixar os salários e contratar aquelas pessoas que fazem parte do grupo de interesse deles.
![]() |
Beth Costa |
Sobre esta questão, a Diretora de Relações Internacionais da Fenaj, Beth Costa, chamou a atenção para o que classificou como “nepotismo na imprensa”:
— Como a maioria das empresas de comunicação do País pertence a algumas famílias, elas poderão começar a privilegiar os parentes e conhecidos, que nunca irão contestá-las.
Para Beth Costa, os Ministros do STF demonstraram despreparo na análise da matéria:
— Fiquei indignada com o depoimento do Carlos Ayres Britto quando ele disse que o jornalismo não precisa de técnica, pois se trata de literatura e arte, e que a profissão não causa danos a terceiros. O médico pode matar uma pessoa fisicamente e o jornalista moralmente. Essas justificativas mostram falta de conhecimento sobre a profissão.
Qualificação
Segundo Carmem Pereira, membro da Comissão de Ética da Fenaj, as empresas não vão querer arcar com o ônus da qualificação profissional, o que pode prejudicar a qualidade do serviço prestado:
— Antigamente, as redações eram abertas ao público. O “foca” freqüentava o jornal e aos poucos ia aprendendo o trabalho. Hoje em dia, as redações estão cada vez mais enxutas, e não há espaço físico para isso. As empresas já querem que o estagiário esteja preparado. Como elas se responsabilizarão pela qualificação do profissional?
Carmem acredita que a decisão do STF, em médio e longo prazo, interferirá negativamente na questão salarial:
— Não sei qual será o parâmetro salarial. Basta ver que o Ministro Gilmar Mendes comparou a profissão de jornalista com a de cozinheiro.
![]() |
Sebastião Batista |
Empunhando um cartaz com a mensagem: “E agora, o jornalista vai enfiar o diploma onde”?, o jornaleiro Sebastião Batista revelou repúdio à decisão do STF:
— Gastei uma fortuna para formar minha filha em Jornalismo e agora o diploma não vale mais. É como se eu tivesse sido atingido por uma bala perdida. Entendo que a partir deste momento, o jornalista vai ficar desmotivado para seguir a profissão.
Carregando nas mãos um rolo de papel higiênico, que comparava ao seu diploma, Isabela Guedes, estudante do 7º período de Jornalismo, demonstrou preocupação com o acirramento da concorrência na hora de pleitear uma vaga no mercado de trabalho:
— Já estou quase me formando e até agora não consegui um estágio, pois o mercado é muito fechado. Agora, que estou concorrendo com pessoas de todas as áreas, será muito mais difícil conseguir emprego.
Apoio
![]() |
Alberto Jacob Filho |
Quando a passeata chegou à sede da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), Rogério Marques pediu apoio aos parlamentares, argumentando que a extinção da obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão de jornalista afeta toda a sociedade:
— Precisamos de jornalistas bem qualificados e bem pagos, para que a sociedade seja informada da melhor maneira possível. Queremos que seja criada uma frente parlamentar, a mais ampla possível, para entrar nessa luta junto com a gente.
Vestido como cozinheiro, numa alusão à comparação feita por Gilmar Mendes entre esta profissão e a de jornalista, o Presidente da Arfoc-Rio e Diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, Alberto Jacob Filho, lembrou que a decisão do STF não diz respeito somente aos jornalistas, mas a outras categorias que também terão a exigência do diploma derrubada:
— Nossa luta será para estabelecer pré-requisitos para o exercício de todas as profissões que não oferecem riscos aos seres humanos, como argumentaram os Ministros do STF, e que, portanto, perderão a exigência do curso superior para serem exercidas. Vamos tentar resolver esta situação, seja por projeto de lei ou emenda constitucional.
![]() |
Alberto informou ainda que será disponibilizado no site do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro um espaço para a coleta de assinaturas exigindo a implementação de dispositivos que garantam a regulamentação das profissões. Segundo Alberto, a partir desta semana, o sindicato consultará juristas para saber de que maneira isto poderá ser feito.
Antes de encerrar a manifestação, Rogério Marques convocou os presentes para um protesto nesta terça-feira, dia 23, às 17h, em frente à Fundação Getúlio Vargas (FGV), em Botafogo, zona sul do Rio, onde o Ministro Gilmar Mendes, Presidente do STF, estará ministrando uma palestra.